PESSOAS COM TEA

Diagnóstico tardio do autismo e desinformação sobre direitos são desafios

Participantes enfatizaram importância da divulgação de direitos e trabalho conjunto entre Executivo, Legislativo e sociedade

terça-feira, 25 Junho, 2024 - 19:00
Sete mulheres reunidas, sentadas à mesa. Ao fundo, telão exibe imagens de quatro participantes virtuais.

Foto: Abraão Bruck/CMBH

A importância da divulgação de direitos e do trabalho intersetorial para enfrentar os desafios da mulher e da mãe no transtorno do espectro autista (TEA) foram ressaltados em audiência pública realizada pela Comissão de Mulheres, nesta terça-feira (25/6). Solicitado por Loíde Gonçalves (MDB), o evento reuniu representantes da Prefeitura de Belo Horizonte, Defensoria Pública e sociedade civil para discutir o diagnóstico tardio em mulheres com TEA e a necessidade de apoio que mães com TEA ou mães de filhos com diagnóstico de TEA enfrentam. Foi reivindicada maior difusão das informações sobre direitos e mais efetividade das políticas públicas. Representantes das Secretarias Municipais de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania (Smasac) e de Saúde (SMSA) falaram sobre a realização de fóruns semestrais sobre o tema, a criação de Grupo de Trabalho e o acompanhamento individual de estudantes com TEA nas escolas. Segundo a PBH, cartilha para usuários do SUS deve ser lançada até o fim do ano e a criação da Política Municipal do Cuidado - com a qual todos devem contribuir -, com orçamento próprio, é uma oportunidade para melhorar o suporte a esse público. 

Demora no diagnóstico
 
Loíde Gonçalves ressaltou o subdiagnóstico ou diagnóstico tardio de mulheres portadores da TEA em vulnerabilidade econômica como uma realidade atual. Ela disse que, apesar de existirem políticas públicas para pessoas com TEA, faltam ações mais efetivas para que elas cheguem à população. A parlamentar mencionou que, embora uma linha de cuidados para pessoas do espectro autista esteja prevista no Plano Municipal de Saúde 2022/2025, as famílias desse público ainda estão carentes de serviços. “Além da falta de divulgação da legislação sobre o tema, há a dificuldade em obter o diagnóstico, fundamental para o acesso a direitos”, disse. 

Os participantes do debate enfatizaram a importância de institucionalizar apoio a quem cuida de crianças e adultos com TEA. Membros da sociedade civil que atendem esse público e profissionais com TEA enumeraram tanto direitos consolidados pelo grupo como dificuldades persistentes em efetivá-los, enfatizando que o diagnóstico precoce permite que a criança alcance a melhor adaptabilidade possível. 

Direitos das pessoas com TEA
 
A advogada Larissa Versiani enumerou, entre os direitos assegurados às famílias de pessoas portadores de TEA, a tarifa social para água e energia elétrica, o desconto no IPVA e em passagem aérea para acompanhante de pessoa com TEA, além do direito que estudantes de qualquer idade desse grupo têm de horários especiais e mais tempo para realização de provas, o que também se aplica a concursos públicos.

Luiz Renato Braga Areas, defensor público, coordenador estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa e com Deficiência e pai de criança com TEA, disse que a implementação desses direitos de forma extrajudicial é um desafio muito grande. “É imprescindível uma rede forte de apoio para assegurar esses direitos”, afirmou, reconhecendo que a sociedade ainda não está preparada para receber todos os tipos de pessoas na sua individualidade. 

Diagnóstico caro
 
Os neuropsicólogos presentes enfatizaram o custo alto do diagnóstico de TEA, em torno de R$ 2 mil, o que o torna inacessível a pessoas de baixa renda e à maioria dos usuários de planos de saúde. Representante da ONG Vôo Azul, que tem apoio da Prefeitura, Adriana Cristina relatou dificuldades em ampliar o atendimento a esse público e disponibilizar o diagnóstico, feito na instituição por um valor social de R$ 900. 

Loíde questionou se há falta de neuropsicólogos no mercado ou somente no SUS. A neuropsicóloga Erica Alves Marques Torres respondeu que eles estão presentes em poucos locais na capital mineira e a fila de diagnóstico é alta: “É possível fazer o diagnóstico sem a avaliação de um neuropsicólogo, mas ele permite um melhor direcionamento das necessidades terapêuticas do portador de TEA". 
 
Autista de nível 1, portadora de Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDH) e superdotação, a psicóloga Kátia Borghi de Carvalho é mãe de uma criança com a mesma condição. Ela explicou que as mulheres têm neurônios espelho, responsáveis em reproduzir comportamentos sociais, em maior quantidade que os homens, o que pode dificultar a diagnóstico do autismo em mulheres. Carvalho enumerou as dificuldades enfrentadas por autistas de seu espectro, como hipersensibilidade à luz e barulho, afirmando que o conhecimento da condição individual de cada portador possibilita uma melhor qualidade de vida. 

Suporte intersetorial
 
Os representantes do Executivo presentes ressaltaram a importância do trabalho intersetorial e em conjunto com a sociedade civil para o aprimoramento do atendimento de pessoas com TEA. O diretor de Políticas para Pessoas com Deficiência da Secretaria Municipal de Segurança Alimentar e Cidadania (Smasac), Luiz Henrique Porto Villani, ressaltou a pertinência do debate e o trabalho do Município para colocar em prática os direitos das pessoas com autismo. Ele mencionou o Decreto Municipal 15519/2014, que aprimorou a discussão com Organizações de Defesa dos Direitos das Pessoas com Autismo, acrescentando que, a partir de 2018, a Smasac passou a realizar fóruns semestrais sobre o tema. Convidando todos a contribuir, o diretor mencionou avanços como o acompanhamento individual de estudantes portadores de autismo em escolas municipais, feito em parceria com a UFMG. 
 
Mencionando a criação, no Executivo, de um Grupo de Trabalho sobre o tema, Villani afirmou que as demandas da saúde são interligadas com as de setores como educação e assistência social. Ele também mencionou que o governo federal está oferecendo uma grande janela de oportunidade para a criação de uma política do cuidado, com a qual a capital mineira irá cooperar, solicitando contribuições de todos os interessados. O diretor concluiu afirmando que uma grande dificuldade do setor é a falta de recursos definidos, como os destinados para a população idosa. 
 
Sheyla Novais Faria Sampaio, coordenadora de reabilitação da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA), enfatizou a importância de habilitar o portador de TEA para a vida, e explicou que, no SUS, o diagnóstico do transtorno não é feito por uma neuropsicóloga, e sim por uma equipe multidisciplinar que inclui médicos, psicólogos e outros profissionais nos centros de saúde. Ela acrescentou, ainda, que a Secretaria dispõe de locais como Centros de Reabilitação Centro-Sul e Venda Nova e a Unidade de Referência Saudade para atendimento a esse público. Sampaio explicou que o plano voltado para pessoas do espectro autista está sendo executado em forma de notas técnicas; uma cartilha para usuários do SUS está sendo elaborada e deve ser concluída até o final do ano. 
 
Questionada por Loíde Gonçalves, a coordenadora disse que a SMSA não tem planos para implementar centros de apoio para mães de crianças autistas em BH. Luiz Villani afirmou que os recursos para a criação de locais como esse podem vir da criação da Política de Cuidado do Governo Federal. Representantes do Executivo se colocaram à disposição e enfatizaram a importância da criação de uma rede para o reforço dos direitos dos portadores de TEA e da conscientização da sociedade como um todo sobre os temas em debate. 

Encaminhamentos
 
Loíde sugeriu a Villani levar o debate sobre as necessidades dos portadores de TEA para todas as regionais e afirmou que o decreto municipal e os fóruns realizados são avanços, mas enfatizou a importância de que as políticas cheguem aos cidadãos, aprimorando a intersetorialidade de áreas como saúde, educação e assistência social. “Tenho conhecimento de pessoas precisando do diagnóstico há mais de 2 anos para poder ter acompanhante em sala de aula. Enquanto isso ela não está desenvolvendo a autonomia necessária”, disse. A parlamentar fez um apelo para que os fóruns tragam proposições que contribuam para a vida dos portadores de TEA e que os postos de saúde se empenhem em um diagnóstico preventivo, “evitando casos extremos e judicialização das demandas”. 
 
Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater os desafios da mulher e da mãe no transtorno do espectro autista (TEA) - 20ª Reunião Ordinária - Comissão de Mulheres