HIPERSENSIBILIDADE AUDITIVA

Impacto de estampidos de fogos de artifício em pessoas autistas esteve em debate

Proteção de pessoas com Transtorno do Espectro Autista contra barulhos intensos esteve no centro da discussão

quarta-feira, 20 Outubro, 2021 - 19:30
Imagem das luzes dos fogos de artifícios na tela do celular. Ao fundo a tela do comutador com a imagem dos participantes da audiência

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Com o objetivo de debater os impactos negativos que o barulho dos fogos de artifício causa às pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA),  a Comissão de Saúde e Saneamento realizou audiência pública, nesta quarta-feira (20/10),  a pedido dos vereadores Irlan Melo (PSD), Miltinho CGE (PDT) e Wesley (Pros). Além de ouvir profissionais da área de saúde e educação e familiares de autistas, a comissão também atentou para o posicionamento de trabalhadores e empresários do setor de fogos de artifício. Irlan esclareceu que o PL 79/2021, de autoria dos proponentes da audiência e cuja tramitação está suspensa, pretende proibir o manuseio, a utilização, a queima e a soltura de fogos de estampidos, assim como de quaisquer artefatos pirotécnicos de efeito sonoro ruidoso. Ele explicou que a proposta da audiência pública é aprofundar o debate com vistas a aperfeiçoar o projeto para que seja apresentada a melhor proposta para a sociedade.

Miltinho CGE afirmou que a ideia não é prejudicar a indústria de fogos de artifícios, aumentando o desemprego, mas sim, proteger a vida das pessoas com sensibilidade auditiva, os idosos e também os animais.  Ao concordar com a necessidade de manutenção de postos de trabalho, Wanderley Porto ( Patri) afirmou que é necessário haver uma adaptação das empresas - retirando os ruídos dos artefatos- para atender à demanda de parcela da sociedade.

Respeito e solidariedade
Mãe de uma criança com deficiência, Karolina Alvarenga, do projeto Angel Hair, fez um convite para que as pessoas reflitam sobre “o espaço do outro e o respeito ao próximo” e sobre o que é entretenimento. De forma bem didática, ela explicou que pessoas com mobilidade reduzida têm a musculatura comprometida e que o barulho pode provocar espasmos nessas pessoas, sendo que até um pequeno estalo pode assustar uma criança com deficiência. 
A pediatra Patricia Gadeja ressaltou a importância do cuidado que deve ser dispensado às pessoas com deficiência para garantir proteção dentro e fora de casa. Para ela, não existe comemoração ou alegria “ao custo do sofrimento de outra pessoa”. Já o presidente da Associação de Apoio às Pessoas com Doenças Raras (Aadora), Igor Monteiro, ponderou que, na impossibilidade de eliminar o problema, que sejam estabelecidas medidas compensatórias. Segundo ele, nem todas as pessoas têm acesso à rede de atendimentos necessários e essa seria uma forma de contribuir com a saúde delas. 

Bom senso nas propostas
Professora da Rede Municipal de Ensino de BH, Priscila Dias enfatizou que a realização de uma audiência pública para tratar do tema já é uma forma de inclusão e ponderou que é necessário ouvir os dois lados. Ela defende a manutenção dos postos de trabalho, mas declarou que “do jeito que está, não é possível continuar”. Lúcia Belico, que cuida da mãe com Alzheimer, reiterou que até mesmo um trovão provoca alterações neurológicas em sua mãe, que costuma ficar agitada nessas situações em que há muito barulho. “É preciso encontrar uma solução para amenizar os estampidos que, embora sejam maravilhosos, atrapalham a saúde dessas pessoas”, afirmou ao reforçar que não é intenção “acabar com o emprego de ninguém.”

