REUNIÃO PLENÁRIA

Programa “Escola sem Partido” segue dividindo opiniões entre os parlamentares

Defendido pela bancada cristã, texto limita as discussões políticas e sociais nas escolas; oposição considera medida um retrocesso

quinta-feira, 3 Outubro, 2019 - 20:00

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Tema já debatido em todo o país há cerca de cinco anos, quando o Congresso Nacional aprovou o Plano Nacional de Educação, em 2014, a atuação dos professores em sala de aula voltou à pauta da Câmara Municipal de Belo Horizonte no último mês de setembro e tem divido opiniões nas reuniões plenárias. Está em votação no Plenário o Projeto de Lei 274/17, que determina a criação do Programa Escola sem Partido, disciplinando o exercício docente nas unidades de ensino da capital. A proposta buscaria, entre outras diretrizes, garantir o “direito dos pais sobre a educação religiosa e moral dos seus filhos”, proibindo que as escolas se envolvam na orientação sexual dos alunos ou que apliquem o que o projeto define como “ideologia de gênero”. Assim como nas últimas reuniões, a plenária desta quinta-feira (3/10) foi marcada pelo esforço das vereadoras e vereadores contrários ao projeto em obstruir a votação e evitar sua aprovação. A votação não foi concluída, e o projeto segue na pauta de amanhã (4/10).

“Não vão nos calar! Escola sem Partido é ditadura militar”. As palavras de ordem ouvidas nas galerias e repetidas por vereadores ao microfone deram o tom do debate na tarde desta quinta-feira. “O cerceamento da liberdade da Educação vai trazer resultados ainda mais negativos à nossa sociedade”, alertou o vereador Pedro Bueno (Pode), apontando o alto índice de violência contra a mulher e de gravidez precoce, entre adolescentes de 14 a 19 anos. “A falta de educação sexual só piora essa situação”, resumiu o parlamentar, afirmando que o debate sobre gênero e sexualidade nas escolas é importante para garantir a saúde e o bem-estar das próprias crianças e adolescentes.

Violência de gênero

Denunciando as violências vividas rotineiramente pelas mulheres, inclusive pelas vereadoras no exercício de seus mandatos, Bella Gonçalves (Psol) lembrou que foi impedida de falar ao microfone na reunião de ontem (2/10), quando o vereador Jair Di Gregório (PP) presidia os trabalhos. “Não seremos interrompidas. Não seremos interrompidas”, afirmou a vereadora, alertando que a violência política contra a mulher é um dos sintomas da ausência dos debates sobre os papeis de gênero na sociedade.

“Não querem esse debate porque discutir gênero é discutir o poder”, resumiu a vereadora, lembrando que a Casa é composta por 41 vereadores, sendo apenas quatro mulheres. “Nós queremos discutir gênero porque o feminicídio só cresce”, alertou.

Em coro com a vereadora, Cida Falabella (Psol) lembrou que “não existe só um tipo de família. Existem várias famílias, que precisam ser acolhidas pelas escolas. Escola não é só para ensinar português e matemática. Escola é para ensinar arte, educação alimentar, cultura e direitos humanos”.

Escola sem Partido

O Projeto de Lei 274/17 tramita ainda em 1º turno, assinado por dois ex-vereadores e por 19 dos atuais vereadores e vereadoras, entre eles, Wesley Autoescola (PRP), Henrique Braga (PSDB), Reinaldo Gomes (MDB), Catatau do Povo (PHS) e Fernando Borja (Avante), que se manifestaram em Plenário defendendo a aprovação do projeto.

De acordo com o texto, os professores ficariam proibidos de fazer propaganda político-partidária em sala de aula ou incitar alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas. Ainda, o projeto determina que as abordagens sobre questões políticas, socioculturais e econômicas devem apresentar as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas correntes a respeito do tema.

Em relação às escolas confessionais e particulares, “cujas práticas educativas sejam orientadas por concepções, princípios e valores morais, religiosos ou ideológicos”, o texto determina que as instituições obtenham dos pais, no ato da matrícula, autorização expressa para a veiculação de tais conteúdos.

Com um grupo de apoio presente também nas galerias, Fernando Borja destacou a simplicidade do projeto, afirmando que “são seis artigos”, e provocou parlamentares contrários ao projeto e professoras presentes na galeria a debater o texto: “desafio vocês a apontar onde há mordaça aqui”, concluiu. Nas galerias, representantes dos Conservadores em Ação e da Direita BH defendiam o projeto, cobrando a rápida votação e exibindo cartazes que pediam “diga não à doutrinação marxista nas escolas”.

Para Gilson Reis (PCdoB), que lembrou sua carreira de 30 anos como professor, a medida é arbitrária, “retrógrada, reacionária e fascista”, uma vez que regula as discussões políticas e socioculturais dentro das salas de aula.

Pedro Patrus (PT) e Arnaldo Godoy (PT) reafirmaram a postura de obstrução da votação enquanto o Escola sem Partido estiver na pauta. “Ontem o vereador Mateus Simões (Novo) falou que a obstrução da pauta é imoral. Imoral é acabar com a diversidade, é fazer censura; é colocar as crianças em caixinhas que não permitam o espírito crítico e impeçam o debate e o contraditório”, concluiu Godoy.

Obstrução da pauta

Recurso regimental utilizado por blocos minoritários no parlamento, a obstrução da pauta é uma estratégia que permite adiar a apreciação do projeto em debate, a fim de ampliar a discussão e os argumentos para evitar a aprovação do texto pela maioria formada. Utilizada pelos parlamentares contrários ao Programa Escola sem Partido, a obstrução tem ocasionado reuniões de longa duração, com amplo espaço para manifestações parlamentares e dos grupos populares que acompanham das galerias. Para que isso aconteça, uma das ferramentas é a apresentação de requerimentos diversos, que são lidos em Plenário e apreciados individualmente, gerando muitas oportunidades de fala ao microfone: discussão dos conteúdos, encaminhamento das votações e apresentação de recursos das decisões.

Nesta tarde, foram apreciados dois requerimentos, dos cerca de 40 que estão vinculados ao PL 274/17. Os requerimentos foram apresentados pelas vereadoras que se opõem ao projeto e solicitam, por exemplo, a votação destacada de cada um dos incisos de todos os artigos do projeto. Na reunião de hoje, foi rejeitado requerimento que pedia que a votação de cada um dos requerimentos fosse feita de forma nominal (registrada no painel eletrônico). Diante da recusa, a votação tem sido feita de forma simbólica, em que apenas se manifestam os contrários e o resultado se dá por contraste visual (sem identificação nominal dos vereadores). Foi aprovado um requerimento para votação em bloco de dois outros requerimentos para votação em destaque dos incisos II e III do Art.1º.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

83ª Reunião Ordinária - Plenário