PREVENÇÃO E PUNIÇÃO

Mudança na lei pode facilitar combate ao assédio moral no serviço público

Participação de representantes sindicais em comissões que recebem denúncias de assédio foi defendida em audiência

quarta-feira, 14 Junho, 2023 - 22:30

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Assédio moral é uma forma de violência psicológica que envolve a exposição de pessoas a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente ou no exercício profissional. No serviço público, o assédio moral se caracteriza por condutas repetitivas do agente público que, excedendo os limites das suas funções, por ação, omissão, gestos ou palavras, tenham por objetivo ou efeito atingir a autoestima, a autodeterminação, a evolução na carreira ou a estabilidade emocional de outro agente público. O tema em questão foi objeto de audiência da Comissão de Administração Pública, nesta quarta-feira (14/6), quando o requerente do evento, Bruno Pedralva (PT), defendeu o Projeto de Lei 600/2023, que inclui as modalidades de assédio moral como complemento essencial às infrações disciplinares previstas no Art. 189 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais. A partir dos debates, o parlamentar sugeriu, ainda, que Prefeitura, sindicatos, vereadores e Corregedoria se articulem em prol da construção de um substitutivo robusto, que aperfeiçoe a iniciativa original, assinada pelo próprio Bruno e por outros 15 parlamentares. Durante a audiência, também foi proposto que a comissão municipal responsável por receber casos de assédio moral e acolher vítimas tenha, entre seus membros, representantes do sindicato dos trabalhadores. Além disso, Bruno Pedralva sugeriu a elaboração de pesquisas sobre assédio moral na PBH e solicitou acompanhamento adequado em relação a todos os relatos de assédio apresentados durante a audiência.

O assédio moral está espalhado por toda a administração pública e há um sentimento de que a situação vem se agravando nos últimos tempos. Essa é a percepção do coordenador administrativo do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Belo Horizonte (Sindibel), Israel Arimar de Moura, que chamou atenção para o fato de que casos de assédio moral prejudicam não apenas a vítima, mas a prestação do serviço público.

De acordo com Israel, servidores têm procurado o Sindibel para relatar casos de assédio moral. Nessas situações, o sindicato age para proteger os trabalhadores, contudo, conforme o coordenador, há obstáculos para a punição dos culpados.

Uma das dificuldades, segundo ele, é quando o servidor não formaliza a denúncia de assédio relatada ao sindicato. Nessas situações, o Sindibel age para que o gestor seja removido da área em que atua, não havendo, entretanto, possibilidade de punição para o culpado pelo assédio. Daí a necessidade, segundo Israel, de as denúncias serem formalizadas para que ocorra a devida púnição.

O sindicalista também defende uma legislação mais clara adequada o tema em nível municipal, o que pode vir a ser obtido por meio do PL 600/2023, que tramita na CMBH. Ainda de acordo com o diretor, são necessárias campanhas educativas em toda a administração pública para que se previna a ocorrência de casos de assédio moral.

Ele explica também que há excelentes gerentes em todas as áreas da PBH, contudo, conforme o sindicalista, muitos dos servidores convidados para ocupar cargos de chefia, apesar de conhecerem a legislação de sua área de atuação e deterem o conhecimento técnico, nem sempre dominam temas relativos à gestão de pessoas. Diante disso, ele defende que os gestores tenham não apenas o domínio técnico relativo aos temas específicos de sua área, como também a capacidade de gerir equipes.

Direitos trabalhistas

Diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal (SindRede), Diana de Cássia Silva, defendeu a estabilidade do servidor público e a entrada por meio de concurso como condições que inibem o assédio moral. De acordo com ela, o processo de terceirização do serviço público retira direitos dos trabalhadores, tornando-os mais suscetíveis a situações de assédio.

Ela defendeu, ainda, melhores condições de trabalho para todos os servidores, especialmente na Educação, área na qual atua. Para a sindicalista, a administração pública municipal deve respeitar os direitos trabalhistas e se planejar adequadamente para que servidores não fiquem sobrecarregados, nem sofram com situações que possam ser enquadradas como assédio moral.

Denúncias de assédio

Dulce Magalhães, do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas (Sinarq), apontou que o sindicato recebeu várias denúncias de assédio que estariam ocorrendo na Sudecap. Segundo ela, a situação na autarquia está no limite, tendo havido, inclusive, manifestação pública de trabalhadores pela saída do responsável pela Superintendência, Henrique de Castilho.

A respeito de relatos de assédio na Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), Bruno Pedralva afirmou que irá procurar conhecer mais de perto a realidade da autarquia e se comprometeu a agendar uma reunião para acompanhar o caso.

Garantias contra pressões indevidas

De acordo com Dulce Magalhães, o servidor público, muitas vezes, é a garantia do cumprimento da lei, uma vez que, tendo estabilidade na carreira, fica menos sujeito a pressões indevidas, diferentemente de trabalhadores cujo vínculo empregatício é mais frágil.

Ela citou como exemplo o caso do conjunto milionário de joias sauditas apreendido pela Receita Federal com a comitiva oficial do governo do então presidente Jair Bolsonaro. No caso em questão, o então chefe da Receita exerceu pressão sobre servidores públicos, inclusive por meios extraoficiais, para liberação das joias detidas na alfândega de Guarulhos. Mesmo sob intensa pressão, os servidores da Receita consideraram inexequível o pedido de liberação das joias milionárias, cumprindo até o fim suas obrigações funcionais na forma da lei. Esse seria um exemplo de como os direitos e garantias previstos em lei para o servidor público são importantes para o combate a situações de assédio no trabalho. Não fossem os trabalhadores da Receita servidores concursados, com estabilidade, talvez o desfecho do caso fosse outro,

Projeto de lei

De autoria de Bruno Pedralva e outros 16 parlamentares, o Projeto de Lei 600/2023 inclui as modalidades de assédio moral como complemento essencial às infrações disciplinares previstas no Art. 189 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Belo Horizonte. Conforme os autores, a inserção das modalidades de assédio moral é necessária para o auxílio aos servidores públicos municipais e para contribuir com a Subcontroladoria do Município durante a instrução dos Processos Administrativos Disciplinares e a fixação de penalidades. O projeto em questão apresenta as modalidades de assédio moral em 11 diferentes incisos baseados na Lei Complementar 116/2011, do Estado de Minas Gerais.

