VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Vereadoras debatem ampliação e divulgação de rede de proteção

Encontro, com participação do Ministério Público e do Judiciário, foi marcado pela necessidade de fomentar o trabalho em conjunto

sexta-feira, 7 Maio, 2021 - 17:30

Foto: Claudio Rabelo/CMBH

É preciso ampliar a participação do poder público e da comunidade e incrementar as formas de divulgação da atual rede de proteção às mulheres e crianças vítimas de violência doméstica. Esta foi a principal conclusão a que chegaram vereadores e representantes do Ministério Público e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais durante audiência pública, nesta sexta-feira (7/5), que debateu a “ameaça e violência contra mulheres e crianças em tempo de pandemia”. O encontro, segundo da série que trata do tema, foi promovido pela Comissão de Mulheres; a primeira reunião aconteceu no dia 30 de abril. As vereadoras apontaram a importância do diálogo entre instituições e Poderes no sentido de fortalecer o trabalho e as parcerias na atuação realmente efetiva e reconheceram algum espaço de ação no âmbito da legislação municipal.

Números podem ser maiores

Patrícia Habkouk é promotora de Justiça e coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (CAO-VD). Ela atua há 28 anos na área e acha fundamental o estabelecimento de novas e fortes parcerias, pois tratar de violência contra a mulher é pensar em um universo muito maior que aquele que chega ao conhecimento do poder público. “Os números são sempre relativos, pois mais de 50% não contam sobre a violência que sofrem nem para o melhor amigo. A pandemia não trouxe nada de novo, mas deu visibilidade a questões como o acesso das mulheres ao sistema e ao acionamento da Justiça”, explicou Patrícia. A promotora disse acreditar na importância da Lei Maria da Penha, que completa 15 anos, marco na criação de mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Questionada pela vereadora Macaé Evaristo (PT) sobre o número de mulheres vítimas de feminicídio que estavam sob medidas protetivas, Patrícia disse que não há dados que digam quais são as mulheres em medida protetiva e morreram, mas afirmou ter certeza que medidas protetivas salvam vidas. “Alguns ministérios públicos estaduais fizeram levantamento mostrando que a grande maioria das mulheres que morreram não fizeram nenhuma denúncia”, afimou a promotora.

O caminho até a violência doméstica física muitas vezes tem início em agressões verbais, assunto levantado pela vereadora Professora Marli (PP). Segundo ela, se houvesse como intervir ainda durante a agressão verbal, diminuiria a violência física. “A agressão verbal é considerada o quê (dentro do processo de proteção)?”, perguntou. De acordo com Patrícia Habkouk, a própria Lei Maria da Penha enquadra a agressão verbal, o constrangimento e a calúnia. “Agressão verbal se encaixa na violência moral e psicológica. E por isso temos que pensar em campanhas que refletem sobre isso. Muitas vezes ouvimos mulheres falando assim: ‘ele não me bateu, só me chamou de vagabunda’. A ofensa é violência e cabe na Lei Maria da Penha”, explicou a promotora.

Rede de atendimento

Novos canais e estruturas de atendimento estão sendo criados no sentido de facilitar o acesso de quem sofre violência ao atendimento por parte do poder público. Um exemplo é o Formulário Nacional de Avaliação de Risco. Criado em março de 2020, o formulário é um instrumento de prevenção e de enfrentamento de crimes e demais atos praticados no contexto da violência doméstica e familiar contra as mulheres, e possibilita diagnosticar e identificar se a mulher se encontra em situação de risco. Por meio dele, os profissionais que atuam no contexto da violência doméstica e familiar podem tomar decisões ou medidas de prevenção com o objetivo de evitar que novas agressões ocorram.

Segundo o juiz titular do 2º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Belo Horizonte, Marcelo Gonçalves de Paula, há um amplo trabalho na melhoria do atendimento. “Estamos construindo uma base na capacidade de atendimento à mulher. Desde a estrutura física até a capacidade de formulação de políticas importantes. BH tem uma estrutura de atendimento bem sedimentada. Criamos grupo de gestão para dar mais agilidade e estamos trabalhando na estruturação de quem atua com a saúde mental de quem sofre a violência”, destacou.  

