DIREITOS HUMANOS

Comunidade LGBT denuncia violência e omissão do Estado

Vereadores sugeriram criação de Frente Parlamentar em defesa dos direitos LGBT

terça-feira, 22 Outubro, 2013 - 00:00
Será criada Frente Parlamentar em defesa dos direitos LGBT

Será criada Frente Parlamentar em defesa dos direitos LGBT

Audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor, na tarde desta terça-feira (22/10), reuniu movimentos sociais, associações e grupos de pesquisa, apoio e defesa da livre orientação sexual e de identidade de gênero, que repudiaram os abusos, agressões, extorsões e assassinatos motivados pelo preconceito contra homossexuais, travestis e transexuais em Belo Horizonte. A comunidade denunciou a violência e negligência policial e das demais instituições públicas, cobrando ações efetivas em defesa dessas pessoas. Vereadores anunciaram a criação da Frente Parlamentar em defesa dos direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais (LGBT).

Autor do requerimento da audiência, o vereador Pedro Patrus (PT) destacou a urgência em se implementar políticas públicas em atenção a essa comunidade, alertando para o grande número de casos de violências sofridas por travestis e homossexuais no país.

Conforme dados apresentados pelo Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos), 128 travestis e transexuais foram assassinados no Brasil, apenas em 2012. Em Belo Horizonte foram registrados 13 casos. No entanto, as representações da comunidade LGBT questionam os números, afirmando serem baixos em relação à quantidade real de assassinatos. As militâncias explicaram que esses dados foram retirados de jornais, que não registram as vítimas como travestis, mas como homens vestidos de mulher, sendo incorporados à estatística masculina.

Negligência do Estado e violência social

A comunidade denunciou diferentes formas de homofobia e intolerância vividas cotidianamente por travestis e transexuais, como recusa de hospedagem em hotéis, rejeição para aluguel de imóveis e indisponibilidade de vagas de emprego. Militantes alertaram para o descaso do Estado com essa população que, muitas vezes, precisa morar na rua, por falta de acolhimento familiar, social e do serviços públicos. Pesquisadores do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania GLBT da UFMG alertaram para o despreparo e preconceito da polícia, que chega a realizar cursos para “ensinar” travestis a se comportarem nas ruas da cidade. Ainda, foi cobrada resposta do Executivo para os 13 assassinatos ocorridos no último ano.

“As travestis precisam de ajuda. Ninguém acolhe, só sabe agredir”, declarou Brenda Prado, travesti e militante, denunciando casos de abusos, agressões e assaltos sofridos. Entre as diferentes violências, Brenda contou que homens se passam por clientes, as colocam nos carros, batem, tiram suas roupas, roubam todo o dinheiro e as deixam em lugares distantes para que não consigam ajuda. “Mas a gente já não procura a polícia. Para quê? Para eles a culpa é sempre do travesti, que ‘não deveria estar na rua naquele horário’. E temos opções?”, questionou a militante, alertando para a intolerância e o preconceito sociais e cobrando políticas públicas para criação de oportunidades de trabalho para travestis.

Dezenas de pessoas denunciaram o mau uso da autoridade por policias civis e militares no exercício de suas funções. “Chegamos à polícia como vítimas e somos transformados em réus pelos próprios policias”, afirmou a representante da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra), Cris Stefanny, destacando que sofrem com as piadas, humilhações, abusos, agressões e mesmo extorsões de policiais que ameaçam prendê-las.

Políticas públicas

Coordenador recém-empossado do Centro de Referência pelos Direitos Humanos e Cidadania de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travesti, Transexuais (LGBT) da Prefeitura de Belo Horizonte, Roberto Chateaubriand afirmou que a dotação orçamentária destinada pela Prefeitura é pequena e reconheceu a insuficiência do trabalho já realizado. “Apenas 400 atendimentos em quatro anos é muito pouco”, destacou o gestor, alertando para a fragilidade da equipe, que conta apenas com dois assistentes sociais e uma psicóloga.

“Somos violentos enquanto Poder Público. E reconhecer isso é importante para buscarmos as soluções”, declarou Chateaubriand, sugerindo a atuação conjunta e colaborativa entre as instituições públicas e a sociedade como forma de enfrentamento às agressões diárias denunciadas pela comunidade LGBT. “Muitas vezes, nós mesmos (sociedade) reforçamos a impunidade desses agressores, ao reproduzirmos uma cultura sexista e machista que alimenta a violência de gênero”, alertou.

Representante do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) da PBH alertou para a responsabilidade da Assistência Social no atendimento à comunidade, afirmando que a luta contra a homofobia (relacionada à orientação sexual) e a transfobia (contra identidade de gênero) não pode ser pautada apenas pela Segurança Pública e propôs a criação de uma rede intersetorial.

Legislativo

Coordenadora e psicóloga do Núcleo de Atendimento e Cidadania LGBT da Polícia Civil, Ellen Carvalho alertou para a falta de instrumentos legais para punição dos agressores. De acordo com a instituição, o direito penal atende muito pouco a essa população, não permitindo que as violências sofridas e o assédio moral se enquadrem em crimes de ódio e intolerância. “Nos boletins de ocorrência aparecem apenas como crimes de menor potencial ofensivo, como injúria”, afirmou a coordenadora, lamentando a falta de criminalização para a homofobia. Já o Ministério Público defendeu a obrigatoriedade da inclusão da motivação do crime nos registros de ocorrência.

Os vereadores Pedro Patrus, Leonardo Mattos (PV) e Iran Barbosa (PMDB) se comprometeram a apoiar a criação de Frente Parlamentar em defesa dos direitos LGBT. Os parlamentares reconheceram a dificuldade em trabalhar o tema junto aos demais vereadores e afirmaram que irão cobrar atuação mais efetiva da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Participaram da reunião os vereadores Pedro Patrus (PT) e Leonardo Mattos (PV); a Secretaria Municipal de Direitos Humanos; o Centro de Referência pelos Direitos Humanos e Cidadania de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travesti, Transexuais (LGBT) da Prefeitura de Belo Horizonte; o Centro de Apoio Operacional de Defesa dos Direitos Humanos e Apoio Comunitário do Ministério Público Estadual; o Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos); a Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra); o Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania GLBT da UFMG; e o Núcleo de Atendimento e Cidadania LGBT da Polícia Civil (Nac).

Assista aqui a reunião na íntegra. 

Superintendência de Comunicação Institucional