PATINETES E BICICLETAS

Empresas e BHTrans discordam da obrigatoriedade da oferta de capacetes

Participantes da audiência defenderam mais ciclovias, campanhas educativas e conscientização de usuários, pedestres e motoristas  

quinta-feira, 26 Setembro, 2019 - 22:30

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Motivada por um acidente fatal ocorrido neste mês com um cidadão que trafegava de patinete elétrica juntamente com a esposa e os filhos no Centro de BH, a Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário reuniu nesta quinta-feira (26/9) representantes da BHTrans, da empresa Grow, que aluga o equipamento por meio de aplicativo, e da associação de ciclistas BH em Ciclo para debater medidas para promover mais segurança na circulação desses veículos, que vêm atraindo cada vez mais adeptos na capital. Autor de projeto de lei que obriga o fornecimento de capacetes pelas prestadoras do serviço, que tramita em 1º turno, o requerente da audiência, vereador Jorge Santos (REPUBLICANOS), reconheceu a inviabilidade da medida, anunciou a apresentação de um Substitutivo e defendeu a continuidade dos debates entre as partes na busca de soluções consensuais e da proposição de medidas urgentes para promover mais segurança a usuários e pedestres.

Jorge Santos, autor do PL764/19, conduziu a reunião ao lado do presidente da comissão, Wesley Autoescola (PRP), e os demais membros titulares - Jair Di Gregório (PP), Dr. Nilton (Pros), Henrique Braga (PSDB) e Fernando Luiz (PSB). Os parlamentares lamentaram a morte do engenheiro de 43 anos no dia 10 de setembro e outros acidentes graves envolvendo patinetes e bicicletas em BH e outras capitais, onde a oferta aumentou consideravelmente com a chegada de empresas privadas que disponibilizam esses veículos na modalidade de uso compartilhado, sem pontos fixos de retirada e estacionamento. Santos lembrou que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê a regulamentação do tema pelos municípios para adequar suas diretrizes às suas realidades e características, mas admitiu que já descartou a proposta de obrigar a disponibilização de capacetes pelas operadoras do serviço. Para ele, o que menos importa neste momento é discutir a quem cabe a iniciativa, já que a prevenção de mortes e lesões graves é a prioridade máxima. “A Câmara não pode se omitir diante dessa questão”, declarou. 

Os integrantes da comissão reforçaram as palavras do requerente da audiência sobre a necessidade de disciplinar a utilização desses modais, estabelecendo normas para o tráfego nas ciclovias, calçadas e espaços compartilhados com veículos motorizados, limites de velocidade adequadas a cada local e idade mínima para aluguel do equipamento, com fiscalização efetiva de seu cumprimento. A prática de deixar os veículos em locais inadequados, também foi apontada como causa de acidentes e transtornos para os pedestres.O vereador Dr. Nilton mencionou ainda os impactos dos acidentes sobre a rede pública de saúde, que, segundo as estatísticas do setor, vem acolhendo cada vez mais vítimas de quedas e atropelamentos envolvendo bicicletas e patinetes no município. 

Obrigatoriedade x educação

Fernanda Laranja, gerente de Relações Governamentais e Institucionais da Grow - resultante da fusão entre a Grin e a Yellow, que prestam o serviço em BH - declarou-se favorável à regulamentação. Para ela, é essencial que os modais alternativos sejam inseridos de forma adequada no espaço urbano, com a definição de locais de circulação, as respectivas velocidades máximas e permissão por faixa etária. Questionada sobre a responsabilidade das empresas privadas, que auferem lucros com a prestação do serviço, sobre as consequências negativas que possam advir do uso das bicicletas e patinetes fornecidas por elas e a prevenção do uso inadequado, Fernanda informou que a Grow oferece seguro de danos contra acidentes pessoais de usuários e de terceiros eventualmente atingidos. Com relação à obrigatoriedade do fornecimento de capacete no ato da contratação do serviço, ela ponderou a facilidade de extravio e furto do acessório, já que ão existem pontos fixos para  e o risco de contaminação devido à utilização por múltiplos usuários sem a devida higienização.

Segundo a executiva, a empresa também promove a educação e orientação dos usuários sobre as boas práticas no trânsito e uso de acessórios de segurança, para a prevenção de acidentes e transtornos e redução de danos, a empresa realiza campanhas permanentes por meio do próprio aplicativo, além de ações periódicas de monitoramento nas ruas, com abordagem direta de usuários, distribuição gratuita de capacetes e recolhimento de veículos deixados em locais inadequados. O vereador Fernando Luiz reconheceu o poder de comunicação das redes sociais, especialmente entre os jovens, mas sugeriu que as informações sejam divulgadas em outros canais, como TV e rádio, ampliando seu alcance por todos os segmentos da população.

Adequação e manutenção de vias

Representando a Associação dos Ciclistas Urbanos de Belo Horizonte (BH em Ciclo), que reúne mais de 600 membros, Gabriel Castro discordou do tema da audiência, afirmando que a questão vai muito além do uso de equipamentos de proteção individual. O ativista acusou o poder público de transferir a responsabilidade da segurança às empresas e aos usuários, em vez de aumentar o número de ciclovias, sua largura e a integração entre elas. Segundo ele, a maioria dos acidentes é causada por buracos e bueiros, falta de manutenção adequada da pavimentação e o desrespeito às bicicletas e patinetes pela maioria dos motoristas nas vias mistas; além disso, estudos realizados em outras cidade e países indicariam que o uso obrigatório do acessório reduz bastante a adesão da população. 

Gabriel cobrou a implementação do Plano de Mobilidade por Bicicleta de Belo Horizonte (PlanBici) pela Prefeitura, elaborado pela BH em Ciclo e outras entidades, em conjunto com a BHTrans e secretarias municipais, que contempla os múltiplos aspectos da questão e visa a ampliar não apenas a segurança, mas também o número de pessoas que utilizam esses modais para os deslocamentos do dia a dia. Aprovado pelo prefeito em 2017, segundo ele o plano ainda não saiu do papel.

Comissão interdisciplinar

Em nome da BHTrans, Liliane Hermont e Mônica Mendes asseguraram que a Prefeitura também defende a ampliação do uso de bicicletas e patinetes e concorda que sua inserção no sistema viário pode contribuir bastante para melhorar a mobilidade urbana. Segundo as gestoras, a regulamentação dos modais alternativos vem sendo analisada pela empresa, com a participação de órgãos públicos, prestadores do serviço e a sociedade civil. Para isso, foi criado um comitê interdisciplinar para estudar e debater o tema, que envolve as áreas da saúde, educação, infraestrutura e segurança. Liliane afirmou que a BHTrans também não está omissa em relação aos problemas apontados e vem buscando soluções que atendam e respeitem os direitos de todas as partes envolvidas. Apesar da alegada falta de recursos para implantar os 52 km de ciclovias prometidas pela atual gestão, ela anunciou a implantação de um trecho de 8km na orla da Lagoa da Pampulha e novas interconexões com outros modais de transporte. Ela reconheceu, no entanto, que neste momento a Prefeitura irá priorizar ações que não dependam de aporte financeiro.

O Laboratório de Produção Legislativa da Faculdade Newton Paiva, representado por Vítor Paulo, comunicou que também vem realizando estudos sobre a questão, no que se refere à proposição de leis pelos vereadores, e disponibilizou-se para contribuir na elaboração de propostas para a regulamentação desses modais em Belo Horizonte.

Contribuição do Legislativo

Todos os participantes da audiência destacaram a contribuição das bicicletas e patinetes para melhorar a mobilidade e reduzir a poluição e promover a mudança da cultura ainda vigente nos governos e na sociedade, que prioriza os veículos motorizados no planejamento e no uso do espaço urbano. Jorge Santos confirmou que, em conversas mantidas com o prefeito Alexandre Kalil, este assegurou que a Prefeitura vem analisando a questão, estudando as legislações e as experiências bem sucedidas de municípios do Brasil e do mundo. O parlamentar afirmou que a Câmara, por meio da Comissão de Transporte e Sistema Viário e outras pertinentes ao tema, podem contribuir muito para o debate, e comunicou que todas as ações e os andamentos referentes à questão devem ser devidamente acompanhadas pelo Legislativo.

Santos endossou as colocações da BH em Ciclo sobre a necessidade de ampliação e manutenção adequada da rede de ciclovias e garantiu que não pretende mais propor a obrigatoriedade das empresas de fornecer os capacetes e apresentará um Substituivo ao texto. No entanto, assim como a BHTrans, a Grow e os demais vereadores, ele defendeu a importância de reforçar as ações educativas, com a realização de campanhas massivas de voltadas a usuários e aos outros atores que utilizam o espaço urbano, de forma a promover a adoção das boas práticas durante a circulação e o uso de acessórios de segurança; segundo ele, mesmo que não evite traumas em outras partes do corpo, o capacete pode amenizar as consequências de quedas ou colisões e até mesmo salvar vidas.

Antes de encerrar a reunião, o parlamentar solicitou aos presentes que fizessem um minuto de silêncio em homenagem a Roberto Pinto Batista Júnior, vítima do acidente fatal que tornou ainda mais urgente a retomada do debate e a cobrança de medidas urgentes do poder público e empresas do ramo para prevenir novas tragédias.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

*Nota da redação: texto atualizado em 27/9/19, às 15h42. Diferentemente do que havíamos informado, Gabriel Castro é membro e não presidente da Associação dos Ciclistas Urbanos de Belo Horizonte (BH em Ciclo)