Sindicato de metroviários e movimento Tarifa Zero repudiam reajuste do metrô
Aumento acumulado em dois anos é de 150%; entidades defendem subsídio do governo ao transporte público e rejeitam privatização
Foto: Bernardo Dias/CMBH
Desde 2007 até o início de 2019, os belo-horizontinos desembolsavam R$ 1,80 para se deslocar pelos 28 km de trilhos que ligam as Estações Vilarinho, em Venda Nova, e Eldorado, no município vizinho de Contagem. Nos últimos dois anos, porém, o valor já sofreu vários reajustes. Em março, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) anunciou aumento de 5,9% na tarifa, que passou a custar R$4,50. Em audiência da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário na quinta-feira (8/4), o Sindicato dos Metroviários, o Movimento Tarifa Zero, deputados e vereadores criticaram a falta de diálogo da empresa com trabalhadores e usuários e lamentarem a intenção do governo de privatizar a companhia que, para eles, seria o principal motivo dos reajustes.
A requerente da audiência, Iza Lourença (Psol), salientou que, além de injusto, o aumento ocorre num momento de dificuldades para os trabalhadores, e seus efeitos vão atingir principalmente os informais e os desempregados, que sofrem com mais intensidade as consequências da paralisação da economia e que mais necessitam da condução para trabalhar, procurar trabalho e buscar o acesso à saúde. “Nosso objetivo é questionar publicamente a CBTU sobre o motivo de mais um reajuste, sem nenhuma melhoria estrutural ou da qualidade de vida dos usuários e dos trabalhadores da empresa, esclareceu a vereadora, que já atuou como bilheteira do metrô.
Defasagem acumulada
O diretor de Planejamento da CBTU, Pedro Cunto, que representou o presidente da companhia e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, expôs o histórico de reajustes do sistema, que não ocorriam desde 2006, a partir de maio de 2019, escalonados em seis parcelas em razão de acordo judicial. De acordo com o gestor, embora a CBTU seja “fortemente subsidiada” pelo governo federal, que destina R$ 800 milhões às praças de metrô operadas pela companhia, dos quais R$ 300 milhões para BH, a preservação do valor real da tarifa é essencial para garantir a “mínima sustentabilidade” do sistema e promover as melhorias necessárias. Além disso, o setor não recebe nenhuma subvenção do governo estadual nem das prefeituras de Belo Horizonte e Contagem.
O gestor ressaltou que, mesmo autorizada a reajustar a tarifa em maio de 2020, a empresa adiou sua aplicação em consideração ao pedido do ministro e às dificuldades vividas pela população em razão da pandemia, que impactou o emprego e a renda. Segundo ele, a manutenção do valor de R$1,80 por 13 anos, quando o subsídio do governo chegava a 90% dos custos, gerou uma defasagem crônica na operação. Além da redução de 25% da subvenção, o aumento da receita com a recomposição tarifária nesses dois anos ficou abaixo da inflação de 9% acumulada desde janeiro de 2019, tornando necessário o reajuste em 2021. A entrada da nova tarifa em vigor foi definida para o dia 20 de março. A pedido do ministro, no dia 18 de março a data foi adiada para o dia 17 de abril; porém, em reunião realizada no dia seguinte, a Companhia voltou atrás.
O presidente do Sindicato dos Metroviários de Minas Gerais, Romeu Neto, informou que 178 mil pessoas utilizam o metrô de Belo Horizonte a cada dia, e o aumento da passagem já gerou a redução de 30 milhões de passageiros por ano. Lembrando que o transporte público é um direito social e um dever do Estado, ele afirmou que a população não pode ser sacrificada para garantir o lucro das empresas. O sindicalista lamentou que, embora seja operado pela CBTU desde sua implantação, em 1986, apesar do interesse e da utilidade pública o metrô de BH nunca recebeu os investimentos necessários para sua expansão; além disso, a ampliação do modal enfrentaria a oposição das empresas de ônibus, que preferem operar sem concorrência.
Annie Oviedo, do Movimento Tarifa Zero, queixou-se da falta de diálogo da empresa com os usuários e também repudiou o reajuste “abusivo” das tarifas, “totalmente incongruente com a realidade da população de BH, onde 74% dos usuários do metrô têm renda de até dois salários mínimos”. A ativista destacou que o aumento de 150% no valor das tarifas em menos de dois anos é “absurdo” e prejudica o acesso da população ao transporte público. Segundo ela, o belo-horizontino paga uma das tarifas mais caras do mundo em proporção à qualidade do serviço e a CBTU deve assumir sua missão perante o cidadão, barrando aumentos “injustos” e buscando subsídios para garantir a prestação do serviço.
Subvenção pública x privatização
O sindicato e o movimento também criticaram a diminuição do horário de funcionamento do metrô no período de isolamento social, agravando a crise econômica e social que atinge especialmente a população mais vulnerável, que, juntamente com os sucessivos aumentos da tarifa, visam a acelerar a privatização da companhia. “A venda para a iniciativa privada vai aprofundar ainda mais a política de reduzir custos e aumentar ganhos às custas da população mais pobre”, acusaram. Os defensores do subsídio governamental alegam que o financiamento público por meio da cobrança de impostos progressivos dos que podem pagar possibilita que todos os cidadãos possam continuar a utilizar o transporte público“.
Iza Lourença, o sindicalista e a ativista relacionaram a nova política tarifária aos planos de privatização do atual governo, que já reduziu os subsídios ao setor. "Estão acabando com a última política social de mobilidade urbana do país, de uma hora para outra, e condenando a população de baixa renda à exclusão social e urbana”, denunciou Romeu. Segundo ele, não há como desvincular o novo reajuste da tarifa do interesse em entregar o metrô de BH à privatização e que os aumentos visam garantir a lucratividade do serviço à iniciativa privada. “O lucro não pode estar acima da vida dos mais pobres, que eram mais de 70% dos usuários do metrô quando podíamos contar com uma tarifa acessível e justa”, observou.
O diretor da CBTU contestou a vinculação entre os reajustes e a desestatização, informando que a recomposição tarifária realizada entre 2019 e 2020 teve início em 2018, ainda no governo Temer, quando não havia nada sendo tratado sobre a privatização da CBTU. O aumento das tarifas das estatais, segundo ele, já havia sido proposto em 2015 pelo então ministro da Economia.
Ação judicial e decreto legislativo
A deputada estadual Beatriz Cerqueira apresentou dados demográricos sobre o desemprego no país, no estado e na cidade, criticou as políticas do atual governo e a posição da CBTU, que ferem os direitos sociais. A parlamentar mencionou a ação popular movida há um mês por ela e o deputado federal Rogério Correia contra o último reajuste, a pedido do Sindimetro. O parlamentar, que também participou do encontro, disse que o tema vem sendo tratado em Brasília.
Sobre o andamento da ação, Correia informou que o juiz aguarda parecer do Ministério Público e, nesta semana, determinou prazo de 15 dias para que a CBTU e o MIR apresentem sua defesa. Ele comunicou ainda o protocolamento de um projeto de decreto legislativo excluindo os metrôs de BH e de Porto Alegre do processo de desestatização, e sugeriu que os parlamentos do Estado e do Município acompanhem de perto e promovam debates sobre os impactos da medida.
Para tentar barrar o aumento abusivo num momento tão crítico, os parlticipantes defenderam a mobilização de movimentos sociais, sindicatos, estudantes e da população na luta pela revogação do aumento e pela preservação do caráter público da CBTU, garantindo transporte de baixo preço e qualidade para todos.
Os veradores Henrique Braga (PSDB) e Rogerio Alkimim (PMN) também acompanharam remotamente a audiência pública.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional