Combate à violência obstétrica pode ganhar reforço com legislação municipal
Relatora do PL 208/2021 defende direitos e escolhas da mulher, aliados a técnicas e procedimentos médicos nos hospitais
Foto: Bernardo Dias / CMBH
Entendida como toda violência física, moral, patrimonial ou psicológica praticada contra as mulheres no momento do parto, pós-parto e puerpério ou em situações de perda gestacional, a violência obstétrica é uma realidade no Brasil e no mundo. Belo Horizonte pode ter um instrumento importante de combate a essa prática: o Projeto de Lei 208/2021 prevê ações e serviços de saúde que garantam o respeito, a proteção e a efetivação dos direitos humanos da mulher. Tramitando em 1º turno, a proposta teve parecer favorável da Comissão de Mulheres, nesta sexta-feira (3/12). Relatora do projeto, Fernanda Pereira Altoé (Novo) considera preciso conciliar direitos da mulher, como proteção ao seu corpo e às suas escolhas, à técnica e atuação médica. Uma das autoras da proposta, Bella Gonçalves (Psol), apontou que é necessário valorizar não somente o conhecimento da medicina, mas avanços de outros campos do conhecimento, como a fisioterapia e a enfermagem. O texto ainda vai passar pelas Comissão de Saúde e Saneamento e de Orçamento e Finanças antes de chegar ao Plenário.
Entre as ações previstas no PL 208/2021, também assinado por Iza Lourença (Psol), está a assistência à saúde universal, integral e humanizada durante o pré-natal, o parto, o puerpério e em situações de perda gestacional ou de morte fetal; assim como o acolhimento e a escuta qualificada em todas as fases relacionadas à gravidez. O projeto exemplifica 34 condutas que podem ser consideradas violência obstéstrica, como patologizar o processo natural do parto, desrespeitando a autonomia da gestante, da parturiente ou da puérpera sobre o seu corpo; utilizar termos depreciativos para se referir aos processos naturais do ciclo gravídico-puerperal; tratar a gestante, a parturiente ou a puérpera de forma depreciativa ou que a inferiorize, dando-lhe comandos ou nomes infantilizados e diminutivos ou tratando-a como incapaz; e realizar a indicação de parto cesáreo, desconsiderando práticas de atenção à saúde baseadas em evidências científicas e negligenciando o fornecimento adequado de informações sobre os riscos do procedimento para a mulher e para o recém-nascido.
Estrutura clínico-hospitalar
De acordo com a relatora do projeto, sua análise deve se dar dentro da competência da Comissão de Mulheres; contudo, existem aspectos a serem analisados por via oblíqua. Mesmo reconhecendo que práticas modernas elevaram a figura da mulher a um papel central na relação médico-paciente, a relatora avalia que não se pode perder de vista que o parto realizado em estrutura clínico-hospitalar demanda uma maior atenção em relação aos cuidados médicos antes, durante e após a intervenção. A parlamentar justifica que isso é feito para que se possam controlar riscos decorrentes de infecções, cabendo a cada local ter um protocolo de limpeza específico, desenvolvido para oferecer segurança aos pacientes, à equipe e aos visitantes.
No relatório, Fernanda lembrou que a imperícia do corpo clínico que deixa de cuidar da assepsia e da organização do hospital pode levar à responsabilização jurídica. Caso o médico permita que cada paciente aja de maneira que lhe aprouver, este aceitará riscos e posturas que podem vir a ser danosos não somente para ele, mas para a própria paciente e para o recém-nascido. Ela salientou que o parecer não defende, em nenhuma hipótese, procedimentos desnecessários ou humilhantes; e que não restam dúvidas de que a relação de confiança é fundamental, devendo ser pautada pelo respeito a direitos e deveres do paciente e do corpo médico.
A relatora afirma, ainda, que ao se internar em uma instituição de saúde, a paciente se submete aos regulamentos da instituição, assinando termo dizendo que concorda com essas regras. Ou seja, ao colocar todas as lentes apenas no que a parturiente quer, o corpo clínico pode ficar desguarnecido em um futuro contencioso jurídico. Por fim, concluindo, Fernanda diz que, para se obter um alto nível de respeito na assistência ao parto, os sistemas de saúde devem ser organizados e administrados de forma a garantir o respeito à saúde sexual e reprodutiva e aos direitos humanos das mulheres.
Ação conjunta
A autora da proposta, Bella Gonçalves, contou, por sua vez, que o projeto foi construído por várias mulheres na luta pelo parto humanizado, proteção à mulher, aos filhos e ao processo de gestação. Ela destacou a importância de se qualificar o debate relativo à violação de procedimentos obstétricos, que, para a parlamentar, vai além do sistema de saúde e de práticas inseridas no mesmo. A violência obstétrica já foi tema de audiência pública na Comissão de Mulheres, quando foram ouvidos profissionais de saúde e sociedade civil acerca do tema.
Bella avalia que o bem estar da mulher gestante deve ser aliado a técnicas conjuntas, não somente de médicos, mas de todos os profissionais envolvidos, os quais devem ser valorizados. A vereadora apontou, ainda, limites de técnicas da medicina diante de avanços de outros campos do conhecimento, como das áreas de fisioterapia e enfermagem. Para ela, é preciso se estabelecer um equilíbrio, para que a sociedade possa oferecer condições de parto mais adequadas a essas mulheres, evitando abusos no parto.
Participaram da reunião as vereadoras Macaé Evaristo (PT), Professora Marli (PP), Flávia Borja (Avante) e Fernanda Pereira Altoé.
Superintendência de Comunicação Institucional