Despejo iminente e falta de políticas públicas são criticados por vereadoras
Cerca de 50 famílias serão retiradas de terreno público no Bairro Betânia. PBH se recusa enviar Assistência Social ao local
Foto: Abraão Bruck/CMBH
Guarda Municipal e fiscais da Prefeitura estão, desde janeiro, empreendendo ações de retirada, sem ordem judicial, de moradores da Ocupação Vila Maria, localizada no Anel Rodoviário, no Bairro Betânia, BR 262, em Belo Horizonte. Cerca de 50 famílias ocupam o local que, segundo a PBH, pertence ao Município e é uma área de preservação ambiental. Enquanto a Comissão de Direitos Humanos, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor debatia o tema, na tarde desta segunda-feira (14/2), com o intuito de garantir o cadastramento e a avaliação do perfil socioeconômico dos ocupantes por meio da ação de técnicos da Assistência Social, integrantes da Polícia Militar, da Guarda Municipal e da Fiscalização da PBH estavam no local para retirar as famílias sem qualquer previsão de acolhimento pelas políticas públicas municipais. Diante da negativa da PBH em enviar técnicos da área social à ocupação para realizar avaliação e cadastramento das famílias, Bella Gonçalves (Psol) e Macaé Evaristo (PT), que requereram a reunião, continuarão acompanhando a situação dos moradores e seguirão cobrando a inclusão das famílias em situação de vulnerabilidade nas políticas públicas de moradia e assistência.
Luís, uma das lideranças da ocupação, contou que gestantes, cadeirante, pessoa com síndrome de down estão entre aqueles que tentam impedir que a Guarda Municipal e a Fiscalização da Prefeitura entrem nos barracos e quebrem os seus pertences. Ele confirmou que a Guarda está no local para oprimir os moradores sem que a Assistência Social tenha comparecido para cadastrá-los nas políticas públicas da Prefeitura. O líder denuncia abuso de autoridade por parte da Guarda Municipal e afirma que animais de estimação, materiais de construção e outros pertences dos ocupantes foram apreendidos pela PBH. Ele pede que o Poder Executivo se sensibilize com a condição dos ocupantes, garanta moradia, políticas públicas e evite ações truculentas que possam violar os direitos humanos. Tiago, outra liderança da ocupação, reforçou as denúncias feitas por Luís ao informar que os agentes da Prefeitura jogam a comida dos moradores no chão e apreendem suas panelas e colchões.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Bella Gonçalves solicitou que a PBH não execute mais procedimentos repressivos sem que técnicos de Assistência Social ajam para garantir direitos às famílias. Ela reclamou que na Ocupação Vila Maria há policiais militares, guardas municipais, fiscais da Prefeitura, mas não há um só servidor da Assistência Social para identificar situações de vulnerabilidade social e verificar quais dos ocupantes podem se enquadrar como beneficiários de políticas públicas municipais. Ainda segundo a vereadora, a comissão está averiguando denúncias de violações de direitos na ocupação. Além disso, membros de seu gabinete parlamentar se dirigiram até a Vila Maria, nesta segunda, com o intuito de evitar arbitrariedades por parte do poder público contra os moradores.
Macaé Evaristo solicitou atuação da PBH para resguardar não somente o direito à moradia para as famílias da Ocupação Vila Maria, mas também um tratamento digno por parte do Poder Executivo. A parlamentar, juntamente com Bella Gonçalves, solicitou a suspensão dos despejos, tendo em vista que a Prefeitura não conhece sequer a situação socioeconômica das famílias e nem apresentou qualquer política para acolhê-las. Assim, a vereadora solicitou que até que o cadastramento dos ocupantes seja finalizado e soluções sejam propostas não haja ações para retirada de pessoas do local.
Novas ações na ocupação
O superintendente de Operações da Guarda Municipal, Júlio César Pereira, afirmou que a ocupação no terreno é recente e que desde janeiro vem sendo feita a retirada das pessoas que estão em situação irregular. Ainda segundo ele, a fiscalização da PBH, com o apoio da Guarda Municipal, irá novamente, nesta segunda-feira (14/2), retirar famílias que se encontram na ocupação. De acordo com o superintendente, com exceção de três edificações que estão no terreno há alguns anos, as demais ocupações não tinham fogão, utensílios, nem nada que permitisse caracterizá-las como moradias consolidadas e, portanto, estão sendo retiradas. O representante da Guarda explicou, ainda, que a corporação não apreende pertences, nem derruba barracos, sendo responsáveis por tais serviços os auxiliares contratados pela PBH. À Guarda Municipal cabe acompanhar as ações e agir em apoio aos fiscais da PBH, uma vez que a área irregularmente ocupada é pública. Quanto às denúncias, o superintendente explicou que a Guarda tem corregedoria e ouvidoria, órgãos que podem ser acionados para investigar eventuais ações ilegais ou irregulares por parte de membros da corporação. “Estamos à disposição para receber qualquer denúncia”, afirmou.
Notificações e despejo na pandemia
Marcus Túlio Bueno, representante da Subsecretaria de Fiscalização da PBH, explicou que em relação às três moradias consolidadas da ocupação, a PBH adotou o procedimento de notificar os moradores informando prazo de 30 dias para propositura de ação judicial caso eles não saiam do local. De acordo com ele, a medida foi adotada seguindo orientação da Procuradoria do Município. O representante da PBH também salientou que aqueles que estão há anos no terreno têm a garantia de que a retirada da área acontecerá apenas por ordem judicial. Segundo ele, a fiscalização não entrou nestas moradias, apenas entregou as notificações. Marcus Túlio também negou que tenha havido apreensão de animais de estimação, reconhecendo, contudo, a apreensão de materiais de construção que poderiam ser usados para ampliar as ocupações. De acordo com ele, o que houve foi uma resposta da PBH à tentativa de novas ocupações no terreno público em conformidade com a legislação vigente.
Durante a reunião, Bella Gonçalves lembrou a Prefeitura que o Supremo Tribunal Federal decidiu que são inconstitucionais despejos durante a pandemia de covid-19, de modo que a entrega das notificações nas três edificações que há anos se encontram na ocupação estaria contrariando a Constituição.
Sobre a constitucionalidade das ações da PBH, o diretor da Urbel afirmou que a decisão do STF não se aplica a ocupações recentes, como é o caso daquelas montadas por cerca de 50 famílias da Vila Maria. Além disso, a Prefeitura defendeu que a notificação dos moradores que vivem no local há mais tempo também não fere a decisão do Supremo.
Políticas públicas
O diretor-presidente da Urbel, Claudius Vinícius Leite Pereira, explicou que as três famílias com moradias consolidadas na Ocupação Vila Maria serão beneficiárias de políticas de habitação da PBH, mas famílias de ocupações recentes, em geral, não são atendidas por política de habitação da Prefeitura. Além disso, ele explicou que, se alguma das famílias da ocupação vivia anteriormente em área de risco, será inserida no Programa Estrutural em Área de Risco, com encaminhamento para abrigo municipal ou acesso ao programa Bolsa Moradia até o seu reassentamento definitivo em uma unidade habitacional construída pela Prefeitura.
A esse respeito, a vereadora Macaé salientou que justamente para verificar quais são as famílias egressas de áreas de risco e conhecer o perfil dos ocupantes é necessário o cadastramento pela área social da PBH.
A representante do Ministério Público, Ana Ferreira, afirmou que o órgão está atuando para apurar os fatos que vêm ocorrendo na Vila Maria. Segundo ela, o MP já se reuniu com as famílias da ocupação, e foi instaurado inquérito civil público sobre o caso. Além disso, foram solicitados documentos como autos de apreensão, e a Secretaria de Assistência Social foi oficiada com relação à abordagem das famílias. O MP quer saber se as famílias foram inseridas em políticas públicas como o CadÚnico, programas de transferência de renda, de saúde, de moradia, de educação, entre outros. O órgão também está acompanhando as atividades da Guarda Municipal na ocupação e segue aguardando respostas da PBH para seus ofícios.
Bella Gonçalves e Macaé Evaristo consideraram insuficientes as ações da PBH para garantir direitos fundamentais aos ocupantes e mantiveram suas cobranças de que os moradores precisariam receber atenção da Urbel e da Assistência Social, com avaliação do perfil socioeconômico e cadastramento em programas sociais. Estas ações, de acordo com as vereadoras, deveriam preceder qualquer medida relacionada ao despejo de famílias em situação de vulnerabilidade.
Superintendência de Comunicação Institucional