Conhecimento e atuação em rede podem prevenir abusos sexuais de crianças
Em audiência pública, especialistas reconheceram que o problema é complexo e defenderam acolhimento das famílias
Foto: Dara Ribeiro /CMBH
Este mês é marcado pela campanha Maio Laranja, com o fortalecimento de ações de combate ao abuso infantil em todo o país, sendo dia 18, o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. O enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes foi tema de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, Habitação, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor, nesta terça-feira (7/5). Especialistas destacaram a importância do trabalho em rede, da disseminação da informação e da observação atenta da sociedade em geral para identificação de casos suspeitos. Falta de recursos humanos, principalmente de profissionais de saúde mental, e aumento de casos foram apontados pelos conselheiros tutelares que participaram da reunião. Autor do requerimento da audiência, Cleiton Xavier (MDB) defendeu penas mais duras para abusadores: "Precisamos construir uma legislação mais rígida se quisermos combater essas atrocidades”. Ele exibiu um vídeo no qual a mulher flagrou o marido abusando da própria filha - uma criança de 8 anos - e lembrou que nem todas têm coragem de expor o abusador por medo.
Rede de proteção
Representante da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania (Smasac), Marcel Belarmino destacou a responsabilidade do poder público de promover debates dessa natureza durante todo o ano e não apenas no mês de maio. Ele fez um apanhado das ações realizadas pelo poder público no combate à violência sexual e na proteção da criança e do adolescente, como, por exemplo, a forte interlocução entre as secretarias com o objetivo de conscientizar a população sobre o problema complexo; a divulgação dos canais de denúncia; e a criação de uma cartilha virtual com orientações sobre as medidas e encaminhamentos a serem observados em casos de abusos.
Marciel Belarmino elencou as instituições municipais voltadas para o atendimento desses casos e destacou os 34 Centros de Referência de Assistência Social, nove centros de referência especializados voltados para o atendimento das famílias que vivenciam violações de direitos, incluindo os serviços de atendimento e a oferta de proteção social a essas famílias; e o Centro Pop Mirim , voltado para o atendimentos de crianças e adolescentes em situação de rua, além do Disque 100. Para o representante da Smasac, a informação é a melhor arma para prevenir o abuso.
A representante da Secretaria Municipal de Educação (Smed), Marília Sales, também pontuou a atuação do órgão no combate à violência e exploração sexual infantil, com destaque para o trabalho intersetorial realizado com outros órgãos municipais. Ela ressaltou a importância de encaminhar casos suspeitos ao Conselho Tutelar para que seja feita a devida investigação e, se for o caso, tomar as medidas cabíveis em cada episódio. Marília Sales contou que, em 2023, foram encaminhados, via Smed, 225 casos suspeitos de violência sexual, sendo 43, na educação infantil. “Só neste ano, já houve 32 encaminhamentos ao Conselho Tutelar. Ao notificar, eu protejo essa criança”, reforçou.
Apoio da sociedade
A psicóloga Thais Aquiles, do Instituto Mila (Movimento Infância Livre de Abusos), concorda que a informação é uma arma potente e defende que haja espaço nas escolas, igrejas e associações para tratar do tema e promover a prevenção. “Esse tipo de violência deixa marcas profundas e o abusador pode estar na família”, afirmou. Ela citou os casos divulgados na internet sobre líderes religiosos, “pessoas acima de qualquer suspeita”, agindo como abusadores. “Não podemos tolerar isso, temos que agir de forma firme”, disse ao defender que a vítima deve ser acolhida e receber tratamento psicológico para quebrar o ciclo de violência, uma vez que a vítima pode vir a se tornar algoz.
Quem também condenou o comportamento de líderes religiosos que normalizam ou praticam o abuso foram os pastores Elias Silva e Marcos Paulo. Elias acredita que o pedófilo é um predador e defende a castração e o cerceamento da liberdade em definitivo. Para ele, o Município precisa investir recursos em uma rede de prevenção efetiva. Já o pastor Marcos Paulo pontuou que a empatia é uma característica humana e dividiu a responsabilidade de proteger as crianças com a sociedade. “Se você não se constrange com esse tipo de situação, há algo muito errado como você”, afirmou. Ele defendeu assistência total à mãe que dependa financeiramente do provedor abusador e sugeriu a apresentação de projeto de lei que assegure esse direito a ela.
Conselho Tutelar
A falta de recursos humanos foi o destaque na fala das conselheiras tutelares das Regiões Norte, Leste. Segundo Laurinda de Jesus, o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi) não tem profissionais suficientes para atender a demanda cada dia mais crescente. Ela também relata que a impunidade assombra a vítima e as famílias. Álida Costa lembra que o Conselho Tutelar é a porta de entrada dos casos, mas que tanto o Disque 100 quanto as escolas também podem receber e encaminhar os casos. “Os professores são ouvintes que fazem toda a diferença na rede de proteção à criança”, afirmou.
O cuidado com a família foi o centro da fala de Marta Bonfim, da Vara de Proteção à Infância e Adolescência. Segundo ela, não há como proteger as crianças sem dar segurança aos pais, que muitas vezes sabem o que acontece, mas não têm para onde ir. “O poder público acolhe apenas a criança e essa separação com o genitor pode ser traumática”, disse. Ela lembra que pessoas atípicas são as mais vulneráveis e que na classe média os casos são subnotificados. Ao concordar que a família também é uma vítima da situação, Ludmila Palhares, da OAB, destacou que o abusador não tem rosto.
O delegado de Proteção à Criança e ao Adolescente, Diego Lopes, admitiu que há limitações que muitas vezes impedem a instituição de comprovar de forma inequívoca para o Judiciário que houve o abuso. Ele acredita que a tradicional segurança pública não é capaz de prevenir esses casos, tendo em vista a sutileza do predador que primeiro ganha a confiança da criança e da família para depois abusar dessa confiança. “A arma do abusador é a confiança e a melhor forma de prevenir é com conhecimento. Precisamos falar desse assunto e chamar a atenção de toda a sociedade”, afirmou.
Superintendência de Comunicação Institucional