BALANÇO 2021

Cinco audiências públicas discutiram racismo e violência contra pessoas negras

Questionamentos sobre políticas públicas contra a discriminação racial foram encaminhados à PBH e ao governo do estado 

sexta-feira, 14 Janeiro, 2022 - 13:45
Comissão debate, em 2021, violência, desemprego e estratégias de comunicação

Pixabay

Dezenas de episódios de xingamentos, intimidação e violência motivados pela cor da pele em Minas Gerais e no Brasil tiveram grande repercussão nos meios de comunicação em 2021. Denúncias de racismo e injúria racial foram acompanhadas da divulgação de dados oficiais que apontam que pessoas negras somam 77% das vítimas de homicídios no país (Atlas da Violência - Ipea) e têm quatro vezes mais chances de sofrer violência policial do que as brancas no estado (Ministério Público de Minas Gerais e Fundação João Pinheiro). Maioria da população brasileira, os negros são os mais atingidos pelo desemprego (Pnad/IBGE) e têm rendimento inferior na comparação com pessoas brancas ocupadas. Atentos a essa realidade, os vereadores de Belo Horizonte realizaram cinco audiências públicas no ano passado para debater políticas para a eliminação da discriminação racial na cidade. As reuniões foram realizadas pela Comissão Especial de Estudo sobre Empregabilidade, Violência e Homicídio de Jovens Negros e pela Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor, que em 2021 incluiu o tema Igualdade Racial em sua denominação oficial. Pedidos de informações foram encaminhados pelos colegiados à PBH e ao governo estadual. 

Em outubro de 2021, a pedido de Iza Lourença (Psol), presidente da Comissão Especial de Estudo sobre Empregabilidade, Violência e Homicídio de Jovens Negros, foi debatido o tema “Juventude Negra Viva”. No encontro, foram discutidos o encarceramento de jovens negros, o assassinato desses jovens por forças policiais e a necessidade de implementação de políticas públicas voltadas às comunidades periféricas, com ênfase em educação, cultura e emprego. 

Iza Lourença destacou a importância da criação de espaços de debate e de produção de dados estatísticos específicos sobre a comunidade negra em Belo Horizonte. De acordo com a Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB/MG, o segmento é vítima de vários tipos de violência (física, verbal e de exclusão), legitimada pelo governo. Para a OAB, é preciso formar uma rede de apoio jurídico para a juventude preta, que muitas vezes não tem recursos para pagar advogados. 

Juristas criminalistas de São Paulo pontuaram, por sua vez, que as pessoas que mais morrem são também as mais encarceradas; e que esses índices caem entre jovens negros que frequentam escolas e que são ligados ao esporte, lazer e cultura. Para a Defensoria de Direitos Humanos de Minas Gerais, não adianta blindar a juventude negra, sem se discutir políticas que reforçam o racismo estrutural. Na oportunidade, a Secretaria Municipal de Segurança e Prevenção informou que estão sendo construídas, na Guarda Municipal, estruturas internas para a criação de uma rede de proteção para a comunidade negra.  

Racismo e desemprego

Requerida pela vereadora Macaé Evaristo (PT), audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor, em maio de 2021, debateu políticas públicas para combater a discriminação racial no município, em alusão ao dia 21 de Março (Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial). A vereadora explicou que nesta semana em que se comemora o Dia da Abolição da Escravatura, 13 de maio, “devemos nos atentar para esta data de luta e de denúncia e aprofundar nesta temática racial”.

A militante do movimento negro e representante do Coletivo Nacional de Entidades Negras, Luana de Souza, afirmou que a população negra encontra-se em situação de miséria e vulnerabilidade, sem acesso à informação, à educação e à cultura e que é urgente implementar políticas públicas que garantam a inserção de jovens negros no mercado de trabalho, por meio de ensino técnico. Já a co-coordenadora do Grupo de Extensão e Pesquisa da UFMG e advogada Rayhanna Fernandes ponderou que um sistema de discriminação baseado em estereótipos predeterminados dita qual deve ser a ocupação dos negros no mercado de trabalho. 

O subsecretário de Direito e Cidadania de Belo Horizonte, Thiago Alves Costa, destacou a importância do esforço conjunto com outras secretarias para implementar o Plano de Promoção da Igualdade Racial e para capacitar agentes públicos. Para a diretora de Reparação e Promoção da Igualdade Racial, Makota Kizandembu, o Conselho Municipal de Igualdade Racial é a principal ferramenta para que a população negra de BH proponha, fiscalize e monitore políticas de igualdade racial; e é necessário pensar em um plano de desenvolvimento econômico para a população negra.

