Possível relação entre reabertura do Shopping Oi e doação à PBH foi discutida
Secretário de Saúde confirmou inexistência de atas das reuniões do Comitê de Enfrentamento à pandemia
Foto: Cláudio Rabelo/CMBH
Em 20 de março de 2020 todo o comércio não essencial foi fechado. Em 25 de maio foram abertos, parcialmente, os shoppings populares que têm acordo com a Prefeitura para abrigar ambulantes, e, em 29 de junho, tudo foi fechado novamente. A ligação feita por Mário Valadares (dono do Shopping Oi) ao secretário de saúde oferecendo a doação de respiradores ocorreu apenas no início de julho. A construção cronológica foi feita pelo secretário Municipal de Saúde, Jackson Machado, durante depoimento dado na manhã desta quinta-feira (4/11), na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19. O inquérito que investiga as ações e os gastos do Município no combate à doença ouviu também o proprietário do Shopping Oiapoque, Mário Valadares. A suspeita da CPI é de que o empresário tenha sido beneficiado com a abertura do seu comércio quando grande parte das atividades da cidade estava fechada, ao doar para a Prefeitura oito respiradores pulmonares e também acessórios para os equipamentos. Os fatos mostrados, porém, não agradaram parte dos parlamentares que afirmam que a abertura do shopping foi uma medida equivocada que beneficiou apenas um empresário da cidade. Ainda no encontro, os vereadores questionaram Jackson Machado sobre a inexistência de atas de reuniões do Comitê de Enfrentamento da Covid-19 e consideraram o fato grave.
Shopping popular
Esta é a terceira vez que Mário Valadares depõe à CPI da Covid-19. O proprietário do Shopping Oi, que também é dono de outros estabelecimentos similares, confirmou a cronologia apresentada pelo secretário de Saúde e disse que na conversa com Jackson, este o teria orientado a conversar com André Reis, que só então o repassou a Leonardo Vilete, o gerente responsável por providenciar o descritivo dos respiradores. Diferente do que afirmou Vilete Matos à CPI, Valadares disse que conversou sim com o gerente, pois queria entender mudanças solicitadas no material especificado. “Eu pedi ao meu assessor, João Vitor, que ele (Vilete) me ligasse porque queria entender porque foram feitas mudanças na especificação dos acessórios para os respiradores”, afirmou o empresário que mostrou troca de mensagens onde Vilete diz ‘já liguei para ele’, referindo a Mário Valadares.
Perguntado pelos parlamentares se a doação não teria vínculo com a reabertura do shopping, o empresário mais uma vez negou e disse que esta foi uma decisão da Prefeitura, que permitiu não apenas a abertura do seu empreendimento, mas de todos os shoppings populares que têm acordo com o Município para acolher ambulantes que antes trabalhavam nas ruas e, por isso, teve um caráter social importante. “As pessoas que trabalham lá são egressos do sistema prisional, pessoas de baixa renda”, defendeu o empresário que afirmou que atualmente o shopping tem entre 2.500 a 3 mil funcionários.
O caráter social da medida, entretanto, foi questionado por ao menos três vereadores. Professor Juliano Lopes (Agir), que preside a CPI, ressaltou que fez questão de visitar o espaço e o que mais viu lá foram lojistas coreanos. “Não são pessoas de baixa renda. Basta dar uma olhada no estacionamento deles para ver a quantidade de carros importados”, declarou.
Mário Valadares, então, tentou se explicar, dizendo que não se trata de coreanos, mas sim chineses que estão atrás de uma oportunidade melhor. “A maioria têm filhos brasileiros e está buscando um lugar para viver, não para explorar. Não são funcionários de shoppings convencionais”, defendeu o empresário.
