ACEs exigem da Prefeitura retorno do adicional de insalubridade
Agentes querem benefício a partir de nova base de cálculo; PBH pede prazo para responder sobre reivindicações de trabalhadores
Foto: Karoline Barreto/CMBH
O corte do adicional de insalubridade de centenas de Agentes de Combate a Endemias (ACEs) da equipe da dengue motivou um debate sobre o tema nesta quarta (3/8) na Comissão de Administração Pública da Câmara Municipal. O não pagamento do adicional de insalubridade foi alvo de protestos do Sindicato dos Servidores Públicos de BH (Sindibel) e de membros de outras categorias também impactadas pelo não pagamento, as quais, juntamente com os ACEs lotaram o Hall da Presidência. Segundo eles, o adicional é um direito previsto na legislação federal, que estaria sendo descumprido pela Prefeitura. Os trabalhadores exibiram fotos e vídeos mostrando os riscos a que estão expostos no dia a dia e contestaram laudo que embasou a decisão do corte do adicional. Eles alegam que não teria havido a consideração dos ambientes e condições diferenciados de cada agente e território. O procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT) concordou que a situação é grave e ameaça a saúde dos trabalhadores. A subsecretária Municipal de Gestão de Pessoas afirmou que a PBH já está avaliando as questões levantadas e dará retorno em uma semana. Para conhecer a posição oficial sobre as reivindicações, Léo vai intermediar a realização de outra reunião com o prefeito, com a participação do MPT.
Léo (PL) relatou que, no dia 21 de julho, os trabalhadores decidiram entrar em greve como resposta à decisão da Prefeitura de BH de cortar ou reduzir o adicional de insalubridade dos ACEs da dengue e dos Agentes Sanitários. Contudo, em nova assembleia, a categoria decidiu suspender a greve, por 98 votos a 80, para aguardar o resultado de uma reunião com o prefeito Fuad Noman para tratar do tema. Como forma de reforçar as reivindicações, os trabalhadores solicitaram ao vereador a realização da audiência para trazer a questão à Câmara e envolvê-la nas negociações. Léo afirmou que os trabalhadores foram bem recebidos pelo prefeito, que ouviu com atenção os três principais pedidos da categoria: que o adicional de 10% que recebem hoje seja calculado sobre o vencimento-base, e não sobre o salário-mínimo; que o laudo de insalubridade seja feito caso a caso, nos diferentes ambientes de trabalho; e que o dia da paralisação seja reposto, evitando o corte do ponto.
Legislação
No entendimento de Léo, a forma de cálculo do adicional é apenas uma questão de interpretação da lei pelo setor jurídico do Município e que, nesse ponto, não existe possibilidade de negociação. Quanto ao laudo, que teria sido elaborado coletivamente, aplicando-se a todos os territórios e trabalhadores, o parlamentar afirmou que os riscos variam em cada ambiente e para cada função e, portanto, a análise deve ser individual, considerando tais diferenças. O vereador mencionou ainda que, em reunião, foram apresentados inúmeros casos de ações judiciais ganhas pelos agentes, que obtiveram o direito de receber 40% de adicional de insalubridade, correspondente ao grau máximo de exposição a riscos. Ele afirmou que o prefeito entendeu as reivindicações, mas ponderou que a revisão das decisões exige respaldo jurídico e é preciso esperar a avaliação da Procuradoria-Geral.
Léo comunicou que a categoria não pretende aceitar o corte e todos os trabalhadores incluídos na lista publicada no Diário Oficial do Município, com mais de mil nomes, vão recorrer da decisão; alguns recursos, porém, já foram negados.
O representante do Sindibel, Israel Arimar, confirmou as informações do vereador, reiterando a demanda por avaliação diferenciada de cada caso e cada ambiente, no que tange ao direito ao adicional de insalubridade. O representante sindical também afirmou que os trabalhadores não vão abrir mão da mudança da base de cálculo.
Segundo Arimar, a base de cálculo não deve ser confundida com a definição do grau de insalubridade (mínimo, médio ou máximo), que determina a porcentagem de 10%, 20% ou 40% a incidir sobre a remuneração.
