PLANO DIRETOR

Vereadores temem fuga de investimentos no setor imobiliário da capital

Mudanças instituídas pelo Plano Diretor poderiam prejudicar construção civil. PBH diz que é cedo para avaliar impactos

quarta-feira, 20 Outubro, 2021 - 15:00

Foto: Breno Pataro/PBH

Nos debates que antecederam a elaboração e aprovação do Plano Diretor, entre 2014 e 2019, um dos pontos mais controversos foi a redução do coeficiente de aproveitamento para 1,0 em toda a cidade e o pagamento de outorga onerosa do direito de construir (ODC) sobre a área que exceda a metragem do terreno. Em audiência da Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana, nesta terça-feira (19/10), vereadores apontaram que, segundo o setor imobiliário, a oferta vem crescendo mais nos municípios vizinhos e o alto custo da ODC pode estar causando a subutilização do instrumento em Belo Horizonte, reduzindo os investimentos em habitação popular aos quais se destinam. A representante da Secretaria Municipal de Política Urbana explicou que o momento é de transição e os impactos concretos das novas regras só poderão ser verificados a médio e longo prazo. Os dados não obtidos na reunião serão solicitados à Prefeitura pela comissão.

Resultado das deliberações da IV Conferência Municipal de Política Urbana de 2014, o novo Plano Diretor de Belo Horizonte (Lei 11.181), sancionado pelo prefeito Alexandre Kalil e publicado no Diário Oficial do Município (DOM) no dia 9 de agosto de 2019, estabeleceu as diretrizes para o desenvolvimento urbano, orientando a ocupação do solo na cidade. Em lugar do PL original elaborado em 2015 na gestão do ex-prefeito Marcio Lacerda, que recebeu centenas de emendas e subemendas, o Plano foi aprovado na forma de um Substitutivo apresentado na reta final da tramitação pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário. Apesar das críticas de setores da indústria, construção civil e alguns parlamentares, a redução do coeficiente básico de aproveitamento de 2,7 para 1,0 em toda a cidade foi mantida na Lei.

Segundo os opositores da medida, a limitação da área construída a apenas uma vez o tamanho do lote e o pagamento da outorga onerosa do direito de construir (ODC) para imóveis que ultrapassem esse limite desvaloriza os terrenos e encarece os custos da construção no município, especialmente para empreendimentos de grande porte, espantando os investidores. Propositores e defensores da regra alegam que ela reduzirá a concentração de grandes edifícios nos bairros nobres da cidade e afirmam que a cobrança da outorga é condizente com a função social da propriedade, já que a receita decorrente será utilizada pela Prefeitura para investir em habitação social e melhorias nos espaços públicos da cidade.

Impactos no mercado imobiliário

Para verificar o cumprimento das agenda do Plano e os resultados obtidos até o momento, o requerente da audiência Professor Juliano Lopes (Agir), o vereador Bráulio Lara (Novo) e o empresário da construção civil Rodrigo Cançado questionaram a representante da secretária Municipal de Política Urbana, Izabel Dias. Juliano pontuou que, segundo pesquisa do setor imobiliário, grandes empreendimentos e imóveis de alto padrão estão deixando de ser implantados em Belo Horizonte e migrando para os municípios vizinhos; em 2020, segundo ele, foram lançados 2.911 novos apartamentos em Belo Horizonte e 2.692 em Contagem, uma diferença de apenas 119 sendo que o município vizinho possui metade da população da Capital, e perguntou como isso está sendo visto e o que vem sendo feito pelo órgão para evitar que a fuga de investimentos comprometa o desenvolvimento econômico da cidade.

Izabel alegou que o Plano ainda está em processo de implantação e a chamada “janela de transição” só se encerra em fevereiro de 2023, e só depois será possível aferir os resultados de forma consistente. Contestando a informação de Lopes, ela relatou que o monitoramento do mercado imobiliário, realizado de forma contínua desde antes da entrada em vigor da lei, indicou um crescimento de 26% em 2020 e geração de empregos muito superior à dos municípios vizinhos. Ela também ponderou que não dá para comparar mercados imobiliários de modo simplista, sem considerar as dinâmicas e fatores que os caracterizam nas diferentes cidades. Sobre o número de projetos apresentados, em andamento ou implantados já no novo contexto, ela afirmou não possuir “uma resposta pronta” naquele momento e seria necessário um levantamento detalhado dos dados referentes aos projetos, licenciamentos e prazos.

