ROMPIMENTO DE BARRAGEM

Pesquisadores alertam para risco de contaminação de manancial que abastece BH

Cercado por barragens de rejeitos de mineração, Distrito de Bela Fama é responsável pelo abastecimento de 70% da água da capital 

quinta-feira, 28 Fevereiro, 2019 - 17:30

Foto: Bernardo Dias/CMBH

A contaminação do Rio Paraopeba e os problemas trazidos à saúde da população e à economia das regiões afetadas pela lama de rejeitos tóxicos de mineração da Vale após o vazamento da barragem do Córrego Feijão, assim como o risco de desabastecimento de água em BH e cidades vizinhas, foram questões discutidas em audiência pública da Comissão de Saúde e Saneamento, nesta quinta-feira (28/2). O debate deixou o alerta para a necessidade de fiscalização das ações da Vale no que diz respeito a mitigar os prejuízos causados ao meio ambiente, e também no sentido de impedir que outras tragédias iminentes comprometam definitivamente o abastecimento de água da capital mineira. Ambientalistas chamaram atenção para os mananciais do Distrito Industrial de Bela Fama (localizado em Nova Lima), responsável pelo abastecimento de cerca de 70% da água consumida pelos belo-horizontinos e cercado por barragens de rejeitos de mineração.

De acordo com dados da Fundação SOS Mata Atlântica, destacados por Gilson Reis (PC do B), vereador que requereu e conduziu a atividade, até o momento, mais de 320 km do Rio Paraopeba estão contaminados por metais pesados decorrentes dos rejeitos da mineração. “Precisamos tomar consciência da morte de dois rios, Doce e Paraopeba, e da possibilidade de comprometimento do Rio São Francisco. Não podemos esquecer os problemas causados pela mineração, e não discutirmos somente quando houver tragédias”.

Risco em Bela Fama

Segundo Júlio César Dutra Grillo, ex-superintendente do Ibama em Minas Gerais, exonerado nesta quita-feira, além do Rio Paraopeba, a preocupação deve se voltar para os mananciais de Bela Fama. “Precisamos pedir ao Estado o balanço hídrico de Bela Fama, fazer o levantamento dos licenciamentos e outorgas existentes. Caso ocorra algum rompimento na área, teremos sérios problemas de abastecimento em BH. Toda ação política realizada deveria ser baseada em análise de sustentabilidade”.

Paulo Rodrigues, geólogo, ambientalista e pesquisador, que participou da audiência representando o Águas do Gandarela, o Movimento pelas Serras e Águas de Minas e o SOS Serra da Piedade, também destacou a preocupação com Bela Fama, no Alto Rio das Velhas, já que dele dependem mais de dois milhões e quatrocentas mil pessoas de BH e Região Metropolitana. “O Sistema Hídrico de Paraopeba só não entrou em colapso devido à captação pelos afluentes, o que não aconteceria no Rio das Velhas, caso haja algum problema com as barragens existentes em Bela Fama”.

Segundo o geólogo, atualmente, não existe um banco de dados único e confiável no governo estadual contendo o controle de informações das barragens existentes em Minas Gerais. “Os dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), da Agência Nacional de Águas e da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) não batem, cada órgão tem sua lista; há erros graves e inconsistências. É urgente uma conversa entre esses órgãos, a atualização e a consolidação de um banco de dados”.

Denúncia

Uma denúncia de moradores do município de Rio Acima e do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas de que, nos últimos 10 dias, as águas do Velhas estão com uma turbidez acima do normal também foi apresentada por Paulo Rodrigues durante a audiência. O questionamento sobre a suspeita de liberação de rejeitos no Rio Itabirito, a partir de barragens da região com nível elevado de risco, foi feita ao superintendente de meio ambiente da Copasa, Nelson Cunha Guimarães.

Segundo Guimarães, a empresa não tem informação sobre esse fato, mas será solicitada averiguação do local. Gilson Reis garantiu que ainda hoje será encaminhado um ofício da Comissão de Saúde e Saneamento à Copasa para averiguação da situação denunciada. O superintendente também esclareceu que a Copasa vem cobrando ações da Vale para que a maior parte dos rejeitos derramados pela barragem seja retida na área já afetada, além da recuperação ambiental da área devastada.

O superintendente de meio ambiente da Copasa ainda ressaltou que como medida preventiva, a companhia, por meio de um convênio com o governo do Estado, executará o plano de fechamento de uma mina de extração de ouro abandonada, que pertencia à empresa Mundo Mineração, localizada a 7 km da captação de Bela Fama, no município de Rio Acima. “O projeto foi feito pelo governo, e a Copasa já está fazendo o licenciamento. O prazo para a execução das obras é de um ano”.

Cobranças de movimentos ambientais

Para o militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Felipe Leonardo Soares Ribeiro, a sanção pelo governador Romeu Zema do Projeto de Lei 3676/16, que torna as regras de barragens mais rígidas, foi um avanço com relação à segurança, “mas é um absurdo que tenha sido feita depois de tantas mortes. No entanto, é importante garantir que a legislação seja cumprida para evitar novos crimes”.

Ribeiro ainda ressaltou que os problemas causados às pessoas que moravam às margens do Rio Paraopeba e que dependiam dele para sobreviver, os ribeirinhos, o pescador, o agricultor, dificilmente serão reparados. Além disso, há os prejuízos que extrapolam a região, como a contaminação da água, das frutas e verduras, dos prejuízos trazidos à saúde e ao Turismo. “Não existe solução a curto prazo para a questão, serão necessárias décadas para a reconstrução ambiental e da vida das pessoas. Somos todos atingidos”, declarou.

Para o pesquisador da Universidade de Ouro Preto (UFOP), Pedro Camargos, é necessária a revisão da Lei Kadir, que garante isenção do pagamento de ICMS sobre as exportações de produtos primários, e uma discussão sobre o papel da Vale e de outras empresas que não estão cumprindo o que prometeram. Pedro também destacou a importância do aumento do corpo técnico para fiscalizar as barragens e a necessidade da criação de “museus da lama” para que esse debate sempre seja lembrado.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

2ª Reunião Extraordinária - Comissão de Saúde e Saneamento