Comunidades cobram da PBH apoio a agricultura urbana durante a pandemia
O Executivo informou que, durante esse período, mercados e feiras de alimentos foram mantidos em funcionamento
Abraão Bruck / CMBH
Vários são os benefícios da agroecologia e de alimentos da agricultura urbana, saudáveis e medicinais, cultivados em hortas comunitárias para o autoconsumo ou como fonte de renda familiar, principalmente em tempos de pandemia. Entretanto, a atividade, realizada essencialmente por mulheres, muitas vezes não é reconhecida pelo poder público no país, nem devidamente contabilizada nas estatísticas. O tema foi debatido em audiência pública da Comissão de Mulheres, nesta segunda-feira (21/9), com a presença de representantes do segmento, Movimento Sem Terra (MST) e Executivo. Na oportunidade, a Prefeitura informou que, durante o contexto pandêmico, mercados públicos e feiras de alimentos foram mantidos em funcionamento, sendo suspensas somente feiras gastronômicas, elencando, ainda, ações e programas de valorização da prática na capital.
Na abertura da reunião, a Comissão considerou fundamental, além da oferta de cestas básicas e de bancos de alimentos pelo Executivo para o combate à fome nesse período de pandemia, o estímulo a um território sustentável, com a criação de hortas comunitárias, a agricultura urbana e a agroecologia, para o consumo de uma alimentação saudável, sem agrotóxicos. Também valorizou-se a prática como política de segurança alimentar e de cuidados com a terra.
Segundo a raizeira do Ervanário São Francisco e membro da Comissão Nacional de Raizeiras do Cerrado, Aparecida Ana de Arruda Vieira, com a pandemia, mudou-se a realidade dos plantios, crescendo a demanda por cuidados com a saúde feminina, quando são oferecidos plantas e produtos, como alface e extrato de mungo, medicamento natural que auxilia no combate à ansiedade, provocada pela sobrecarga da mulher nesse momento com a redução da renda familiar.
Fonte de renda
A agrônoma militante do MST em Minas no setor de Produção, Agroecologia, Cooperação e Comercialização, Maíra Santiago, considerou, por sua vez, que é preciso que o Poder Público invista na terra e na agroecologia como forma de sobrevivência, visando não somente o lucro de um agronegócio. Ela falou sobre a cultura do país de exportação de matéria prima e não de produção, salientando a diversidade de alimentos que podem ser produzidos pela agricultura urbana e a importância da democratização da terra para este fim. A ativista destacou, ainda, o trabalho das mulheres e seus cuidados com os bens da natureza, para a geração de renda; mas disse que esse trabalho não tem sido reconhecido, lembrando que, no momento, não é possível vender esses produtos nas feiras.
Santiago informou sobre projeto de lei que tramita no Senado Federal para o fortalecimento da agroecologia na pandemia, buscando a manutenção do auxílio emergencial por um período mais prolongado, o fomento do crédito produtivo e a renegociação de dívidas. Segundo a agrônoma, o projeto foi vetado, o que para ela ameaça o abastecimento e a renda das mulheres em todo o país. Outro projeto que tramita em nível federal, citado pela militante, é contrário à execução de despejos durante a pandemia.
A moradora da Ocupação Tomás Balduíno e produtora da CSA Orapronóbis, Lúcia Rodrigues de Souza, também lamentou a perda de mercadorias desde o início da pandemia, devido à suspensão das feiras. Ela contou que, desde então, vêm sendo feitas doações em sua comunidade, com a distribuição de alimentos, como verduras e legumes.
A colaboradora da Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas, Lorena Anahi Fernandes da Paixão, reforçou, por sua vez, a sobrecarga da mulher nesse momento e a desvalorização de seu trabalho como base de sustento e no manejo com a terra, no modo de realizá-lo, dentro da agricultura familiar, urbana e da agroecologia. Ela cobrou dos governos políticas institucionais de apoio à circulação desses alimentos e à sua distribuição para equipamentos públicos.
Estatísticas
Para a coordenadora executiva do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata e integrante da Coordenação do Grupo de Trabalho de Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia, Elisabeth Maria Cardoso, as mulheres que trabalham na agricultura familiar são invisíveis aos olhos do Poder Público, não sendo contabilizadas pelo censo agroecológico, nem tampouco pelo Produto Interno Bruto (PIB); ou seja, a produção de alimentos para autoconsumo não é monitorada nem mesmo para a venda.
Ela relatou que foi feita uma pesquisa nacional, a partir de fevereiro deste ano, na Região Nordeste do Brasil, utilizando-se, para tanto, cadernetas agroecológicas - cadernos distribuídos para essas mulheres, para que elas lançassem dados sobre sua produção, para venda, consumo, doação ou troca, registrando o valor de mercado e somando o valor da venda, quando fosse o caso. Em seis meses, apurou-se um resultado econômico de R$ 1,37 milhão, verificando-se, ainda, que ¼ da agricultura familiar era produzida por essas mulheres, constatando-se que 259 milhões de mulheres estão na invisibilidade em sua produção. Além disso, na pesquisa viabilizada por meio da caderneta, foram identificados 1.228 produtos sem repetição.
Ações da PBH
De acordo com a subsecretária de Segurança Alimentar e Nutricional, Darklane Rodrigues Dias, dois terços das mulheres que moram no campo exercem atividades produtivas sem remuneração, para o autoconsumo, juntamente com tarefas domésticas. Mas, segundo ela, essa não é a forma de atuação da Prefeitura de Belo Horizonte. A subsecretária afirmou que a política da PBH sobre a agricultura urbana é baseada, há cerca de 20 anos, no consumo diretamente da roça; e que, atualmente, a pauta é uma estratégia para a cidade, para oferecer qualidade de vida, segurança alimentar, ocupação de espaços vazios e geração de renda.
Na oportunidade, a gestora informou que o Programa de Abastecimento Agrícola é composto, em sua maioria, por mulheres (49 mulheres e 38 homens); e que a Associação Certificadora de Alimentos conta, hoje, com 59 mulheres cadastradas e 41 homens. Também relatou que existem 36 unidades de produção comunitária, entre áreas públicas e privadas, em BH, sendo que, a partir de cadastro de produção de alimentos nessas áreas, 58% são mulheres e 39,6%, homens. Avaliando-se unidades produtivas por região, na Regional Noroeste, 94% são mulheres.
Conforme destacou a gestora, durante a pandemia, mercados públicos e feiras de alimentos da cidade foram mantidos em funcionamento, suspendendo-se somente feiras gastronômicas. Ela relatou que também tem sido oferecida formação e qualificação para quem produz em quintais. Será, ainda, aberto edital para projeto voltado a práticas terapêuticas no Bairro Lagoinha, para atender às mulheres da região.
A Prefeitura salientou que ações de segurança alimentar estão a cargo do Município e que, eventualmente, são captados recursos via emendas parlamentares, devido à falta de financiamentos por parte do Governo Federal. O Executivo lembrou, por fim, de projetos de reativação do Mercado Distrital de Santa Tereza e da Feira Coberta do Padre Eustáquio, baseadas na produção da agricultura familiar e agroecologia, pela iniciativa privada (Grupo Uai e Fundação Doimo), que venceram licitação para administrar os espaços.
Encaminhamentos
A Comissão irá elaborar encaminhamentos para apreciação e aprovação na próxima reunião, ressaltando a necessidade de fortalecimento de políticas de agroecologia na Região Metropolitana de Belo Horizonte por parte do Poder Público, em parceria com as (os) produtoras (es). Também será demandada aos órgãos competentes a diversificação de recursos para a oferta de alimentos.
Assista ao vídeo da reunião na íntegra.
Superintendência de Comunicação Institucional