Ações da Cemig podem deixar mais de cinco mil famílias sem moradia
Sem diálogo, estatal seguem descumprindo acordos e contribuindo com o agravo do déficit de moradias na capital mineira
Foto: Bernardo Dias/CMBH
A falta de disposição da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) para dialogar sobre as negociações que vão tratar das desapropriações e encontrar uma solução que contemple o direito de moradia das doze comunidades que vivem ao longo da linha de transmissão de energia pautou a fala dos participantes da audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor, realizada nesta terça-feira (11/7). A ausência de representantes da Cemig, o descumprimento por parte da estatal de acordos firmados em mesa de diálogo e a notificação individual de moradores seguida da demolição das casas foram denunciados pelos participantes. O papel do Município tanto nas negociações quanto no acolhimento das demandas e no encaminhamento das famílias e a ausência do secretário municipal de Obras e Infraestrutura também foram questionados. Autor do requerimento, Pedro Patrus (PT) se comprometeu, entre outras coisas, a solicitar que o Ministério Público notifique a Cemig para que nenhuma moradia seja demolida até que haja uma solução para o problema. “Essas pessoas estão sofrendo violações de direitos humanos”, disse. Wesley Moreira (PP) questionou o tratamento dispensado aos moradores e a forma como a Cemig tem tratado a questão. Iza Lourença (Psol) destacou que as antenas prejudicam a população que está na periferia e que, nos bairros de classe média e alta, as linhas de transmissão são subterrâneas.
Pedro Patrus destacou que trata-se de uma negociação difícil na qual cada região precisa de um olhar diferenciado e uma solução adequada. “Daí a importância da participação da Prefeitura nesta mesa, ajudando a resolver um problema que se arrasta há décadas. O parlamentar falou ainda que a ausência de representante da Cemig é uma clara demonstração de que a companhia não quer dialogar. Ele aprovou o senso de unidade das comunidades que lutam pelo interesse comum e exortou a continuidade da união. Iza Lourença (Psol) afirmou que, durante uma visita técnica na Vila Alto das Antenas, foi informada de que a Cemig entrou na Justiça para paralisar uma obra da Prefeitura. A vereadora destacou que existe uma deficiência habitacional na cidade e lembrou o direito à moradia.
Para onde ir?
Representante do Morro do Papagaio, Maristela da Silva pediu ajuda da PBH para encaminhar uma solução, lamentou que o governo do Estado não está trabalhando para a população vulnerável e que, a despeito dos esforços da Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel), a Cemig não se compromete. A líder comunitária reclamou que não consegue agenda com o prefeito e advertiu que se nada for feito “cinco mil famílias vão para a rua, sem moradia”. Ao defender o que chamou de “comunidades centenárias", Ana Paula Pinheiro, representante do Morro das Pedras, definiu que “a luta é por moradia”. Ela afirmou que a Cemig “está fazendo a comunidade de boba”, uma vez que não cumpre acordos, e questionou o papel da Prefeitura neste processo. O desrespeito da Companhia de Energia também pautou a fala de Luiz Ricardo Aguiar, morador da Vila Ecológica. Segundo ele, de uma forma covarde, a Cemig faz demolições individuais. “Essas famílias serão jogadas na rua? A Prefeitura vai permitir isso?”, questionou. Luiz afirmou ainda que os moradores são coagidos todos os dias pela Cemig. “Precisamos de uma garantia da CMBH de que a Cemig não vai demolir casas além daquelas que são necessárias; de que as outras serão retiradas quando houver uma solução para a questão”.
Os participantes lembraram ainda que as casas não foram construídas de uma hora pra outra, que algumas estão lá há mais de 50 anos e que os processos judiciais para desapropriação e demolição estão sendo acelerados. Morador da Vila Pinho, Anderson Cleber alegou que a empresa tem recursos financeiros e tecnológicos para fazer uma rede de energia melhor de forma a permitir que as famílias permaneçam onde estão. Segundo ele, a estatal quer apenas gerar lucro e não quer investir na melhoria de vida da população. “A mesa de diálogo do governo do Estado não consegue fazer a Cemig cumprir os acordos firmados e a Cemig segue derrubando casas”, afirmou.
5 mil moradias na lista
O diretor-presidente da Urbel, Claudius Vinícius, endossou a fala de Anderson sobre o descompromisso da Cemig com a questão. Ele assegurou que o Executivo apoia a luta da população por entender que, caso as famílias fiquem desalojadas, a Prefeitura terá um grande problema para resolver. Segundo ele, a Urbel fez um levantamento e existem cerca de cinco mil moradias - o que é diferente de famílias (cada moradia pode ter mais de um andar e abrigar mais de uma família). O servidor público contou que, no caso do Morro das Pedras, a PBH fez uma parte das obras e que faltam R$35 milhões para conclusão. “A Prefeitura já reservou no orçamento o valor de 17,5 milhões para o término desta obra e aguarda a Cemig completar os outros 50% para finalização”, disse.
Claudius Vinícius alegou que o problema é complexo e a solução definitiva vai demandar tempo e recursos, mas que a Prefeitura já deu os primeiros passos assegurando cerca de um terço dos recursos destinados pelo governo federal ao estado de Minas Gerais por meio do Programa Minha Casa Minha Vida. “A rede subterrânea deve ser explorada para mover o menor número de famílias possível e, mesmo assim, haverá a necessidade de construção de novas moradias. Estamos trabalhando em diversas frentes e não dá para a Cemig ignorar o problema ”, alegou. Ao ser questionado por uma moradora sobre as ações da Urbel quando da desapropriação de uma família, o presidente da Urbel lembrou que o Estado também pode apoiar utilizando o abono pecuniário; com a doação de terreno; e que o retorno do Ministério das Cidades pode auxiliar muito a construção de novas moradias. Entretanto, Claudius Vinícius lembrou que existem outros públicos, para além das comunidades que vivem ao longo da linha de transmissão de energia, que vão disputar as novas construções.
Encaminhamentos
Wesley Moreira justificou a presença de apenas três vereadores e assegurou que todos os outros apoiam a causa. Ele propôs que a CMBH faça uma moção de repúdio para destacar que o Legislativo não compactua com a forma de agir da Cemig e que apoia a população. Iza reconheceu que a Prefeitura tem contribuído para solucionar o problema de falta de moradia, mas frisou a necessidade de “sair da posição de imparcialidade”. Segundo ela, se a Cemig entrou na Justiça para impedir que a PBH realizasse uma obra na comunidade, o Executivo também pode ajuizar uma ação para impedir a Cemig de continuar a demolir casas e obrigar a estatal a cumprir sua parte nos acordos firmados, bem como tomar parte nos encaminhamentos para solucionar o problema.
Ao destacar que a demolição de cinco mil moradias vai gerar problema social para a cidade, Pedro Patrus garantiu que vai oficiar a Cemig e o governo do Estado; solicitar ao Ministério Público para que interrompa as desapropriações até que se façam os encaminhamentos necessários; agendar uma reunião com o prefeito de Belo Horizonte e fazer uma indicação para que seja celebrado um convênio com a Cemig. Os parlamentares também acertaram que vão propor um PL, nos moldes do que está sendo apresentado pela deputada estadual Bella Gonçalves (Psol) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), no qual o direito das famílias que estão nas áreas das antenas sejam garantidos.