AMEAÇA AO MEIO AMBIENTE

Inércia da PBH na desapropriação da Mata do Planalto preocupa defensores

Decreto assinado em 2021 pode expirar em 2025 e jogar por terra 20 anos de luta da comunidade para preservar a área

segunda-feira, 1 Julho, 2024 - 19:45
Imagem da mesa de reunião. Na cabeceira, os vereadores dr Célio Frois (PV)  e Jorge Santos (Republicanos ) e a deputada estadual Bela Gonçalves (Psol)

Foto: Abraão Bruck /CMBH

A insegurança jurídica do Decreto Municipal  17.775/2021, que desapropriou a Mata do Planalto, foi uma das maiores preocupações dos defensores dos movimentos pela preservação das matas que participaram da audiência pública realizada nesta segunda-feira (1º/7) pela Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana. Além da possibilidade de caducidade do documento em 2025, há o temor de que o futuro governante da cidade revogue o decreto e permita a construção de moradias de alto padrão na área de preservação ambiental. Em ambos os cenários, a luta pela preservação da mata estaria perdida. A Prefeitura assegurou que o Município tem interesse em concluir o processo de desapropriação, mas o assunto foi judicializado. Solicitante do debate, Dr Célio Frois (PV) lembrou que há 20 anos a comunidade luta pela desapropriação e preservação da área e que esta é a 6ª audiência pública que a Câmara Municipal faz para tratar do tema. O vereador se comprometeu a articular uma reunião com o prefeito e representantes dos movimentos de proteção das matas.

De acordo com a Procuradoria-Geral do Município, há três valores distintos em relação à área a ser desapropriada e, diante disso, a Justiça deverá se manifestar. “A Direcional afirma que o terreno vale R$ 68 milhões, a SMMA afirma que o terreno está avaliado em torno de R$ 15 milhões, e a perícia do Judiciário apresenta no processo o valor de R$ 28 milhões”, diz trecho de documento enviado pela PGM. 

Falta de vontade política

As defensoras da mata Magali Ferraz e Margareth Ferraz reclamaram da “inércia” da PBH e da determinação da Direcional em seguir recorrendo das decisões judiciais na tentativa de cancelar a ação popular movida para preservar a área. As irmãs também se queixaram da falta de diálogo com o Executivo. “O prefeito Fuad não recebe o movimento para conversar. A PBH sempre privilegiou os grandes construtores e precisamos de uma resposta urgente”, afirmaram. 

Presidente da Comissão de Defesa, Cidadania e Interesses Coletivos ao Cidadão da OAB, Wilson Campos alegou que, mesmo que não tenha havido uma negociação antes da judicialização do processo, ainda está em tempo de negociar. Para ele, não há que se abrir mão daquela área para o setor imobiliário. Ele questionou se as empreiteiras têm dívidas tributárias que possam ser abatidas quando da negociação.

Já a idealizadora do Movimento SOS Mata do Jardim América, Juliana Minardi, afirmou que é preciso rever a legislação e contemplar as áreas verdes na Transferência do Direito de Construir (TDC), que atualmente não valoriza as áreas verdes, o que pode ser visto como uma desconsideração do direito do proprietário. Ela defendeu que além da preservação total da mata é preciso assegurar o acesso da população a esses espaços.

Professora da UFMG, Andréa Zhouri afirmou que existem diversos pareceres e notas técnicas comprovando a relevância da área para a cidade de Belo Horizonte. “O que vejo aqui é ausência de vontade política, de senso cívico, de senso de gerir a cidade para o cidadão e não para o capital”, disparou. Ela enfatizou a diferença entre ter a cidade como direito e ter direito à cidade. No primeiro caso, o cidadão participa da construção da cidade, e no segundo, usufrui. “Queremos o direito de construir a cidade que queremos. Nem tudo pode ser comprado”, afirmou. 

Judicialização

Frei Gilvander, da Comissão Pastoral da Terra, rebateu a informação de que a judicialização do processo impede a Prefeitura de tomar posse da área. “Se o decreto de desapropriação foi publicado, ainda que o proprietário discorde dos valores, o processo segue adiante e a Justiça vai deliberar sobre o valor a ser ressarcido”, disse. Segundo ele, a PBH tem os meios jurídicos para tomar posse da Mata do Planalto, uma vez que a discussão sobre valores não pode revogar o decreto. 

O ativista também abordou a importância da área para conter os efeitos nocivos das chuvas intensas. Ele considera irrelevantes as bacias de contenção construídas pela PBH se comparadas com a capacidade de contenção da Mata do Planalto que, segundo sustentou, “corresponde a 500 bacias dessas que a PBH está construindo pela cidade”.   

Crise climática

A ambientalista Carla Magna destacou a importância da Mata do Planalto para a proteção de nascentes e afirmou que não se pode desmerecer os avanços do Executivo na proteção do meio ambiente, como os jardins filtrantes, por exemplo. “Entretanto, precisamos que os vereadores não votem contra a Mata do Planalto e que o prefeito faça uma interlocução com as construtoras e resolva a questão. O tempo do discurso já passou”, afirmou. 

“A emergência climática é prioridade e não pode ser tratada como uma questão subalterna”, disse a defensora pública Ana Claudia. Ela esclareceu que a Defensoria Pública já se manifestou a favor da desapropriação e da preservação da Mata do Planalto, e sugeriu que o tema seja levado ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania Ambiental (Cejusc) para que “o direito das futuras gerações seja garantido”. 

Segundo ela, no processo da Direcional - que é o principal - a perícia concluiu que o terreno vale R$28 milhões, R$13 milhões a mais que a avaliação da PBH. E que, nesse mesmo processo, a Direcional fala em R$68 milhões, mas admite receber o valor proposto pela perícia. “Em 2022, pedimos por meio de ação pública uma tutela antecipada, que foi rejeitada no ano passado.  A demora da PBH em tomar posse do terreno e começar a efetivar as ações de preservação, coloca em risco todo esse patrimônio natural. É preciso colocar os valores ambientais acima dos econômicos”, afirmou. 

Interesse público

O interesse do Município na preservação da área e a importância ecológica e ambiental do espaço foram ressaltados na fala do representante da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Dany Silva Amaral. Segundo ele , além da presença da mata atlântica e do cerrado, a Mata do Planalto - indicada no Plano Diretor da Cidade como área de preservação ambiental - apresenta dezenas de nascentes de ótima qualidade e é uma ilha de biodiversidade e de conforto térmico, sem falar da sua importância como bacia de contenção.
Ele ressaltou que a SMMA emitiu parecer técnico em 2022 elencando o conjunto de atributos da Mata do Planalto e sugeriu à Administração Municipal a criação de um corredor ecológico entre a mata e o parque do Planalto, o que foi atendido. Ao defender que existe um interesse claro da municipalidade para manter a desapropriação e proteger a área, ele afirmou que “o Município tem feito todas as construções possíveis para desapropriar essas áreas, mas os trâmites jurídicos precisam ser observados”.

Dr. Célio Frois se comprometeu a levar o tema para o Cejusc e assegurou que vai pedir uma reunião com o prefeito, a Secretaria de Governo e integrantes das Comissões de Legislação e Justiça e de Meio Ambiente, além de representantes dos movimentos de proteção das matas. “Precisamos deixar claro que a prorrogação do decreto não é prioridade do movimento, mas a desapropriação definitiva”, afirmou. 

Superintendência de Comunicação Institucional 

Audiência pública para promover debate sobre a situação da Mata do Planalto - 21ª Reunião Ordinária - Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana