PRÁTICA CRIMINOSA

Vigilância e educação: ferramentas contra a importunação sexual em estádios

Tema foi debatido na Comissão de Mulheres e uniu Polícia Militar, Ministério Público, Justiça Desportiva e Minas Arena

sexta-feira, 4 Fevereiro, 2022 - 15:00

Foto: Claudio Rabelo/CMBH

Tipificada na legislação brasileira como crime apenas em 2018, a importunação sexual é o ato de “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro” e tem pena de reclusão de um a cinco anos, se o ato não constituir crime mais grave. O assunto foi tratado em audiência pública pela Comissão de Mulheres, nesta sexta-feira (4/2), que direcionou o debate para o combate à pratica em estádios de futebol da capital. Solicitada pelas vereadoras Flávia Borja (Avante) e Fernanda Pereira Altoé (Novo), a reunião contou com a participação de agentes fundamentais no desenvolvimento de ações preventivas como Polícia Militar, Ministério Público, Tribunal de Justiça Desportiva e Minas Arena, administradora do Mineirão. 

“Até 2009 os crimes contra a dignidade sexual eram considerados crimes de costume”, explicou Patrícia Habkouk, promotora de Justiça que trabalha no enfrentamento à violência contra a mulher e causas relacionadas ao feminicídio no Ministério Público de Minas Gerais. Segundo ela há um enorme desafio no trabalho contra a violência sexual, muitas vezes “invisibilizada” na sociedade. Patrícia disse que a mudança recente na legislação, com a aprovação da Lei 13.718/2018, mostra que ainda há uma cultura que julga sempre a mulher. “A mulher pode estar onde ela quiser e com a roupa que ela quiser”, afirmou a promotora, destacando a presença das mulheres nos estádios de futebol e afirmando que o Ministério Público é parceiro da Minas Arena, que administra o Mineirão (Estádio Governador Magalhães Pinto), na campanha "Todos contra a Importunação Sexual".

Parceria para estimular conscientização

A Câmara Municipal de Belo Horizonte, por meio da Comissão de Mulheres, apoia a campanha e visitou o Mineirão em dezembro de 2021, quando recebeu informações sobre o trabalho desenvolvido no estádio em combate à importunação sexual. “Vem aumentando o número de casos de importunação sexual em estádios. Em todos os lugares que temos muitas pessoas transitando temos que ter uma atenção especial, um controle para que as mulheres possam assistir aos jogos sem serem importunadas”, disse o vereador Rubão (PP), destacando o valor da campanha e do debate feito pelo Legislativo.

“O diálogo é fundamental. Quanto mais entidades estiverem juntas, mais soluções vamos encontrar. O Mineirão tenta quebrar barreiras e a educação é nossa principal ferramenta”, explicou Luíza Sampaio, representante do Mineirão, salientando que toda a estrutura foi montada para acolher as vítimas da melhor forma possível. Segundo ela, o estádio está todo aparelhado, com 360 câmeras espalhadas e canal específico para denúncia. “Em dias de jogos, recebemos em torno de 60 mil pessoas. É essencial identificar a prática na hora do ocorrido; por isso é importante que a vítima possa nos alcançar”, afirmou. Para Alfredo Neves, que também representa o Mineirão, o principal saldo a ser alcançado pela campanha é acabar com a concepção machista, e para isso é preciso educação e vigilância. “Tivemos até prisão em flagrante dentro do estádio. A engrenagem está rodando e de um jeito mais eficaz”, avaliou.

O tenente-coronel Jackson Ramos, que comanda o 34º Batalhão da Polícia Militar, responsável pelo policiamento da região onde está o Mineirão, disse que combater este tipo de crime dentro do estádio e ao seu redor é um desafio que está sendo enfrentado. “Este é um tema muito importante para toda a sociedade. Estive em dois jogos esta semana no Mineirão para conhecer esta dinâmica que é gigantesca. Temos que aprofundar o debate sobre o tema e promover campanhas trabalhando juntos”, falou o comandante, que assumiu a função no 34º Batalhão recentemente. Ele teve o apoio da vereadora Fernanda Pereira Altoé: “contem com a gente para gerar resultados”.

A campanha “Todos contra a importunação sexual” foi lançada em novembro do ano passado e conta, além de cartazes espalhados pelo Mineirão, com QR Codes em vários locais que conectam a um canal de denúncias via WhatsApp. A partir de informações recebidas, é possível agilizar os processos e encaminhar os casos para investigação dos órgãos de segurança.

Buscar exemplos de boas práticas

“Cada mulher importunada em um estádio é uma bola fora, uma vergonha para toda a sociedade”, disse Juliane Menezes, auditora do Tribunal de Justiça Desportiva de Minas Gerais. Primeira mulher a ocupar um cargo no TJD, ela sugeriu que sejam feitos estudos comparativos sobre as melhores práticas de combate à importunação sexual no Brasil e no mundo, que seja feita parceria com a imprensa, atletas e clubes e que haja uma ampliação da campanha desenvolvida no Mineirão para toda Minas Gerais, envolvendo superintendências reginais de ensino. “A partir dessa audiência, levarei o debate para o presidente, Guilherme Doval, para ver as ações possíveis a partir do TJD”, afirmou a auditora, contando que crimes de importunação ocorrem em outros estádios do mundo, como na Suíça, onde ela mesma foi vítima. “Escrevi sobre o ocorrido para o consulado da Suíça e recebi pedido formal de desculpas”, revelou.

Frequentadora assídua do Mineirão, a vereadora Professora Marli (PP) considera importante manter um clima de paz no estádio. “Eu acompanho o Mineirão desde a sua construção. Tive momentos de diversão e prazer lá e acho de uma grandiosidade ir ao estádio. Estamos aqui para ajudar a melhorar e encontrar soluções. Podemos fazer do Mineirão o cartão de visitas do nosso futebol”, disse Marli.

Também participou do debate o gerente de segurança da Central de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasa), Sérgio Almeida. Com 70 mil pessoas circulando diariamente na central, o trabalho de combate à importunação sexual é constante. Segundo ele, a ampliação do controle na portaria e a distribuição de panfletos educativos aos usuários fez diminuir os casos. “Além do trabalho de educação e entrada apenas de credenciados à noite, temos 96 câmeras que ajudam na dinâmica do nosso trabalho. Estamos conseguindo colocar ordem na casa e as mulheres nos informam que já se sentem mais seguras”, disse Sérgio. “O tamanho é um grande desafio, mas não pode ser uma desculpa pois temos sempre que avançar”, avaliou Fernanda Altoé.

Dando continuidade ao trabalho, a Comissão de Mulheres fará, no dia 11 de fevereiro, às 9h, uma visita técnica ao Estádio Raimundo Sampaio (Arena Independência), a fim de verificar se há no estádio um planejamento estratégico para evitar importunações sexuais em dias de jogos e, caso estas ocorram, que medidas estão sendo tomadas para atendimento às vítimas e identificação dos agressores. A visita foi requerida pelo vereador Rubão.

Assista aqui a íntegra da audiência.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública com a finalidade debater o tema: "Mulher e a importunação sexual nos estádios".