O subcontrolador de Correição do Poder Executivo, Daniel Avelar, reconheceu que a lei atualmente em vigor no Município pode ser aperfeiçoada. Ele complementa que um dos problemas para a apuração das situações de assédio moral reside no fato de que, em geral, as denúncias são anônimas, impossibilitando o diálogo com o denunciante e dificultando a reunião de indícios da prática de assédio.

Combate e prevenção

Entre as ações do Município no combate ao assédio ele destacou o Decreto 18.337, publicado este mês, e que institui a Política Municipal de Integridade Pública. Por meio do decreto, foi instituída a Comissão de Prevenção ao Assédio Moral e Sexual, no âmbito do Poder Executivo Municipal, que tem, entre suas atribuições, contribuir para o desenvolvimento de diagnóstico institucional das práticas de assédio moral e sexual; sugerir medidas de prevenção, orientação e enfrentamento do assédio moral e sexual no trabalho; alertar sobre a existência de ambiente, prática ou situação favorável a assédio moral ou sexual; e sugerir providências à Controladoria Geral do Município, às direções dos órgãos e aos gestores das unidades organizacionais.

 A Comissão de Prevenção ao Assédio Moral e Sexual deve ser composta por nove membros ocupantes de cargos efetivos, sendo quatro da Controladoria-Geral do Município (CGTM) e os demais representantes de secretarias municipais.

Além disso, a Portaria CTGM 010/2023, publicada no dia 7 de junho, dispõe sobre a criação e o funcionamento da Comissão de Assessoramento e Acolhimento em Casos de Assédio Moral e Sexual (Comams), que irá assessorar a Subcontroladoria de Correição (Sucor) nos procedimentos disciplinares relativos a assédio, notadamente na fase de juízo de admissibilidade das denúncias, sugerindo encaminhamentos para tratamento da situação; bem como deverá acolher as possíveis vítimas em casos de denúncia de assédio moral e sexual, procedendo à escuta de forma individual, quando necessário, devendo ser observado o sigilo da informação.

Conforme a Portaria, a Comams será composta por servidoras integrantes da estrutura da Sucor, mediante ato de designação do subcontrolador de Correição, podendo, ainda, serem convidados outros agentes públicos municipais na qualidade de colaboradores, sempre que necessário.

O subcontrolador Daniel colocou a Comans à disposição para o acolhimento de servidores que apresentarem relatos de assédio. Além disso, ele explicou que está sendo contratado curso para treinar servidores da Corregedoria em acolhimento e apuração de assedio moral e sexual.

A Controladoria Geral do Município também conta com a Comissão Mista de Correição e Saúde para analisar e opinar em procedimentos correcionais relacionados ou derivados de possível adoecimento de agentes públicos municipais

Outra iniciativa na área é o Núcleo de Mediação da Sucor, surgido em 2017, que tem entre seus objetivos resolver conflitos nos órgãos da PBH; reduzir o número de processos administrativos disciplinares; aprimorar o comportamento dos agentes públicos e trazer maior eficiência para o campo da gestão de pessoas.

Participação dos trabalhadores

Para Wagner Ferreira (PDT), os sindicatos têm que estar unidos em relação ao debate a respeito do enfrentamento ao assédio moral. Servidor público, o vereador conta que, em âmbito estadual, diversos atores participaram da construção da Lei Complementar 116, que dispõe sobre a prevenção e a punição do assédio moral na administração pública estadual, e serve de base para o PL 600/2013.

O vereador, que é coautor do projeto de lei, defende que a luta contra o assédio no trabalho deva ser permanente e, para tanto, existam políticas de prevenção, combate e punição para quem o praticar.

Wagner também defende a realização de campanhas educativas permanentes no que tange ao combate ao assédio moral, inclusive na formação de gestores. O parlamentar argumenta, ainda, que o tema deve abarcar não apenas servidores públicos, mas estagiários, menores aprendizes e todos os que atuam no serviço público.

O vereador também diz considerar essencial que sindicatos participem das discussões relacionadas ao assédio no serviço público. A questão, segundo ele, é que uma comissão formada apenas por gestores poderá inibir a apresentação de denúncia por parte das vítimas, contudo, caso a participação do sindicato esteja garantida, a vítima poderá sentir-se mais segura ao denunciar.

A Lei Complementar 116, por exemplo, determina que a administração pública tome medidas preventivas para combater o assédio moral, com a participação de representantes das entidades sindicais ou associativas dos servidores do órgão ou da entidade. Além disso, a norma estadual também prevê que os dirigentes dos órgãos e entidades da administração pública criem comissões de conciliação, com representantes da administração e das entidades sindicais ou associativas representativas da categoria, para buscar soluções não contenciosas para os casos de assédio moral.

Cláudio do Mundo Novo (PSD) e Wilsinho da Tabu (PP) também se prontificaram a contribuir na luta contra o assédio moral no serviço público e a favor do aprimoramento da legislação que trata do tema no Município.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater "Assédio Moral no Âmbito do Serviço Público Municipal"- 18ª Reunião Ordinária: Comissão de Administração Pública