Entidades discutiram cadastro escolar pela internet, apontando desigualdades no acesso
Vereadores, sindicatos e conselheiros criticaram anúncio da PBH sobre uso exclusivo de ambiente digital para matrículas de 2021
Foto: Bernardo Dias/CMBH
Representantes do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte e sindicatos dos profissionais das redes pública e privada de ensino debateram, nesta terça-feira (22/9), em audiência pública realizada pela Comissão Especial de Estudo para Enfrentamento da Covid-19, os efeitos do cadastro remoto e do fluxo de alunos da rede municipal para o ensino médio em tempos de pandemia. Com a impossibilidade dos trabalhos presenciais, a Prefeitura anunciou que fará o cadastro escolar para 2021 em etapas e, totalmente, automatizado. Além disso, o Município deve estabelecer um regime especial de atividades escolares para os alunos do 9º ano com o objetivo de permitir que cerca de 16,4 mil alunos, incluindo aqueles da Educação de Jovens e Adultos (EJA), sejam liberados para o ensino médio. Ainda não há previsão de retorno das aulas para os outros quase 200 mil estudantes da rede pública municipal. A Secretaria Municipal de Educação foi convidada para participar da audiência, mas não enviou nenhum representante. Parlamentares devem enviar pedidos de informação à PBH para esclarecer aspectos debatidos.
Segundo Denise Romano, diretora do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE), a opção pelo cadastro remoto vai ampliar as desigualdades. “Entramos em uma espiral de exclusão social. Segundo o IBGE, 40% da população não tem internet. Temos um processo de ensaio e erro que vai oferecer matrícula online à maioria dos mineiros. Um sistema que já deu errado e que está sendo ampliado”, disse Romano, informando que 774 cidades mineiras aderiram ao sistema de matrícula online implantado pelo governo estadual. Conforme a representante do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de BH (Sind-Rede BH), Evangeli Rodrigues, o processo de cadastro e matrícula online já vem causando estragos na educação do município. “Problemas referentes ao cadastro, a gente acompanha desde 2017. Sabemos que as famílias não têm acesso à internet. O que está por trás desse cadastro é encurtar a rede pública. Cancelaram todo tipo de ação das famílias na busca pelas vagas. Precisamos fazer uma ação conjunta e cobrar da Prefeitura uma verdadeira política de inclusão digital, uma busca ativa pelos alunos e o chamamento das famílias”, destacou Rodrigues.
Em nota enviada à imprensa nesta segunda-feira (21/9), a Secretaria Municipal de Educação (Smed) informou que a decisão de fazer o processo de cadastramento totalmente online ocorre para minimizar aglomerações. No site da Prefeitura, um sistema eletrônico vai permitir que os responsáveis pelos mais de 19 mil matriculados em escolas de educação infantil coloquem o seu CPF e o nome do aluno para que seja determinada a escola. “A confirmação vai gerar um termo de matrícula, considerado como assinado eletronicamente. Este termo irá direto para a nova pasta que o aluno terá em 2021”, diz a Prefeitura no texto. Ainda segundo a PBH, “aqueles que não ficarem satisfeitos com a vaga indicada ou que não encontrarem seu encaminhamento eletrônico, poderão participar das próximas etapas que também estão sendo preparadas de forma digital, gerando segurança da trajetória escolar”. Todo o processo está previsto para ter início nesta quarta-feira (23/9) e seguir até o dia 19 de outubro.
“Esse debate tem sido muito importante e interessante. Quem veio para o diálogo está apontando para o que ouve de professores e professoras. Repudio a ausência da Smed e a ausência de diálogo”, destacou Valéria Morato, diretora do Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais, que representa os docentes do setor privado de ensino.
Fluxo escolar
“Uma família que compartilha um celular com tela quebrada tem como ter aulas online?” A pergunta foi feita por Denise Romano e sintetiza as críticas feitas pelos participantes da audiência à decisão de instituições de ensino de dar início às aulas remotamente sem que haja verdadeira inclusão digital. Segundo Romano, não há universalização de internet no Brasil, o que aumenta as desigualdades e piora a vida dos professores. “Este é um processo que não atinge a totalidade dos alunos e adoece os professores exatamente pela angústia e pela perda de referência do horário de trabalho. Para nós, se a política de educação exclui um, ela não serve”, afirmou.
A crítica foi compartilhada por Talita Lacerda, integrante do Conselho Municipal de Educação. Para ela, a situação tende a piorar com o aumento da crise econômica. “As famílias que têm (acesso online) não estão conseguindo manter a internet por causa do desemprego e da alta no preço dos alimentos. Com isso, fica ainda mais difícil resolver questões relativas à matrícula online e aulas virtuais”, explicou Lacerda.
Conforme estabelecido em portaria, publicada no dia 9 de setembro, no Diário Oficial do Município, a Prefeitura vai permitir que os alunos do 9º ano do ensino fundamental sejam liberados para o ensino médio, desde que consigam cumprir as atividades não presenciais, indicadas pelas escolas, até o dia 28 de fevereiro de 2021. O chamado Regime Especial de Atividades Escolares foi destinado ao cumprimento dos calendários escolares de 2020 “pelas unidades escolares da Rede Municipal de Educação que possuam estudantes matriculados em turmas de terminalidade do ensino fundamental e naquelas em que a continuidade dos estudos está condicionada à transferência para outras instituições de ensino”.
Para Luana Gramon, diretora do Sind-Rede BH, a portaria pode não ser a melhor opção: “somos contrários ao ensino remoto e de acordo com a Smed, não houve acerto de prazos (de matrícula no ensino médio) com a Rede Estadual”. A educadora Denise Romano acredita que ainda há muito o que se debater e construir: "todos sabemos o que os professores e os alunos têm enfrentado. Qualquer discussão, o retorno presencial - mesmo que híbrido - ou mesmo a questão do 9º ano não podem ser tratados apenas como se fossem questão de data. Pensar assim é pensar na marcação de uma data para a pessoa ter contato com o risco. Todo lugar que reabriu teve aumento de contágio. Caminhamos para 150 mil mortes no Brasil. As escolas foram as primeiras a fechar não foi à toa”, concluiu.
Encaminhamentos
As questões levantadas na audiência farão parte de pedidos de informação que serão apresentados ao Governo do Estado e à Prefeitura de Belo Horizonte, principalmente as que dizem respeito ao cadastramento escolar e ao fluxo dos alunos para o ensino médio. Os requerimentos serão apresentados na próxima reunião da Comissão Especial de Estudo para Enfrentamento da Covid-19.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional