PROTEÇÃO DA MULHER

Elaboração do protocolo contra importunação sexual deve ser colaborativa

Câmara, Abrasel, CDL, forças de segurança e órgãos judiciários querem participar do comitê da PBH que definirá medidas

terça-feira, 21 Março, 2023 - 23:00

Foto: Bárbara Crepaldi/CMBH

Originária de PL de Jorge Santos (Republicanos), vigora em BH desde novembro de 2020 a Lei 11.261, que obriga bares, restaurantes e casas noturnas a adotar medidas para auxiliar mulher que se sinta em situação de risco em suas dependências. A lei foi regulamentada pelo Executivo no Decreto 18.269/2023, que estabelece, entre outras regras, a criação de um comitê composto por cinco órgãos municipais para a elaboração de normas complementares. A intenção de participar dessa construção e ouvir os demais atores envolvidos motivou a realização de audiência pública pela Comissão de Mulheres da Câmara Municipal, realizada nesta terça (21/3), a requerimento de Marcela Trópia (Novo). Além da seção local da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), que sugeriu o encontro, representantes da Câmara de Diretores Lojistas (CDL-BH), Polícias Militar e Civil, Defensoria Pública e Tribunal de Justiça de Minas Gerais também relataram iniciativas e se dispuseram a contribuir com as respectivas expertises na proposição de medidas, garantindo seu alinhamento, aplicabilidade e eficácia. Para a Prefeitura, o trabalho conjunto já estava previsto e as instituições serão bem vindas.

A convocação do debate, segundo Marcela Trópia, também foi motivada pela iniciativa parlamentar de instituir um conjunto de regras para prevenir, identificar, coibir e combater as práticas que atentem contra a dignidade sexual das trabalhadoras e frequentadoras dos espaços públicos e privados de lazer da cidade. A criação do Protocolo Mulheres Seguras é proposta no PL 514/2023, assinado por Flávia Borja (PP), Marcela e outras cinco vereadoras - Cida Falabella (Psol), Iza Lourença (Psol), Loíde Gonçalves (Pode), Marilda Portela (Cidadania) e Professora Marli (PP). Protocolado no dia 8 de março, mesmo dia da publicação do Decreto da PBH, a proposição prevê, além de ação imediata em caso de denúncia, que os responsáveis pelos espaços que aderirem (voluntariamente) ao protocolo adotem estratégias para aumentar a segurança das mulheres, como a instalação de câmeras de monitoramento ou presença de funcionários em áreas mais escuras e desertas. O PL recebeu parecer pela inconstitucionalidade e aguarda apresentação de recurso.

Proteção e empatia

Cida Falabella (Psol) celebrou a promoção de debates pela Câmara e as campanhas a Prefeitura, como a do último Carnaval, mas alertou que as mulheres ainda se sentem inseguras. “O assédio não depende de roupa e comportamento e não pode ser naturalizado; a vítima nunca é culpada”, reforçou. Em seu entendimento, é preciso “uma legislação forte, fiscalização e construção de redes de proteção” para combater o problema. “Independente da iniciativa partir do Executivo ou do Legislativo, é preciso que todos se alinhem para mudar a cultura do estupro; a expressão parece pesada, mas a agressão começa com piadinhas e importunação sexual”, alertou. A vereadora comemorou a tipificação dessas condutas como crime, mas pediu mais empatia: “temos direito à alegria, ao lazer e ao prazer; quando sofremos agressão, a cidade deve nos defender, e não julgar”, concluiu.

Professora Marli (PP) reiterou as palavras de Cida e, lembrando a audiência recente da comissão sobre a violência doméstica, lamentou que ainda seja necessário debater esses temas. Ela defendeu o avanço do PL 246/2021, de sua autoria, que institui o Programa de Cooperação e Código Sinal Vermelho ("X na mão") para as mulheres comunicarem situações de risco. “Pode parecer pouco, mas é uma medida simples e acessível que pode poupar a vida de meninas e mulheres”, reforçou Marli.

Rubão (PP) lamentou o aumento de casos no país, apesar das ações e campanhas de prevenção, e defendeu que os agressores têm de arcar com as consequências.“Importunação é crime”, reiterou. Para ele, a punição pode desencorajar os outros homens. “Temos de fazer justiça, mas sem cometer injustiças”, ponderou, lembrando o caso do jogador Neymar, acusado injustamente.

O parlamentar lembrou que estamos na segunda semana de março, destinada pela Lei 11.414/2022, de sua autoria, à conscientização sobre o tema, mas reforçou a necessidade de campanhas contínuas, em mais horários e veículos de comunicação e estendidas a todos os ambientes – lares, escolas, empresas. 

Apoio da polícia e da justiça

Mateus Daniel Pires de Morais, novo presidente da Abrasel-MG, contou que foi procurado pela Prefeitura há cerca de um mês para tratar da regulamentação da Lei 11.261; na ocasião, segundo ele, a entidade já tinha conhecimento da apresentação do PL 514/2023, através de Marcela Trópia, e já vinha colaborando em sua elaboração. Mateus relatou as campanhas anuais de combate ao assédio em bares e restaurantes e outras formas de violência contra a mulher, realizadas pelo setor desde 2017 em parceria com o Tribunal de Justiça do Estado, e as medidas adotadas pelos estabelecimentos, antecipando-se à normatização formal do tema pelo Município. Mencionando que, em 2022, a Abrasel ajudou a divulgar a campanha desenvolvida pela Câmara Municipal na gestão da presidente Nely Aquino, que alcançou repercussão nacional, o representante dos bares e restaurantes acredita na força dessas iniciativas: “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”, afirmou. Para ele, é fundamental não apenas conscientizar as mulheres da importância de denunciar a violência, mas também deixar claro para os homens que “não é não!”.

Mateus relatou que a entidade solicitou à Prefeitura e à Câmara a inclusão do judiciário e das polícias no debate, possibilitando que todos os envolvidos, que compartilham os mesmos objetivos, possam andar juntos na mesma direção. A construção conjunta de protocolos permite a definição de medidas práticas e exequíveis, alinhando ações e procedimentos de cada elo da cadeia. Como exemplo, ele citou que alguns restaurantes já possuem um código de comunicação para as mulheres, como pedir um determinado drink, mas ele nunca foi utilizado. “Para ajudar a criar, uniformizar e orientar essas condutas, ninguém melhor que as forças de segurança”, pontuou. As verbas destinadas pela Câmara ao programa pode ajudar a custear o treinamento dos funcionários, atribuído pelo Decreto à Prefeitura, já que os estabelecimentos não possuem essa expertise. Outra preocupação da Abrasel diz respeito aos pequenos empreendimentos, que não têm recursos para instalar câmeras ou manter espaços reservados para acolher as vítimas, o que demanda a criação de protocolos adequados à sua realidade.

A tenente-coronel Ivana Quintão, comandante da 1ª Cia independente de prevenção à violência doméstica da Polícia Militar, e a delegada Renata Ribeiro, da Polícia Civil de Minas Gerais, expuseram os procedimentos das instituições em relação à violência contra a mulher, da qual a importunação sexual é uma das modalidades. Ambas as corporações possuem divisões específicas (Companhia e Delegacia) especializadas no atendimento e encaminhamento dessas denúncias. As agentes reforçaram a importância fundamental do registro das ocorrências pelas vítimas, permitindo a tomada de ações e o acompanhamento dos casos. As policiais se colocaram à disposição para participar da elaboração das políticas e protocolos municipais, orientando o alinhamento das medidas aos procedimentos e fluxos de atendimento da rede. As representantes da Defensotria Pública e do Tribunal de Justiça do Estado, também envolvidas com a questão, se prontificaram a encaminhar as colocações dos participantes e a contribuir no trabalho conjunto.

Políticas municipais

Representando a Prefeitura, a presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher e agente da Guarda Civil Municipal, Jane Idrésia das Santos, e a diretora de Políticas para as Mulheres da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania, Daniella Lopes Coelho, elogiaram o trabalho da Câmara e da comissão temática em relação à proteção e defesa das mulheres em Belo Horizonte e o apoio das demais instituições, citando as campanhas da Guarda Municipal nas estações e veículos do transporte público e a disponibilização do botão de pânico nos coletivos; campanha de conscientização nos estádios; e campanha “Não é Não” nos blocos de carnaval de rua. As gestoras também defenderam a ampliação e extensão dessas ações educativas e apontaram os avanços trazidos pela tipificação do crime de assédio e importunação, em 2018, mas concordaram que a subnotificação impede a abordagem mais eficiente do problema. Essa situação, além do constrangimento, do medo de ser julgada ou culpabilizada e das ameaças do agressor, deve-se à sensação de impunidade, de “não vai dar em nada”.

Nesse sentido, todas as participantes da audiência concordaram que é preciso promover a escuta da mulher e acreditar nela, sem juízos de valor sobre sua roupa e comportamento, local ou horário em que estava na hora da agressão, se havia usado álcool ou drogas, e oferecer um atendimento humanizado na casa noturna, no serviço de saúde, na polícia e na justiça, que faça com que a vítima se sinta acolhida, amparada e protegida. Rubão apresentou estatísticas nacionais que apontam o aumento das denúncias nos órgãos de segurança, favorecendo o monitoramento e a prevenção de novas ocorrências, que indicam o sucesso das iniciativas. As vereadoras e as representantes da Prefeitura reiteraram que o enfrentamento a todas as formas de violência contra a mulher é uma responsabilidade de toda a sociedade, mas é necessário que o poder público estabeleça políticas públicas eficazes que realmente atendam, protejam e deem segurança a suas cidadãs. Outro ponto de convergência das participantes, partindo do aspecto estrutural do problema, é a necessidade de trazer os homens e meninos para a discussão.

Considerando os objetivos comuns e as diferentes especificidades, funções e expertises dos envolvidos, a Prefeitura reconhece que o trabalho conjunto possibilitará a elaboração de protocolos mais aplicáveis e eficazes e se comprometeu a incluir a participação de todos no comitê. Marcela Trópia reiterou a necessidade de padronizar/alinhar os órgãos e setores para fortalecer a criação e difusão do protocolo e o treinamento de funcionários dos estabelecimentos. A vereadora lembrou que os esforços do Município nesse sentido nasceram dentro do Legislativo e já vêm sendo abordados nos âmbito das demais entidades e instituições presentes, que têm muito a colaborar. Ela assegurou ao presidente da Abrasel que o objetivo da Câmara é propor medidas que sejam tangíveis para empresas de todos os portes, que não onerem nem atrapalhem a dinâmica dos negócios e não transfiram responsabilidades das polícias e da justiça para as empresas, possibilitando que funcionem de fato em toda a cidade.

Superintendência de Comunicação Institucional