MOBILIDADE URBANA

Empregados questionam extinção da BHtrans e pedem mais diálogo

Parlamentares propõem emendas para garantir direitos trabalhistas e reduzir impactos na categoria

quinta-feira, 9 Setembro, 2021 - 19:30
Tela com imagem de servidores da BHTrans se manifestando

Foto: Karoline Barreto/CMBH

“Não se pode votar um projeto desses sem antes ouvir os trabalhadores.” Com essa fala, Iza Lourença (Psol) abriu a audiência pública realizada pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário, nesta quinta-feira (9/9), para debater os impactos da extinção da BHTrans sobre os empregados públicos e sobre os serviços públicos da política de mobilidade urbana de Belo Horizonte. A necessidade de ouvir os funcionários e trabalhadores da empresa sobre o Projeto de Lei 160/2021, que prevê a extinção da BHTrans em até 15 anos, foi consenso. Com a limitação do acesso físico ao plenário em função das medidas de contenção da pandemia, a população pôde participar do debate por meio de formulário eletrônico disponível no Portal CMBH; as perguntas recebidas foram lidas no início da reunião para que pudessem ser respondidas pelos convidados.

Falta de debate com servidores

Diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Assessoramento, Pesquisa, Perícias, Informações e Congêneres de Minas Gerais (Sintappi/MG), Renata Moreira afirmou que a tramitação acelerada do projeto prejudica o diálogo com os trabalhadores e que BH está adotando uma reforma administrativa que tem como objetivo acabar com o serviço público. “Essa é a primeira vez que estamos sendo ouvidos. A velocidade com que esse projeto está tramitando nesta Casa, sem debate e sem participação, parece que há um 'passamento de boiada' em relação a esse tema que é a extinção de mais de mil empregos a curto, médio e longo prazos”, disse Renata, reclamando da ausência de representantes do Executivo que pudessem responder a todas as dúvidas dos trabalhadores. 

A sindicalista destacou que não se pode culpar os funcionários pela má gestão da empresa e lembrou que o ordenador de despesas da BHTrans é a PBH. “A BHTrans não pode comprar uma caneta sem a autorização da Prefeitura. Muito me surpreende a ausência de prefeitos na CPI e muito me preocupa a terceirização de atividades do agente público”, queixou. Renata argumentou que a BHTrans é a primeira empresa a ser autarquizada e que as outras empresas deverão passar pelo mesmo processo de terceirização. 

Terceirização impacta na qualidade do serviço

A preocupação com a terceirização foi compartilhada por Aline Parreiras, técnica em Transporte e Trânsito da BHTrans. Para ela, a terceirização da atividade finalística vai significar uma redução de custos sem obrigatoriedade de arcar com encargos trabalhistas, além da perda da qualidade do serviço prestado. Aline defendeu que a mobilidade urbana não é mercadoria para ter lucro e que é dever do poder público assumir essa responsabilidade, não havendo motivos para abrir mão de uma mão de obra tão qualificada: “O tema é muito complexo e exige uma discussão mais ampla". A técnica demonstrou sua preocupação com os funcionários mais jovens questionando “o que será feito com eles? Terão que passar em outro concurso para exercer a mesma função?”, indagou.

Ao abordar a terceirização, o professor de Direito da UFMG Gustavo Seferian concordou que os trabalhadores não podem ter seus direitos vilipendiados e advertiu que “os serviços públicos devem ser fortalecidos, não em uma lógica de terceirização”. 

PL teria problemas de ordem jurídica, econômica e social

Renato Luiz, advogado do Sintappi, também acredita que é preciso debater com mais propriedade o tema. Segundo ele, existem problemas de ordem jurídica, econômica e social que não estão sendo considerados no PL. Ele explicou que a BHTrans é uma empresa pública de economia mista que exerce atividade econômica e que uma autarquia, por lei, não pode exercer a mesma atividade que uma empresa de economia mista. O advogado ainda ressaltou que não vê sentido em criar uma autarquia para exercer a mesma atividade, nem em ter um terceiro órgão para atuar na mobilidade urbana da cidade. Renato; questionou se a intenção é criar mais 144 cargos e afirmou que o trabalho desenvolvido ao longo de 30 anos será ofuscado. “A extinção da BHTrans é a coroação de uma promessa de campanha”, denunciou.  

As questões legais e a preocupação com o futuro dos funcionários também foram questionadas pelo analista de Transporte e Trânsito Sergio Manini. Ao pedir que a Procuradoria-Geral do Município se manifeste claramente acerca do PL, ele afirmou que o setor está ciente da necessidade de repensar a mobilidade urbana na cidade: “Nenhum de nós é contrário à mudança, mas temos que saber quando e como fazer”. 

Conhecimento limitado 

“Qual a justificativa para acabar com a BHTrans?” Esse foi o questionamento do analista de Transporte e Trânsito Nelson Dantas. Sem esconder seu descontentamento com matérias jornalísticas publicadas que ele chamou de tendenciosas, Nelson fez um panorama histórico e afirmou que cidades europeias voltaram atrás e estatizaram os serviços de mobilidade urbana. Segundo ele, em todas as medidas adotadas para compreender os processos e sanar possíveis delitos, como, por exemplo, abertura da “caixa preta” e combate à formação de cartéis, os funcionários se posicionaram como parceiros. “Não somos contra a novidade, mas queremos que outros atores e especialistas sejam convidados para debater o projeto”, disse. Ele argumentou que a cidade inteira usa o transporte público e "é isso que justifica o serviço ser subsidiado", afirmou.

A falta de entendimento nas questões de mobilidade e a ausência de participação popular nas audiências públicas que trataram da extinção da empresa também pontuaram a fala de Demetrios Novais, representante do conselho dos empregados. Demetrios acredita que o tema deve ser debatido com calma e com profissionais que são referência em debates sobre transporte público. Segundo ele, "muitos moram no centro da cidade, não conhecem os bairros da periferia e ficam debatendo sobre mobilidade urbana” e o desconhecimento dos serviços prestados pela BHTrans impede que sejam “apontadas as falhas”. “É preciso apontar onde estão as falhas da BHTrans porque os contratos são firmados entre as empresas de ônibus e a PBH”, lembrou. 

Demetrios destacou a qualidade técnica dos servidores da BHTrans, garantindo que nenhum deles corrobora com atos ilícitos, e questionou os critérios de nomeação de assessores e gerentes usados pela PBH, afirmando que “na BHTrans para exercer um cargo de chefia você precisa, antes de tudo, ser técnico. Na PBH não é assim”. 
Ele ponderou que a política pública de mobilidade é orientada pelo programa de governo dos prefeitos e que a BHTrans seria a gestora deste programa, alertando que a criação da Sumob e a permanência da BHTrans vão criar uma situação na qual haverá dois órgãos responsáveis pelas mesmas atividades.

PBH vai respeitar direitos de servidores

A subsecretária de Gestão de Pessoas da PBH, Fernanda Neves, reconheceu a qualidade dos trabalhadores e garantiu que os direitos trabalhistas dos funcionários serão garantidos de forma explícita no PL. Ela afirmou que, ainda que os direitos já estejam assegurados em lei própria, o projeto vai receber emendas que vão garantir os passivos trabalhistas “para dar mais segurança para os trabalhadores”. Fernanda informou ainda que o PL deixa claro que a ideia não é replicar despesas. “Para criar cargos na Sumob temos que extinguir cargos na BHTrans. A mudança vai permitir uma economia na ordem de 30%, com uma estrutura mais enxuta e eficiente”.

Representando o presidente da BHTrans, Marcus Vinicius Mota de Meira Lopes destacou que a visão da direção da empresa é promover a modernização com o corpo técnico existente.

Emendas vão garantir direitos

O vereador Gabriel (sem partido) voltou a elogiar a “maioria dos funcionários da BHTrans” destacando a competência e o nível de probidade que apresentam, e assinalou que o texto vai receber emendas no intuito de respeitar os direitos dos servidores. O parlamentar informou que recebeu uma comitiva de servidores da BHTrans e que serão feitas cinco emendas ao projeto com foco na garantia de direitos, atendendo as solicitações de sindicatos. Ele rebateu as informações de Demetrios quanto à possibilidade de empresas devedoras poderem participar de licitações públicas; desafiou o servidor a dar nome “a quem quer fazer politicagem”; e garantiu que a BHTrans vai fechar. 

Bella Gonçalves (Psol) ponderou que é preciso garantir a defesa dos serviços e dos trabalhadores. “O sistema de transporte tem muitos problemas que têm muito mais a ver com os contratos do que com os trabalhadores. Não queremos fazer uma remodelagem sem resolver esses problemas”, afirmou. Ela reconheceu que os funcionários nada têm a ver com a “farra” que os empresários fazem com o dinheiro público e lembrou que existem projetos de lei em andamento na CMBH que pretendem revogar as concessões das empresas de ônibus.  

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional 

Audiência pública para debater sobre os impactos da extinção da BHTrans - 27ª Reunião Ordinária - Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário