Em depoimento, ex-procurador reconhece dívida da PBH com construtora
Rúsvel Beltrame foi ouvido nesta manhã e afirmou não acreditar na possibilidade de devolução de valores por parte da empresa
Foto: William Delfino/CMBH
“Foram duas ações em trânsito em julgado (encerradas) e acredito que estas questões estão bem sedimentadas”. A declaração foi dada na manhã desta segunda-feira (22/6) pelo ex-procurador-geral do Município de Belo Horizonte, Rúsvel Beltrame Rocha, durante oitiva na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura débitos do Município com a construtora Andrade Gutierrez. A afirmação de Beltrame foi dada em resposta a questionamento feito pelo vereador Jair Di Gregório (PSD), sobre a possibilidade de haver devoluções de valores por parte da empresa à administração municipal. Para a reunião desta manhã estava prevista também a oitiva do ex-secretário Municipal da Fazenda, José Afonso Bicalho, entretanto, em função de indisponibilidade de agenda do convidado, nova data foi agendada para o dia 29 de junho (segunda-feira), às 9h30. Ainda durante o encontro, os parlamentares aprovaram novos requerimentos que darão continuidade aos trabalhos da CPI. Confira aqui o resultado completo da reunião.
Ações anteriores e auditoria
Servidor de carreira e integrante do quadro da Procuradoria Geral do Município desde 1996, Rúsvel Beltrame foi procurador-geral de praticamente todo o período dos dois mandatos do prefeito Marcio Lacerda. Nomeado em julho de 2012, Beltrame permaneceu no cargo até 31 de dezembro de 2016, e segundo o ex-procurador-geral, após apenas seis meses na função tomou conhecimento da dívida do Município com a construtora (duas últimas parcelas). “O contato que tive com o instrumento (dívida) foi este período de oito meses. Período em que então pedi a auditoria, que foi realizada e encaminhada para o processo de pagamento”, explicou Beltrame, dizendo que seu pedido à época foi mesmo para entender um pouco do que se tratava.
A auditoria, a qual o ex-procurador se refere, foi feita segundo ele por uma equipe de três auditores da Controladoria-Geral, todos servidores de carreira do Município, e na ocasião o relatório apontou um valor de R$1,3 milhão sobre o débito em aberto no valor de R$ 35 milhões. De acordo com o ex-procurador, o montante adicional foi justificado em uma glosa (nota técnica) feita pelos auditores, em que consideravam valores multa, juros e correção monetária, contidos na confissão de dívida feita pelo Município em 1999. Perguntado sobre sua concordância sobre este valor adicional, uma vez que o relatório não anexava documentação de cálculos ou planilhas, Beltrame esclareceu confiar no trabalho feito pela equipe da Controladoria. “Não posso aqui entrar na técnica do parecer, dos números. Ele foi feito por três auditores, servidores de carreira, por três, não por um; de tal sorte que eu tenho que confiar neste parecer sim”, observou o ex-procurador, que lembrou que a dívida venceu em 31 de janeiro e só foi paga em abril, três meses depois.
Perguntado pelo vereador Jair Di Gregório se no seu entendimento haveria chances de a Prefeitura conseguir o ressarcimento, por parte da empresa, de valores pagos indevidamente pelo Município, o ex-procurador disse acreditar não haver espaço para isso, uma vez que duas ações já tramitaram em julgado em favor da empresa.
Próximas oitivas e pedido de liberação
Além da oitiva do ex-secretário Municipal de Fazenda, José Afonso Bicalho, que não pôde ser realizada e foi remarcada para a próxima segunda-feira (29/6), às 9h30, estão agendados ainda para a mesma data os depoimentos de representantes da Construtora Andrade Gutierrez. Às 10h a Comissão irá ouvir o ex-presidente da empresa, Otávio Marques de Azevedo, e às 10h30, dá o seu depoimento o presidente que assina as procurações, Fernando Leyser Gonçalves. Este último, embora tenha enviado ofício à Comissão pedindo a liberação de sua participação, alegando que não estava na empresa à época da realização e execução dos contratos, teve a solicitação negada por votação da maioria dos membros da CPI. “O diretor (Fernando Leyser) precisa entender que não estamos convocando uma pessoa, mas um cargo de direção de uma empresa que precisa ter uma memória, com dados e informações”, argumentou o vereador Gilson Reis (PCdoB), ao votar pela manutenção da oitiva.
Para as próximas segundas-feiras estão agendadas ainda outras oitivas:
Dia 6/7 – Ex-prefeito de BH à época dos pagamentos investigados, João Pimenta da Veiga Filho (9h30); ex-prefeito à época dos pagamentos investigados, Fernando Damata Pimentel (10h); e conselheiro do Tribunal de Contas de MG ou indicado deste, Mauri José Torres Duarte (10h30);
Dia 13/7 – Ex-prefeito de BH à época dos pagamentos investigados, Marcio Lacerda (10h); e procurador-geral do Ministério Público de MG ou um indicado deste, Antônio Sérgio Tonet (10h30).
Relembre a CPI
A CPI que apura os débitos do Município com a Andrade Gutierrez foi criada no inicio do ano passado com o objetivo de apurar se acordos entre a Prefeitura e a construtora para o pagamento de contratos, celebrados há 40 anos, para obras do Túnel da Lagoinha, canalização do Ribeirão Arrudas e remoção de aguapés na Lagoa da Pampulha seriam lesivos ao erário. A suspeita é de que o Município tenha pagado algo como R$ 2,5 bilhões para saldar uma dívida que inicialmente era de R$ 269 milhões. Na sua primeira reunião, os vereadores Pedro Patrus (PT) e Jair Di Gregório (PSD) foram eleitos, respectivamente, presidente e relator da CPI. Em fevereiro deste ano, entretanto, o parlamentar do PDS abriu mão da relatoria e o então vereador Mateus Simões (Novo) assumiu a função.
Nos meses seguintes, a CPI avança e ouve o procurador-geral de Betim, Bruno Cypriano, que traz à Comissão a denúncia sobre um possível modus operandi da construtora que já teria realizado contratos semelhantes em outras cidades do país, incluindo Betim, que também teria sido lesada em seu erário. Em março, a CPI convoca para depor o ex-prefeito Marcio Lacerda e o ex-procurador-geral do Município, Rúsvel Beltrame; nas datas agendadas os depoentes não comparecem e justificam problemas de agenda.
No início de março, a CPI então convoca o ex-prefeito Fernando Pimentel e o ex-procurador do Município, Marco Antônio Rezende Teixeira. Alegando agenda anterior de trabalho, o ex-prefeito não comparece, e em depoimento Teixeira confirma que nada da dívida com a construtora havia sido pago pela Prefeitura. Ainda no mesmo mês, o então relator da CPI, Mateus Simões renuncia ao mandato para assumir o cargo de secretário-geral de Governo do Estado, ficando vago o posto de relator. Antes do encerramento daquele mês, todas as atividades legislativas da Casa foram suspensas, em função da pandemia do coronavírus.
Em maio, a Comissão retoma os trabalhos e o suplente de Simões, vereador Dr. Bernardo Ramos (Novo) é eleito para o posto de relator. Novo prazo para encerramento da CPI é definido e o relator apresenta relatório parcial e novo o calendário com novas oitivas.