Conjunto de normas regula o funcionamento da Câmara Municipal
Preferências dos parlamentares em interação com regras da Casa determinam se e quando um PL será aprovado
Foto: Karoline Barreto / CMBH
A formação de maioria contra ou a favor a qualquer projeto é o que define se ele irá ou não se tornar lei em Belo Horizonte. Assim, se a preferência do vereador acerca de cada matéria é uma das primeiras coisas que vem à cabeça quando se pensa no que define o voto do parlamentar, é necessário ter em mente que tais preferências estão em constante interação com as normas que regem o funcionamento da Câmara. O entendimento de tais normas é, portanto, condição necessária para que se possa compreender, de fato, como uma demanda legítima advinda de qualquer dos diversos segmentos que compõem a cidade de Belo Horizonte vai transformar-se, ou não, em lei municipal. Na Câmara de BH, assim como nos demais parlamentos existentes no país, há um conjunto de normas que regula os processos de votação e os debates. Denominado Regimento Interno (RI), tal dispositivo traz as regras para a tramitação das proposições que, caso aprovadas, irão formar o arcabouço legal do município.
Tais normas determinam, por exemplo, o número de comissões que irá analisar as matérias legislativas; definem as condições para que debates e reuniões ocorram e quem pode participar desses processos; preveem a quantidade de parlamentares que precisa se posicionar favoravelmente à matéria para que ela seja aprovada; estipulam os prazos para sua tramitação e as possibilidades de que sejam ampliados ou reduzidos; expressam os procedimentos para definição dos cargos de comando em Plenário e comissões; entre outros. Desse modo, o RI é um dos importantes instrumentos para definir se e quando uma matéria será ou não aprovada.
Domínio das regras
A importância do Regimento Interno é tanta que, entre os vereadores, costuma ser dito que aqueles parlamentares que dominam as normas que o compõem têm mais chances de obter êxito em sua atuação parlamentar. Isso porque é no RI que estão os artigos, parágrafos e incisos que possibilitam adiantar, impedir ou atrasar a votação de uma proposição.
Quem acompanha as reuniões do Plenário já deve estar acostumado a ouvir os parlamentares solicitarem “142” ou “155”. Nesses momentos, eles estão se referindo a artigos do Regimento Interno. O Artigo 142 interrompe a discussão de determinada proposição, que poderá vir a ser retomada caso o parlamentar que propôs a interrupção solicite que o projeto volte a ser apreciado. Já se o requerente não propuser a retomada da discussão até o fim da primeira parte da Ordem do Dia, que é o período destinado à votação e discussão dos projetos, a proposição ficará automaticamente retirada de pauta e, para voltar a ser apreciada em Plenário, precisará ser novamente anunciada pela presidente da Câmara. Esse dispositivo costuma ser usado quando há um acordo entre os vereadores para que determinados projetos sejam votados antes de outros ou quando um parlamentar que se opõe a um PL quer evitar que ele seja votado.
Os vereadores também podem, por meio do Artigo 155, requerer o adiamento de uma votação antes do início da mesma. De acordo com o RI, o parlamentar que apresentar tal requerimento poderá, ainda, solicitar que a proposição seja recolocada na pauta da mesma reunião. Uma das motivações para o requerimento desse artigo do RI pode ser a falta de apoio necessário para a aprovação de uma matéria. Nesses casos, o próprio autor do projeto ou o líder de governo, no caso de proposições apresentadas pela PBH, pode requerer o Artigo 155 com vistas a adiar o processo de votação e trabalhar pela construção de maioria favorável à proposição no Plenário.
Palavra em Plenário
A limitação de tempo para uso da palavra em Plenário também se encontra no Regimento Interno. Uma das razões para que as falas dos parlamentares sejam limitadas é impedir que a votação de determinada proposição seja adiada ininterruptamente por meio da ocupação dos microfones.
Caso não houvesse esse tipo de regra, parlamentares poderiam fazer uso da palavra até o encerramento da reunião, de modo que, quando houvesse tentativas de obstrução, proposições poderiam nunca chegar a ser votadas. Por outro lado, um RI extremamente rígido poderia limitar exageradamente o debate e impedir a vocalização das diferentes preferências que compõem o Parlamento. Para se chegar a um equilíbrio a esse respeito, o Regimento Interno da Câmara foi elaborado com base em experiências anteriormente acumuladas nessa e em outras casas legislativas.
O Artigo 90 determina que o tempo para falas em Plenário varie de um a quinze minutos, de acordo com o uso que o vereador pretenda fazer. As falas de até um minuto são aquelas em que, por exemplo, o vereador encaminha o voto relativo a uma proposição que virá a ser apreciada em Plenário. O uso do microfone também é limitado em até um minuto quando o vereador vai declarar seu voto, isto é, expor argumentos que justifiquem o posicionamento por ele tomado no momento da votação.
Já o tempo de 15 minutos é destinado aos vereadores que se inscrevem para fazer uso da tribuna como orador. Os oradores são limitados a dois por reunião, e a inscrição para usar a tribuna é realizada por meio eletrônico, no período de 14h a 14h30 do dia da reunião em que se deseja falar.
Estratégias da minoria
Além de ocupar o microfone pelo maior tempo possível ou de solicitar a retirada de pauta, outra estratégia utilizada por grupos de parlamentares que não têm voto suficiente para rejeitar uma proposição é a apresentação de emendas ou de requerimentos para votação destacada. Quando requerimentos que solicitam votação destacada com preferência para certos incisos ou artigos são apresentados, o Plenário tem a oportunidade de aprovar ou rejeitar apenas partes do projeto em votação.
Para evitar o alongamento do processo de votação com a apreciação de cada dispositivo que compõe um projeto, o RI também possibilita a apresentação de requerimentos para que os destaques sejam votados em bloco, o que também pode ser solicitado para as emendas.
O Projeto de Lei 747/19, por exemplo, que trata da concessão dos mercados municipais à iniciativa privada, recebeu diversas emendas e requerimentos para votação destacada de artigos e incisos. Parlamentares contrários ao projeto solicitaram votação destacada de todos os cinco artigos e seis incisos que compõem a proposição. Outra estratégia daqueles que se opunham ao projeto foi apresentar emendas que buscavam alterar a propositura original da Prefeitura.
Tais ações muitas vezes são tomadas quando os parlamentares contrários a determinadas proposições entendem que não têm maioria para rejeitá-las em Plenário. Daí a busca por instrumentos regimentais que possam dificultar a votação. É possível perceber, desse modo, que o próprio Regimento Interno oferece instrumentos que possibilitam atrasar ou acelerar votações, de maneira que o conceito de produtividade em Plenário não deve ser tomado apenas com base no número de projetos votados. Buscar acelerar ou atrasar votações faz parte das atividades rotineiras em um parlamento.
Quando a votação de projetos em pauta não ocorre, em geral, há trabalho intenso de grupos parlamentares contrários e favoráveis tentando fazer valer suas preferências, seja por meio dos dispositivos regimentais existentes, seja por meio de negociações que venham a possibilitar um acordo para votação.
Estratégias da maioria
Assim como os grupos minoritários contrários a um projeto fazem uso dos instrumentos regimentais para alcançar seus objetivos, também aqueles majoritários favoráveis a determinada proposição se utilizam dos dispositivos que o RI oferece para que a votação seja concluída. No caso do exemplo utilizado acima - o PL 747/19 - foram apresentados requerimentos para votação em bloco de destaques e emendas. Essa estratégia reduz o número de votações necessárias para a apreciação do projeto e costuma ser usada por aqueles que têm maioria em Plenário.
Além de requerer a votação em bloco de destaques e emendas e de evitar o uso do microfone, os grupos majoritários interessados em concluir as votações de determinadas proposições podem recorrer a outras estratégias previstas no RI.
É comum, por exemplo, que aconteçam reuniões extraordinárias de Plenário e de comissões para que proposições em pauta tramitem mais rapidamente. Isso somente pode ocorrer porque tal previsão está disposta no Regimento Interno. Além de não ser necessário esperar pela próxima reunião ordinária para que a votação ocorra, o próprio andamento da reunião extraordinária é mais rápido, estando esse tipo de reunião menos sujeita a instrumentos que permitem a postergação da apreciação dos projetos.
As reuniões extraordinárias são aquelas que se realizam em dia ou horário diferente do fixado para as ordinárias. No caso das reuniões de comissões permanentes, há uma ordinária por semana. No caso das de Plenário, a ocorrência das reuniões se dá nos dez primeiros dias úteis de cada mês. A exceção é janeiro, quando ocorre recesso parlamentar e não há reuniões ordinárias.
A duração da reunião de Plenário extraordinária é a mesma da ordinária, isto é, três horas e trinta minutos, no entanto, a primeira tem mais tempo dedicado à discussão e votação de proposições. Enquanto na ordinária, esse período é de uma hora e vinte e cinco minutos, na extraordinária esse prazo aumenta para até três horas. Assim, a estratégia de utilizar o microfone o maior tempo possível para adiar votações fica restrita. Além disso, há maior rigidez por parte do RI na punição de ausência nesta última, de modo que não marcar presença com o intuito de tentar evitar a realização da reunião torna-se uma estratégia menos factível. Daí que, por vezes, a convocação da reunião extraordinária do Plenário da Câmara acaba por facilitar a conclusão de votações sobre as quais há grande controvérsia.
Mudanças no Regimento Interno
Esta legislatura implementou alterações no Regimento Interno. Entre elas, houve a criação de uma nova comissão permanente e a adoção do caráter conclusivo da Comissão de Legislação e Justiça. Os atuais membros da Mesa Diretora, preocupados em minimizar a sub-representação das mulheres no Parlamento e em buscar a reparação de danos relativos à diferenciação histórica no acesso a direitos entre os sexos, apresentaram um projeto para a criação da Comissão das Mulheres.
De caráter permanente, a comissão deve ter suas vagas preenchidas por mulheres, podendo ser composta por homens apenas se não houver representantes do sexo feminino para ocupar as cadeiras nas comissões. Do mesmo modo, os cargos de presidente e vice na comissão devem ser ocupados por mulheres, podendo vir a ser de representantes do sexo masculino caso não haja vereadoras para ocupá-los.
Entre as incumbências da comissão está a apreciação de matérias atinentes à promoção e defesa dos direitos das mulheres e de promoção da igualdade com os homens. Também tramitam pela comissão os projetos que tratam de políticas públicas sociais e econômicas destinadas a assegurar a autonomia das mulheres; de combate à violência contra mulheres, à exploração sexual e ao feminicídio.
A atual legislatura também se preocupou em garantir a constitucionalidade das proposições em tramitação na Câmara e em reforçar o papel das comissões como colegiados que permitem análises especializadas e aprofundadas dos temas. Para tanto, foram propostas e aprovadas alterações no RI que estão em vigor desde dezembro do ano passado.
Uma das alterações determina que quando a Comissão de Legislação e Justiça concluir pela inconstitucionalidade, o projeto será arquivado, isto é, não irá mais tramitar, exceto se o Plenário da Câmara decidir em sentido contrário. Para que o Plenário possa decidir a respeito, é necessário que haja recurso contra o parecer conclusivo da comissão, subscrito por, pelo menos, cinco vereadores e interposto nos cinco dias úteis seguintes à distribuição do parecer pela inconstitucionalidade.
Os vereadores desta legislatura decidiram, ainda, que quando todas as comissões de mérito às quais a proposição tiver sido distribuída concluírem pela rejeição da matéria, haverá o seu arquivamento. A possibilidade de recurso ao Plenário, nesse caso, estará sujeita às mesmas regras previstas para projetos considerados inconstitucionais.
Em vigor desde 1990, mas sendo constantemente atualizado desde então, o Regimento Interno da Câmara é o instrumento que busca fazer com que os diversos segmentos que compõem a população da capital – representados na Câmara Municipal – possam ter a chance de trabalhar para que suas preferências sejam vocalizadas e seus pleitos sejam atendidos, dependam eles da rejeição ou aprovação de proposições, do adiamento ou aceleração de votações, do encerramento ou continuidade das discussões. Para isso, o RI deve garantir os direitos tanto da maioria quanto da minoria, tanto do governo quanto da oposição, bem como os meios para assegurar a participação popular, a transparência e o caráter cada vez mais democrático e representativo nos atos do Legislativo.
As mais recentes mudanças aprovadas pela atual legislatura atuam nesse sentido ao atender aos pleitos contemporâneos da sociedade por maior igualdade entre homens e mulheres, bem como por garantir a tramitação de proposições cada vez mais qualificadas, seja no que tange a sua constitucionalidade, seja no que concerne à valorização da análise especializada das comissões temáticas da Casa.
Conheça aqui o Regimento Interno da Câmara Municipal atualizado.
Superintendência de Comunicação Institucional