SAÚDE DA MULHER

Debate sobre direitos sexuais e reprodutivos encerra programação do mês

Programação, que contou com iluminação especial, palestras e inauguração de sala de amamentação movimentou todo mês de março

quinta-feira, 31 Março, 2022 - 14:45

Foto: Claudio Rabelo/CMBH

Um debate ainda difícil, mas necessário, marcou o encerramento das atividades do Mês da Mulher promovido pela Câmara Municipal de Belo Horizonte. Durante parte da manhã desta quinta-feira, dia 31 de março, vereadoras, servidoras da CMBH e profissionais da área médica debateram sobre o tema Direitos Sexuais e Reprodutivos. O evento, proposto pelas vereadoras Bella Gonçalves (Psol) e Iza Lourença (Psol), tratou, além das dimensões do planejamento familiar e dos métodos contraceptivos, do direito das mulheres a uma saúde integral, do aborto em situações previstas na lei e da violência obstétrica.

“É socializado que nossos corpos estão disponíveis para os desejos de outros corpos”. A frase é da psicóloga e professora do Curso de Psicologia da UFMG, Paula Gonzaga, que introduziu sua fala destacando a importância de se debater direitos sexuais e reprodutivos a partir dos conceitos de autonomia e livre de coerção. Segundo ela, há uma dificuldade na sociedade atual em debater os limites do consentimento das mulheres. “O limite do consentimento do nosso corpo (para a sociedade patriarcal) é indefinido”, afirmou Paula, explicando ainda que o corpo feminino muitas vezes é visto simplesmente como um destino, que seria a maternidade.

Criminalização do aborto

A psicóloga falou ainda da visão que a sociedade brasileira tem do aborto. Para ela, enquanto o aborto for criminalizado “toda mulher será criminalizada”, lembrando que o aborto é permitido em casos de risco de vida à mulher, anencefalia e estupro. Ela destacou frases ditas muitas vezes quando mulheres são estupradas como: “tem certeza que você não queria se você foi na casa dele?” ou “você estava bêbada”. Para Paula, “ser terminantemente contra o aborto é ser terminantemente contra o acesso aos serviços de saúde”.

Para a ex-vereadora Cida Falabela, o projeto de lei que cria o Dossiê das Mulheres será um passo à frente neste debate, que muitas vezes carece de informações precisas e dados bem coletados. Segundo Cida, o tema do aborto deve ser tratado seriamente por toda a sociedade. “A Câmara é um espaço que tem avançado muito no debate sobre os direitos das mulheres e sobre medidas para pensar a política como espaço também da mulher. E todo esse avanço tem a ver com a luta das mulheres”, disse Bella Gonçalves, que assina, junto com Iza Lourença, o projeto que cria o dossiê.

De acordo com Polly Policarpo, do Coletivo Articulando Redes e da Rede Feminista de Saúde, a autonomia feminina é diariamente negada às mulheres “no acesso a todas as formas de direito”. Segundo ela, os direitos sexuais e reprodutivos são também direitos sociais. “Não fazendo essa relação, nós nos silenciamos, pois os corpos sofrem de forma diferente diante desse sistema”, afirmou Polly, dizendo ainda que é preciso discutir não só os direitos, mas a justiça reprodutiva. “Gravidez tem que ser uma escolha e, quando for, as pessoas devem ter como criar essa criança”, disse, contando que, segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a cada vinte minutos uma criança é estuprada no Brasil, onde foram registrados mais de 50 mil crimes desse tipo em 2017.

Pedindo a palavra, a vereadora Flávia Borja (Avante) questionou as palestrantes sobre a defesa ao aborto, justificando que já há vida desde a concepção e que há vários métodos para evitar uma gravidez. Segundo a parlamentar, justiça social tem que ser para todos, “inclusive para os nascituros”. Iza Lourença destacou que acha importante o debate, mas afirmou que é exatamente nos países onde o aborto não é legalizado que ocorrem mais mortes maternas. 

Os participantes lembraram que em 2022 faz vinte anos da morte de Alyne Pimentel, caso muito noticiado pela imprensa nacional à época. Segundo a Agência Senado, em 14 de novembro de 2002, Alyne estava no sexto mês de gestação e buscou assistência na rede pública em Belford Roxo (RJ), onde recebeu analgésicos. Ela era negra, tinha 28 anos, casada e mãe de uma filha de cinco anos. Após horas de espera, Alyne foi submetida a cirurgia para retirada dos restos da placenta. O quadro se agravou e foi indicada sua transferência para hospital em outro município, mas sua remoção foi feita com grande atraso. No segundo hospital, Alyne acabou falecendo em 16 de novembro de 2002, em decorrência de hemorragia digestiva resultante do parto do feto morto. O caso foi apresentado à Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Cedaw), órgão ligado à ONU, que condenou o estado brasileiro por falta de atendimento à saúde e discriminação.

Sofia Feldman e direitos reprodutivos

A enfermeira e integrante do colegiado gestor da Maternidade Sofia Feldman, Ludmilla Taborda, apresentou dados importantes para o debate, como o de que em 2020 47 milhões de mulheres no mundo ainda não tinham aceso a qualquer método contraceptivo em países de baixa e média renda. Também segundo a enfermeira, o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde mostra que há 55 óbitos de mães por 100 mil nascidos vivos, demonstrando ausência de políticas públicas capazes de modificar o quadro.

Entre esses caminhos, Ludmilla Taborda apontou que algumas políticas públicas são capazes de concretizar os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres brasileiras. Entre outros, a humanização do parto e nascimento, a atenção integral à saúde da mulher e as diretrizes nacionais de atenção à cesariana e ao parto. No Hospital Sofia Feldman, referência em Minas Gerais no parto humanizado, foram feitos, em 2021, 11.039 partos, sendo 7.796 normais, 428 na água e 14 domiciliares, com acompanhamento de profissionais. “Discutir direitos sexuais e reprodutivos é discutir que as mulheres tenham um parto dentro dos direitos e do respeito que elas merecem”, afirmou Iza Lourença.

No mês de março, a CMBH manteve o debate sobre os direitos das mulheres em alta. Entre outras ações, no dia 3 de março, foram acesas luzes na cor lilás na fachada do prédio da Câmara, em homenagem ao Mês da Mulher. Para comemorar o Dia Internacional, celebrado em 8 de março, além de um café da manhã às servidoras da Casa e da divulgação de vídeo institucional, a Câmara inaugurou a Sala de Apoio à Amamentação, em cumprimento à Lei 11.321/2021, de autoria da presidente Nely Aquino (Pode). A força e a contribuição das mulheres nos mais diversos setores da sociedade e na comunidade foram temas de audiência pública da Comissão de Mulheres. Os impactos na vida das mulheres quando direitos são adquiridos foram debatidos no ”Papo de Mulher: conquistas institucionais”, projeto da Escola do Legislativo voltado ao público interno da CMBH.

Superintendência de Comunicação Institucional

Palestra Direitos Sexuais e Reprodutivos - Programação especial Mês da Mulher -  Autoras: Iza Lourença (Psol) e Bella Gonçalves (Psol)