Ainda segundo o juiz, também foram criados espaços voltados à recuperação dos infratores. Um deles é o Dialogar, criado pela Polícia Civil, onde são realizadas práticas restaurativas de convivência, valorização da vida e dos direitos humanos, por meio de oficinas de reflexão e responsabilização dos autores de violência doméstica. Conforme Marcelo de Paula, de 900 homens atendidos pelo Dialogar, apenas seis voltaram a violar as medidas protetivas. “Além disso, há hoje quatro varas de juizados especiais (voltados para o tema). Nelas entram 2000 pedidos por mês e todos são respondidos por causa da boa capacitação. Há celeridade e sincronia”, disse o juiz.

A promotora Patrícia Habkouk falou sobre o MG Mulher, aplicativo voltado à divulgação de conteúdos de orientação e informações relativas à temática da violência contra a mulher. Criado pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, o app também pode ser utilizado como suporte às vítimas por meio da operacionalização de uma rede de apoio, serviços e rápido contato em caso de violação de direitos. O aplicativo, que pode ser baixado em smartphones gratuitamente (AppStore e GooglePlay), tem duas interfaces: uma com informações sobre locais de funcionamento de serviços voltados à proteção e orientação e outra privada que permite criar uma rede de contatos para que o usuário possa, com apenas um clique, acionar, via SMS, as pessoas cadastradas quando vivenciar qualquer situação de risco ou perigo.

Em Belo Horizonte as mulheres vítimas de violência doméstica podem acessar o poder público em situações de urgência por meio do 190 (Polícia Militar); para denúncias contra mulheres e crianças pelo 180 ou Disque 100; ou presencialmente na Delegacia de Plantão de Atendimento à Mulher, na Avenida Barbacena, 288, Barro Preto.

Revitimização e divulgação

Outro aspecto tratado pelos participantes foi quanto à dificuldade das vítimas de violência quando conseguem chegar ao sistema de Justiça. Segundo Fernanda Pereira Altoé (Novo), a dificuldade no acesso direto causa ainda mais sofrimento. “Muitas vezes as mulheres violentadas acabam sofrendo com a revitimização que ocorre cada vez que têm que fazer um novo depoimento. Não há um protocolo único para a pessoa saber onde ir?”, perguntou a vereadora.

De acordo com Patrícia Habkouk o primeiro desafio é divulgar o que já existe. “Não falta interesse no aprimoramento do doloroso e tortuoso caminho das mulheres vítimas de violência. Um depoimento especial depende de toda uma construção e é preciso assegurar que não haja a revitimização”, disse a promotora. Segundo a Lei Maria da Penha, é garantido à mulher em situação de violência que não haja revitimização “evitando sucessivas inquirições sobre o mesmo fato nos âmbitos criminal, cível e administrativo, bem como questionamentos sobre a vida privada”.

Os participantes sugeriram tratar o tema desde a menor idade. Para o juiz Marcelo de Paula, o assunto tem que ir para as salas de aula. “É preciso fazer um projeto que leve o tema violência doméstica para as escolas. Já há cidades fazendo isso com previsão em lei. É preciso inserir no currículo escolar”, disse Marcelo. Para Fernanda Altoé, há problemas legais com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Também foram convidados para a audiência a PBH, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, a 1ª CIA de Prevenção à Violência Doméstica Contra Mulheres da Polícia Militar e a Defensoria Pública da Infância e Juventude. Para Flávia Borja (Avante), que preside a Comissão de Mulheres e solicitou a audiência pública, a ausência sempre prejudica o debate. “Lamento a ausência. Poderíamos ter aumentado o leque do debate ampliando para a violência contra a criança. Estamos tentando contato com o Conselho da Criança e Adolescente e não conseguimos. Os conselhos tutelares estão funcionando em horário reduzido. Lamentamos, denunciamos e já pedimos informação sobre isso”, disse Flávia.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

10ª Reunião Ordinária -  Comissão de Mulheres - Debater o tema "Ameaça e violência contra mulheres e crianças em tempos de pandemia - Módulo II"