Professor Juliano Lopes não se mostrou satisfeito e disse que, além de ter sido beneficiado por uma medida excludente da PBH, que prejudicou o comércio do entorno, a abertura do shopping Oi causou aglomeração, exatamente o que a Prefeitura mais queria evitar na pandemia. Juliano criticou ainda o fato de a Prefeitura ter atrasado a publicação das doações feitas ao Município. “A PBH errou em publicar isso apenas um ano depois. Seu comércio foi beneficiado. Vendeu muito durante 29 dias e deu lucro. Tinham filas enormes de pessoas na porta”, afirmou o presidente da CPI mostrando imagens de reportagens feitas à época.
Publicação um ano depois
A busca do equilíbrio social e econômico também foi o argumento defendido pelo secretário de Saúde, Jackson Machado Pinto, ao justificar a abertura de seis shoppings populares da cidade durante a pandemia. “Todos os shoppings que participaram da operação urbana para retirada de ambulantes das ruas puderam abrir. E foi aberto para evitar que os ambulantes voltassem para as ruas e formassem aglomerações. Pode não ter sido uma boa ideia, mas a intenção era essa”, esclareceu.
Para o gestor, o componente de excepcionalidade da pandemia tornou todas as decisões muito difíceis e tudo o que foi feito teve como primeiro objetivo salvar vidas. Ainda segundo o secretário, a dificuldade de se reorganizar o trabalho na secretaria, por exemplo, foi o grande dificultador de se publicar as doações na sua temporalidade. “Estávamos organizando a forma de trabalhar e as doações foram chegando. Então, quando fizemos a publicação, elas estavam com as datas retroativas ao período em que ocorreram”, afirmou o secretário.
PBH não comprou nenhum respirador
Ainda de acordo com Jackson todos os respiradores adquiridos durante a pandemia vieram de doações e não houve nenhuma compra por parte da PBH. Dos 10 que chegaram à rede municipal, oito foram doados pelo Shopping Oi e dois pela Fundação Educacional Lucas Machado (Feluma). Questionado por Flávia Borja (Avante) sobre como se deu, então, a abertura de leitos de CTI sem a aquisição de respiradores, o secretário explicou que os leitos abertos aconteceram também em hospitais parceiros como São Francisco, Santa Casa e Ciências Médicas. “O Odilon Behrens já tinha seus respiradores e os leitos abertos em outros hospitais eles mesmos providenciavam os respiradores”, explicou o secretário que também confirmou não ter havido mortes na cidade em função da falta de leitos.
Ausência de atas
Outros dois pontos levantados pelos parlamentares foi quanto à ausência de atas do Comitê de Enfrentamento da Covid-19 e da diferença de protocolos adotada para estabelecimentos comerciais e escolas. Questionado por Nikolas Ferreira (PRTB) se as reuniões eram ao menos gravadas, o secretário disse que não foram feitas gravações e que apenas notas técnicas eram emitidas em alguns casos. “Então, eu, como cidadão, como posso saber como foram tomadas as decisões? Por meio de notas técnicas? É surpreendente. Pois é um tema muito importante para a cidade”, observou o parlamentar.
Também o presidente da CPI questionou o secretário sobre a inexistência das atas e recordou que todos os atos da administração pública devem estar registrados em atas, conforme prevê a lei. “Infelizmente, tenho que dizer, foi infringida uma lei federal, a Lei 9.794/1999. A Prefeitura falhou e muito, porque funcionário para fazer uma ata lá tinha aos tantos”, afirmou.
Ao responder os questionamentos o secretário disse que na maior parte das vezes as reuniões ocorriam de forma remota e raramente no prédio da PBH e confirmou a inexistência das atas. “Tomamos as decisões com base em mais de 200 estudos científicos que tenho aqui no meu telefone e posso passar para a comissão, caso desejem”, afirmou o secretário que disse ainda que no caso específico das escolas, foi adotado o protocolo preconizado pela Centers For Disease Control and Prevention (CDC).
Assista ao vídeo com a íntegra da reunião.
Superintendência de Comunicação Institucional