ADEs e operações urbanas

Os vereadores também questionaram sobre o envio dos projetos de lei que irão regulamentar as Áreas de Diretrizes Especiais delimitadas e as operações urbanas previstas no Plano Diretor, que estabelecerão critérios e condições específicas para os empreendimentos nesses locais. Izabel informou que as ADEs já estão regulamentadas e não dependem de lei; as regras a serem aplicadas em cada uma das operações urbanas estão sendo estudadas e têm de passar pela Câmara, mas ainda não há previsão de envio dos projetos. Nessas áreas, o coeficiente pode ser reduzido, mantido ou ampliado, dependendo dos objetivos da reestruturação. Rodrigo Cançado manifestou a preocupação dos incorporadores em relação à viabilidade de investir nessas áreas enquanto os parâmetros não forem definidos; como exemplo, ele citou a Avenida Amazonas, onde é prevista uma reestruturação. Izabel informou que essas áreas continuarão “congeladas” até fevereiro de 2023 e, enquanto as regras não forem aprovadas, o coeficiente será o de 1,0 estabelecido para a cidade como um todo.

Bráulio Lara perguntou sobre a atenção da Prefeitura às Áreas de Diretrizes Especiais, como o pólo de moda no Bairro Barro Preto e de preservação de patrimônio na Pampulha, e em que ponto está o planejamento e o andamento das intervenções previstas para o desenviolvimento de cada uma delas. A representante da SMPU disse que as prioridades já estão sendo discutidas pelos órgãos envolvidos, mas afirmou não dispor das informações naquele momento.

Menos recursos

Juliano apontou ainda a subutilização dos 78 milhões de metros quadrados de potencial construtivo oferecidos pelo Município aos empreendedores, dos quais, segundo dados obtidos no próprio site da Prefeitura, apenas 506 metros quadrados foram efetivamente adquiridos até agora. O indicador demonstraria a tendência de migração de investimentos e esvaziaria o objetivo de financiar a habitação popular, prejudicando também a população de baixa renda. Afirmando que o eixo central do Plano Diretor é a criação de novas centralidades, com incentivo ao adensamento e oferta de comércio e serviços em diferentes regiões, articulados com os corredores do transporte coletivo, Izabel garantiu que o cumprimento dessa meta vem sendo sinalizado pelo aumento da procura desses locais por empreendedores.

Embora a adesão das contrutoras às novas regras ainda esteja sendo apurada, as mudanças não ocorrerão “de uma hora pra outra” e ainda é cedo para se falar em “consequências diretas”, tanto negativas quanto positivas. Além disso, o Plano não foca apenas na produção imobiliária, mas também na qualidade ambiental e urbanística, melhoria da mobilidade e da qualidade de vida da população, pontos que também serão avaliados a médio e longo prazo.

Revisão de regras

Os vereadores citaram a experiência da cidade de São Paulo, onde o valor da outorga adotada no Plano Diretor de 2014 encareceu a construção civil, causando a fuga de empreendimentos para outros municípios da Grande São Paulo, e deverá ser corrigido na revisão do Plano em 2022 para que a cidade volte a atrair investimentos. Izabel salientou que o mercado imobiliário de São Paulo é muito diferente e suas dinâmicas e territorialidades não se aplicam necessariamente a BH. Em relação à possibilidade de rever os valores, sugerida pelos participantes, ela esclareceu que a fórmula de cálculo da ODC foi estabelecida após muitos estudos e debates internos e externos anteriores à aprovação da Lei e não está mais em discussão, pois, de acordo com a legislação, a revisão do Plano Diretor só é feita de oito em oito anos. A próxima Conferência Municipal de Política Urbana, no entanto, será realizada em 2022, e, diante dos indícios que vêm sendo observados, os parlamentares e setores descontentes pretendem introduzir essa questão.

Juliano e Bráulio anunciaram que os dados completos do monitoramento do mercado imobiliário realizado pela Prefeitura nos últimos anos, as informações relativas à utilização do potencial construtivo adicional e ao planejamento para as ADEs e as operações urbanas serão solicitados formalmente à SMPU através da comissão e deverão fundamentar futuras discussões com os envolvidos e interessados. Convidados para a audiência desta terça, os sindicatos dos Engenheiros (Senge-MG) e dos Arquitetos e Urbanistas do Estado (Sinarq-MG), a Câmara do Mercado Imobiliário de Minas Gerais e a Federação das Indústrias de Minhas Gerais (Fiemg) não enviaram representantes.

Superintendência de Comunicação Institucional

 

Audiência pública para discutir o cumprimento da agenda de Política Urbana estabelecida no Plano Diretor Municipal - 34ª Reunião Ordinária - Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana