DIREITOS HUMANOS

Falta de informação é principal desafio no combate à exploração sexual infantil em BH

Além de campanhas de conscientização junto à sociedade, faltam dados atualizados e ação articulada entre órgãos   

terça-feira, 7 Maio, 2019 - 16:15

Foto: Bernardo Dias / CMBH

Para marcar o mês em que é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes (18/5), a Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor realizou na Câmara de BH uma audiência pública para discutir o andamento dos programas e projetos relacionados à temática no município. Requerida pelo vereador Pedro Patrus (PT), a atividade, que contou com a participação de representantes de conselhos e fóruns que debatem os direitos das crianças e dos adolescentes, da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania da Prefeitura de Belo Horizonte e da sociedade civil, teve como objetivo trazer para a pauta o alto número de ocorrências de violência sexual contra crianças e adolescentes na capital.

De acordo com Pedro Patrus, esta é uma data simbólica, que marca a luta, mas todos os outros dias devem ser de combate à exploração sexual infantil. “Há um desmonte dos direitos humanos no país, e das políticas sociais, da segurança alimentar, da saúde, da educação, já que todos estão interligados. A PEC 241, que congela, em 20 anos, os investimentos públicos, vai, com certeza, refletir no aumento da exploração sexual”.

Moisés Barbosa Ferreira Costa, coordenador do Fórum de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes de Minas Gerais (FEVCAMG), destacou que esta é uma bandeira que vem sendo apagada ao longo dos anos e que, por isso, é preciso que as pessoas se mobilizem de maneira específica para essa questão, sem que ela seja misturada com outras políticas públicas. “Falta espaço para esse tipo de discussão. Essa temática precisa de orçamento próprio, de plano de combate. Não há diagnóstico do município sobre a exploração sexual de jovens e adolescentes”.

Segundo Costa, dados da Organização das Nações Unidas (ONU) revelam que na América Latina e Caribe a cada hora 228 crianças são abusadas e que mais da metade possuem entre 0 e 5 anos de idade. Do total das crianças, 45,5% são negras e mais de 69% dos abusos ocorrem dentro da família. Nesse sentido, é importante orientar as crianças desde a primeira infância. “Há a necessidade de recursos para campanhas, de programas que articulem os trabalhos baseados em análises de pesquisas atuais”, afirma.

Atendimento e conscientização

A presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belo Horizonte, Haydée da Cunha Frota, afirma que há muitos desafios relacionados ao atendimento da criança, do adolescente e da família que sofre com a violência sexual e à mobilização e conscientização da sociedade sobre o tema. “Avançamos ao longo dos anos. Temos conselhos tutelares, temos fluxo estruturado na Saúde, Assistência Social com retaguardas do Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) e do Cras (Centro de Referência de Assistência Social) e, em especial, na Educação, mas ainda é preciso avançar no ponto de vista da articulação. Além disso, estamos diante de um tabu, de uma cultura conivente com a exploração, machista, que preconiza a violência sexual. Precisamos aprimorar o atendimento e a quantificação das denúncias”.

Segundo Regina Helena Cunha Mendes, do Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belo Horizonte, não é fácil fazer diagnóstico da exploração sexual de crianças e adolescentes em BH. Os dados que existem são de 2013 e provêm dos Conselhos Tutelares localizados nas nove regiões da capital, que recebem as denúncias. Regina esclarece que para contribuir com a geração de dados foi elaborada uma ficha de notificação para o registro de cada caso para ser usada por todos os equipamentos de atendimento a esse público. No entanto, esse instrumento ainda é pouco conhecido e utilizado. “Era importante que essa ficha se tornasse lei para reforçar o trabalho que é feito. Precisamos estar bem embasados”.

De acordo com Elvira Veloso, representante do Ministério do Trabalho, há ações que podem ser feitas para combater a exploração sexual que não dependem de recurso, mas de vontade política, técnica e de comprometimento. “Há uma inércia da Prefeitura de Belo Horizonte, há um distanciamento do poder central com as equipes dos territórios”. Veloso também criticou a falta de cumprimento das cotas de aprendizagem nos órgãos da PBH e a ausência de equipes de abordagem nas ruas.

Para o educador social da Rede Nacional Infância Protegida, Ivan Ferreira, a prevenção à exploração também é um tópico muito importante. “Fatores de risco precisam ser conhecidos para se trabalhar com prevenção. É preciso mudar a concepção dos fatores que levam à exploração nos espaços de proteção, e com a qual se enxergam as situações e não achar normal”. O conselheiro tutelar da Regional Leste Maurício Barbosa Brandão também concorda que é preciso investimento em políticas públicas, programas e ações direcionadas à prevenção, e alerta para a falta de infraestrutura dos Conselhos Tutelares para crescente demanda e para a demora e, muitas vezes, ausência de responsabilização do agressor.

Maria Tereza, representante da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania, afirma que é preciso de dados atualizados para a aplicação de recursos no combate à exploração sexual, e que para isso o Executivo precisa de um controle social justo e bem informado. “Buscamos a integralidade das políticas, a convergência de ações complementares de forma contínua já que a exploração sexual é multicausal. Precisamos trabalhar com dados e informações para identificar, interromper e denunciar”.

Segundo a representante da Subsecretaria de Direito e Cidadania, Janine Avelar, está sendo priorizada a criação de uma plataforma de registro de violação de direitos que visa a otimizar o fluxo do atendimento. “Há também um plano de comunicação e mobilização permanente para conscientização de moradores e turistas. Neste mês, vamos promover ações educativas em bares e restaurantes com a parceria da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes). Também estamos desenvolvendo um trabalho com a Educação de preparação de material específico para professores e alunos”. 

Emenda à lei orgânica

Para a vereadora Bella Gonçalves (Psol), de fato a discussão reflete um retrocesso vivido no país, que passa por propostas de leis que querem proibir as escolas de discutir questões relacionadas à orientação de gênero ou de sexualidade. Bella afirma que é preciso ter espaço para o enfrentamento de leis como a Proposta de Emenda à Lei Orgânica nº 3/17, que estará em pauta no Plenário nesta quarta-feira (8/5), ser discutida, “pois ela pode significar um processo de perseguição de professores e as crianças podem sofrer violência e discriminação na escola”.

Já para Fernando Borja (Avante), autor da Lei 11.113/18, que inclui no calendário oficial de Belo Horizonte a campanha Maio Laranja, que decreta que o município deve realizar atividades para conscientização, prevenção, orientação e combate ao abuso e à exploração sexual da criança e do adolescente, a diversidade de gênero e a sexualidade não são temas para serem ensinados na escola. “Não sou contra a sexualidade, temos, sim, que trabalhar com a prevenção, ensinar a criança como valorizar e conhecer seu corpo, mas o pai tem o direito de ensinar seus filhos como ele quiser”.

Membro da Associação Circo de Belô, Ponto Focal de Minas Gerais no Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, Wesley Gonçalves destaca sobre essa discussão que a falta de informação faz com que a exploração pareça estar distante, mas pode estar bem próxima. “Informar não é incentivar, é ensinar a criança a se proteger”.

Ao final da audiência, Pedro Patrus comunicou que irá encaminhar à PBH pedidos de informações sobre as questões levantadas pelos participantes.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para discutir o combate à exploração sexual de crianças e adolescentes - Comissão de Direitos Humanos