Método de Organização Neurológica
Para Ana Beatriz, mãe de uma criança com (TEA), não adianta proibir os fogos de artifícios, pois há uma infinidade de ruídos. Ela contou a história do filho autista, que atualmente consegue ir ao cinema e se encanta com os fogos de fim de ano após ser exposto ao Método de Organização Neurológica. “As famílias podem ajudar estimulando as crianças de forma correta e segura. Pensem nas famílias que dependem da indústria de fogos - que são uma parte ínfima na diversidade de barulhos que nossas crianças precisam enfrentar como sirenes, buzinas e tantos outros”, sinalizou.
O vereador Miltinho afirmou que a fala de Ana pode até ser um incentivo para as mães, mas advertiu que não é possível ensinar os animais a não terem medo. 
Marjore Reis, professora da Rede Municipal de Ensino e mãe de autista com hipersensibilidade auditiva aguçada, também discordou. “Fica parecendo que a família não está estimulando os filhos. A gente estimula sim, e entrar em acordo para reduzir os ruídos vai trazer benefícios para todo mundo”, alertou. Com formação acadêmica para cuidar de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), ela assegura que a maioria dos fogos são inesperados e é essa surpresa que prejudica a organização da criança. “O meu filho tem acesso aos tratamentos, mas temos que pensar em quem não tem. Estamos falando de política pública, pois nem todos têm os mesmos recursos”, afirmou.

Ameaça aos postos de trabalho 
O secretário municipal de Desenvolvimento da cidade de Santo Antônio do Monte, Célio Cabral, enfatizou o papel da cidade no desenvolvimento do Estado, destacando que o município é o maior polo de fogos de artifícios do país. Segundo ele, os fogos não são a única fonte de barulho que interfere na qualidade de vida das pessoas com autismo. Além disso, ele afirma que não existem fogos sem estampidos. Ao destacar que não é uma simples atividade, Célio Cabral advertiu que o PL - da forma como se encontra -  vai exterminar a indústria de fogos e vai cortar cerca de 1,6 milhão de empregos diretos e indiretos. “Outras cidades do centro-oeste do Estado também dependem desta atividade”, disse. 
O secretário garantiu que a indústria quer encontrar uma forma de continuar com a produção, e sugeriu que o poder público estabeleça, como foi feito na Europa, o número de decibéis permitido.
Vereadora da cidade de Santo Antônio do Monte, Evelyn Couto (Podemos) também ressaltou a importância da indústria de fogos, que gera mais de 8 mil empregos diretos na cidade. Embora seja solidária às famílias que sofrem com o barulho, ela defendeu a manutenção da atividade.  A parlamentar concordou com Célio Cabral ao argumentar que o PL apresentado é muito restritivo e desconsidera a existência de muitos tipos de fogos. Evelyn sugeriu que seja feito um estudo para tipificar de forma detalhada os produtos e para estipular quantos decibéis serão permitidos, uma vez que, segundo ela, a proposta de BH servirá de modelo para todo o país. 
Funcionária da indústria de pirotecnia, Marcia Oliveira não acredita que a solução seja parar com os fogos de artifícios. Assim como Evelyn, ela defendeu a manutenção dos empregos  e o sustento das famílias.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Explosivos no Estado de Minas Gerais (Sindiemg), Magnaldo Geraldo Filho, assegurou que a indústria está trabalhando para para atender às expectativas daqueles que se sentem atingidos. “Não somos insensíveis à causa nem queremos prejudicar ninguém, mas geramos emprego e renda e queremos encontrar uma solução que seja boa para todos”, afirmou. 

Atendimento na rede pública de BH
Os representantes da Secretaria Municipal de Saúde de BH foram unânimes ao afirmar que desconhecem o teor do projeto de lei que deu origem à audiência pública. Eles salientaram a relevância do debate e consideraram a possibilidade de fazer uma análise mais cuidadosa para contribuir com o tema. Sheila Novaes, gerente da Rede Ambulatorial Especializada  informou sobre o atendimento ofertado na rede pública e sugeriu que o PL deve encontrar um equilíbrio entre as partes.  
Já o gerente adjunto da Rede de Saúde Mental, Flavio Benigno, explicou que o atendimento às pessoas autistas oferece ainda um apoio para as famílias. Ele se comprometeu a contribuir com o avanço da proposta encaminhando uma nota técnica para a Comissão. 
Irlan Melo agradeceu a oferta e ressaltou que o PL está em construção sendo necessárias ainda outras audiências. "Precisamos entender o outro. O que estamos fazendo é projetar o futuro das crianças, dos autistas e dos animais”, afirmou. 
Wesley sugeriu que, para as próximas reuniões, os produtores apresentem dados com o número de decibéis produzidos hoje e em quanto poderiam ser reduzidos. “Estamos nos preparando tecnicamente para podermos nos posicionar com clareza quando o PL for a Plenário”, finalizou. 

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional 

Audiência Audiência pública para debater o efeito dos fogos de artificio com estampidos, assim como de quaisquer artefatos pirotécnicos de efeito sonoro ruidoso, nas pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)