Mercado de trabalho precarizado 

Com o tema “Racismo e Trabalho: a juventude quer direitos!", em novembro de 2021 a Comissão Especial de Estudo debateu a discriminação racial no mercado de trabalho e no direcionamento de políticas de educação. Na reunião, relatou-se que, segundo dados do IBGE, além de representarem maior parte dos desempregados e desocupados, os negros são maioria dentre os que preenchem vagas em atividades precarizadas, como o transporte por aplicativos. Para Iza Lourença, faltam mais oportunidades para a população negra e periférica por causa da história de racismo no país. 

Para o Projeto Pretanças, há um processo de exclusão dos negros em espaços da cidade capazes de desenvolver profissionalmente esses jovens. Trabalhadores que realizam entregas e participaram da audiência reforçaram que empresas de aplicativo acolhem mais negros que outras empresas. Entretanto, o emprego não oferece segurança, podendo trazer, inclusive, prejuízos.

Conforme ressaltou a Promotoria de Justiça do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça das Crianças e dos Adolescentes de Minas Gerais, a população negra é maioria, mas ocupa, em contrapartida, 2/3 das prisões, 2/3 da juventude morta e 2/3 dos desempregados. Para a promotoria, educação de qualidade e políticas conscientes de profissionalização de jovens são fatores fundamentais para mudar esse cenário. 

Comunicação e tecnologia

Com o tema “Juventude Negra Resiste!”, outra audiência da mesma comissão em dezembro de 2021 debateu avanços que a juventude negra periférica tem conquistado por meio de estratégias específicas de comunicação, mas que ainda esbarram na ausência de políticas públicas perenes e do pleno acesso à internet.

Para o Comitê Gestor do Centro de Referência das Juventudes (CRJ)/BH, deveria haver mais CRJs nas regionais de Belo Horizonte; e ser ampliado o acesso à internet para jovens negros, ressaltando-se a importância de cursos profissionalizantes para se criar oportunidades de emprego para essa população. A Empresa Mineira de Comunicação (EMC), que dirige a Rádio Inconfidência e a TV Rede Minas, reconheceu, no encontro, o tratamento muitas vezes estereotipado dado pelas grandes emissoras de comunicação a essas comunidades, ressaltando o papel da TV pública como espaço de visibilidade desse grupo.

Outro projeto voltado à juventude negra periférica da capital é o Conecta Cabana, na Cabana Pai Tomás, Região Oeste de BH. Dirigida pela jornalista Lorraine Batista, moradora da vila, o trabalho, feito utilizando-se as principais redes sociais (Facebook, Instagram e WhatsApp), tem mudado a forma como a comunidade se enxerga. 

Políticas públicas contra o racismo

Em alusão ao Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, foi realizada audiência pública pela Comissão de Direitos Humanos, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor. Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação e Relações Étnico-Raciais (Neper) da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Vitória Régia Izaú explicou que a história contada sob um único prisma está fadada a se repetir, apagando a diversidade dos sujeitos que a integram. Na oportunidade, destacou-se que o Brasil conta com a Lei 10.639/2003, que inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira”, bem como a Lei 11.645/2008 que também torna obrigatória a inclusão da história e cultura indígena na rede de ensino. 

A diretora de Políticas de Reparação e Promoção da Igualdade Racial da PBH, Makota Kizandembu, explicou que sua diretoria construiu um planejamento de capacitação e formação dos servidores municipais, com o intuito de combater o racismo, incluindo atividades direcionadas aos servidores da Secretaria de Segurança. Ela também defendeu que o Estado assegure políticas de reparação para pretos, indígenas e ciganos.

Exercendo seu papel de fiscalização, em 2021 as comissões também encaminharam à Prefeitura e ao governo estuadual pedidos de informação sobre o tema questionando, entre outros assuntos, o acolhimento a vítimas de discriminação racial durante a pandemia da covid-19, políticas de enfrentamento ao racismo e à violência contra negros, programas específicos para prevenção, responsabilização de agentes públicos e identificação racial para a produção de dados sobre segurança pública, educação, saúde, assistência social e serviços especializados. 

Superintendência de Comunicação Institucional