MATA DO MOSTEIRO

Moradores do Luxemburgo e região temem impactos ambientais de empreendimento

Participantes da audiência contestam o licenciamento da construção privada em área contígua à mata, uma das últimas da cidade 

quarta-feira, 9 Novembro, 2022 - 00:30

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Moradores do Bairro Luxemburgo e adjacências protestaram nesta terça (8/11) contra a construção de um empreendimento imobiliário numa área contígua à Mata do Mosteiro e ao Parque Tom Jobim, classificados no como Área de Preservação Permanente (APP). Em debate promovido pela Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana, requerido por Duda Salabert (PDT), os empreendedores asseguraram a observância das exigências legais para a edificação, que vai abrigar uma Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI) com infraestrutura e serviços adequados a essa faixa etária. Além dos danos ambientais, a vizinhança teme os possíveis impactos da construção de 80 apartamentos, um setor de lojas e 85 vagas de estacionamento sobre o trânsito da região, que não teriam sido avaliados pela Prefeitura, e pede mais transparência sobre os critérios utilizados na análise do projeto. A comunidade também questiona o alegado interesse social, já que as unidades habitacionais serão vendidas e os idosos beneficiados não se enquadram nos requisitos para acolhimento institucional, configurando o caráter comercial e os fins lucrativos do empreendimento. A vereadora vai encaminhar formalmente os questionamentos à empresa e ao secretário municipal do Meio Ambiente e solicitar uma nova reunião com os envolvidos.

Duda Salabert abriu o encontro lembrando que a área onde deverá ser erguido o empreendimento no Bairro Luxemburgo (Região Centro-Sul) é uma das últimas e maiores áreas verdes da Capital, abriga espécimes da fauna e da flora, árvores de grande porte, uma lagoa e nascentes que integram a bacia do Córrego do Leitão. A área, com cerca de 11.700 metros quadrados, também exerce um importante papel na infiltração das águas pluviais, e a impermeabilização do solo vai agravar os alagamentos e enchentes na Avenida Prudente de Morais, um dos principais corredores de trânsito da região, causados pelo excesso de volume de água no córrego, gerando transtornos e prejuízos. De acordo com a documentação obtida perla comissão, o terreno, de propriedade privada, abrigará um lar de idosos com 80 apartamentos divididos em três blocos com quatro andares cada, além de lojas, alojamentos de funcionários, piscina, áreas de convivência e estacionamento.

Solicitantes da audiência pública, os moradores do entorno e integrantes da Associação dos Moradores e Amigos do Luxemburgo, Coração de Jesus e Vila Paris (Amalux), Marcos Righi (presidente), José Inácio Marinho, Lenise Maciel, André Figueiredo e Felipe Gomes, que é engenheiro ambiental, reivindicaram a proteção integral da área verde e lutam contra o possível licenciamento da construção pela PBH e pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente. A luta pela preservação da área, segundo eles, já se prolonga desde 2012, passando por 2018, quando a associação conseguiu barrar a construção de um grande empreendimento de outra construtora, composto por três grandes torres residenciais. Segundo eles, vistas técnicas ao local na época constataram a existência de duas nascentes importantes, como a que dá origem ao Córrego do Leitão, e vegetação arbórea diversificada.

A Amalux também expôs o receio dos impactos que o empreendimento pode causar no trânsito e na circulação, que, segundo eles, já não comportam o movimento diário nem mesmo nos finais de semana, e acusou a Prefeitura de não ter realizado qualquer Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) nesse sentido.  

Respeito à legislação

Daniel Bahia, sócio da construtora, explicou que o projeto teve início junto ao proprietário do terreno há três anos, e desde então, seu desenvolvimento vem considerando todos os aspectos legais de preservação da área verde, em conformidade com os critérios da Prefeitura e o interesse dos moradores. A área construída, segundo ele, vai ocupar apenas 30% da área total do terreno. Nas sondagens feitas no local, em períodos de chuva e de seca, foi constatada a presença de apenas uma nascente, e a lagoa não existe mais, permanecendo apenas uma área brejosa. O raio de 50 metros em torno da nascente, onde não é permitido construir, estaria totalmente preservado no projeto. Algumas vagas de estacionamento serão construídas acima do solo, sem cobri-lo.  A empresa, segundo ele, realiza um trabalho sério e criterioso há mais de 50 anos na cidade e, diante das dificuldades, sempre busca o diálogo para criar soluções.

José Inácio Marinho, da Amalux, que tem assento no Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam), relatou dissonâncias entre os pareceres técnicos anteriores e o atual sobre mesma área, que admitiam inicialmente a existência das nascentes e cursos d´água, que depois não foram mais registrados. Os moradores mostraram imagens de supressão e derrubada de árvores, soterramento de cursos d’água e queimadas na mata, “coincidentemente” na área onde se pretende erguer o empreendimento. Eles também questionam a alegação de que a suposta instituição de longa permanência de idosos configure um equipamento de interesse público, já que os residentes serão proprietários das unidades e os serviços prestados, como fisioterapia, enfermarias e plantonistas, serão destinados somente a eles. A arquiteta da empresa, Malisa, assegurou que o empreendimento, pioneiro em Belo Horizonte, não é residencial; além disso, a baixa altimetria não prejudicará a paisagem da mata.

Respostas da PBH

Somada à degradação e ao desmatamento que vêm ocorrendo na área desde 2006, de acordo com a moradora Lenise Maciel, a implantação do empreendimento, mesmo que dentro dos limites permitidos na legislação, vai comprometer a sobrevivência das espécies da fauna que transitam e habitam a mata. Em seu entendimento, o direito de propriedade e o interesse comercial não podem se sobrepor ao interesse coletivo e ao direito constitucional de todos a um meio ambiente equilibrado e preservado. Duda corroborou a necessidade de que a Secretaria de Meio Ambiente esclareça os códigos e classificações relativos à natureza do empreendimento usados no processo de licenciamento. Questões relacionadas à permeabilidade do solo, drenagem e sobrecarga do Córrego do Leitão, agravando as enchentes, também exigem respostas oficiais da Prefeitura. Segundo ela, diante da emergência climática e da crise hídrica que ameaçam o planeta, mais do que nunca é preciso considerar a preservação da natureza no ambiente urbano como um direito coletivo.

Fernanada Pereira Altoé (Novo) também ressaltou a necessidade de averiguar se os parâmetros legais estão sendo observados, se o empreendimento atende os requisitos de uma ILPI, se a questão da drenagem está sendo devidamente considerada, o nível de descaracterização da mata, se a vegetação suprimida será replantada e se existe possibilidade de a PBH adotar a área. A vereadora reiterou a apreensão dos moradores em relação à possibilidade de invasões na área, como ocorre em diversos pontos da cidade. O representante do proprietário, Ricardo Almeida, informou que já houve tentativas, mas que o terreno é vigiado 24 horas por dia para evitar que isso aconteça.

Aquisição do terreno

A Associação de Moradores sugere é que a Prefeitura adquira o terreno por meio de desapropriação e indenização pelo valor venal do imóvel, anexando-o à área do Parque Tom Jobim, a exemplo do que foi encaminhado na questão da Mata do Planalto. “Este seria o melhor presente que o prefeito poderia dar para a cidade!”, pediu Lenise, ponderando que o terreno foi adquirido pelo proprietário por R$ 820 mil, em 2008. O valor de R$ 15 milhões informado pelo proprietário, segundo ela, não é verdadeiro. “O preço do terreno é ‘dinheiro da pinga’ para o Município”, acredita a moradora.

A Secretaria Municipal de Meio Ambiente foi representada pelo diretor de Licenciamento Ambiental da pasta, Pedro Franzoni. O gestor relatou que o empreendedor entrou com o requerimento de licenciamento em 2021, e que a avaliação técnica de projeto enquadrado em Zona de Preservação Ambiental (ZPAM) em terreno privado observa parâmetros menos rigorosos de porcentagem de área construída e área preservada, mas busca, nessa ordem, formas de evitar, mitigar e compensar os eventuais impactos. A primeira versão do projeto, segundo ele, era muito impactante e o Conselho Municipal baixou a requisição em diligência antes de emitir parecer, por meio de uma vistoria no local e uma reunião com a comunidade.

O gestor assegurou que a Prefeitura está consciente e atenta à questão das mudanças climáticas e reconhece a relevância da Mata do Mosteiro para o meio ambiente urbano de BH, incluindo as áreas adjacentes, muitas delas públicas e sem destinação específica. Segundo ele, existem estudos em desenvolvimento para ampliação do Parque Tom Jobim, com a integração dessas áreas, ou a constituição de um corredor ecológico que permita a circulação de animais entre as matas próximas. 

Questionamento formal e nova reunião

Ao final, a requerente da audiência anunciou que as questões apresentadas durante o debate serão reunidas e formalizadas em pedidos de informações a serem encaminhados por meio da Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana à Prefeitura, aos órgãos ambientais e aos responsáveis pelo projeto e execução das obras. Posteriormente, as respostas deverão ser fornecidas e discutidas em uma nova reunião, com a participação de todos os envolvidos. “Essa primeira audiência está longe de ser conclusiva, mas representou um ponto de partida para o aprofundamento da discussão de todos os aspectos e interesses envolvidos”, garantiu Duda.  

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para discutir a intervenção em Área de Preservação Permanente - APP e Zona de Proteção Ambiental no bairro Luxemburgo-40ª Reunião Ordinária: Comissão de Meio Ambiente, Defesa dos Animais e Política Urbana