As sentenças favoráveis aos trabalhadores deixam claro, segundo os trabalhadores, que, pela legislação, o cálculo com base no salário-mínimo só deve ser aplicado se não sobrevier outra lei dispondo de forma diversa, devendo prevalecer o que for mais favorável ao trabalhador. Assim, no caso de BH, a base de cálculo teria de ser o vencimento-base atual da categoria, que é de dois salários-mínimos.
O sindicalista relatou, ainda, que a categoria estava em negociação com as secretarias municipais quando a lista com 1.070 nomes que sofreriam corte ou redução do adicional foi publicada no Diário Oficial, em um sábado, pegando os trabalhadores de surpresa.
Riscos ambientais e condições precárias.
A redução do adicional para os ACEs da dengue e o corte total para os Agentes Sanitários, segundo ele, é um paradoxo, já que ambos atuam em campo e têm as mesmas atribuições; Ele acrescenta que o adicional para os Agentes Sanitários está previsto no plano de carreira municipal. “Por que uma categoria tem insalubridade e a outra não?”, questionou. O plano de carreira dos ACEs estabelece o adicional de 20%, mas os que obtiveram laudos periciais da justiça constatando risco biológico passaram a receber 40%.
Sindicalistas e trabalhadoras que se manifestaram na audiência reiteraram que a própria legislação determina que a avaliação da insalubridade também deve considerar os riscos físicos e biológicos, os quais não foram alterados pela troca do veneno realizada pela PBH. Além disso, os estudos sobre o novo veneno adotado, os quais justificam a perda do adicional, não comprovam que a substância não afeta a saúde humana a médio e longo prazo.
As trabalhadoras exibiram a tabela do Ministério da Saúde contendo os fatores de risco, situações de exposição e possíveis consequências para a saúde, bem como imagens mostrando a realidade do dia a dia dos Agentes. Além de manusear e aplicar venenos, eles atuam em ambientes insalubres como córregos contaminados e esgotos a céu aberto, expondo-se a picadas de animais, contaminação por doenças e parasitas e radiação solar. Nas visitas domiciliares, os trabalhadores entram em banheiros e quartos muitas vezes apertados e sem ventilação e mantêm contato direto com pessoas doentes. As atividades estariam sendo desempenhadas sem equipamentos de proteção individual (EPIs) - trajes, máscaras, óculos e luvas – adequados e sem o devido treinamento. Ainda segundo as trabalhadoras, a categoria foi a segunda com maior índice de contágio pela covid-19, atrás apenas da enfermagem. Imagens dos Pontos de Apoio (PAs) em centros de saúde, onde passam boa parte do dia, também foram utilizadas para comprovar que as condições de trabalho e os riscos não são os mesmos para todos.
Representantes dos servidores do Hospital Odilon Behrens, da rede municipal, cobraram o pagamento de adicional para os funcionários, inclusive os administrativos, que circulam nos mesmos ambientes que os médicos, enfermeiros e pacientes e, portanto, também estariam expostos a contágio e contaminação.
O advogado do Sindibel, Leandro Gomes, confirmou os relatos apresentados, dispondo-se a orientar aqueles que quiserem entrar na justiça. Ele também apontou que os custos do Município com milhares de ações judiciais, considerando que 99% teriam sido ganhas pelos trabalhadores, vão superar o que seria gasto com o pagamento do adicional.
Sobre a base de cálculo, ele reafirmou que a lei é clara e não cabe discussão. Para Leandro, o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) e o Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) da PBH são “factóides” e não retratam a realidade. Ainda segundo ele, o corte do adicional “vai na contramão da história”, já que, em nível federal, a categoria vem sendo cada vez mais reconhecida e valorizada. “A precarização das condições de trabalho dos Agentes precariza a própria política pública de saúde da cidade”, alertou.
Fernanda Neves, da Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão, lembrou que na reunião da semana passada o prefeito pediu duas semanas para que as reivindicações fossem analisadas, solicitando inclusive o adiamento da audiência na Câmara. Sobre a base de cálculo, ela garantiu que a questão já está sendo discutida com o setor jurídico. A gestora acredita que, na próxima semana, todas as análises técnicas e jurídicas já terão sido concluídas e poderão vir a ser apresentadas aos trabalhadores. Quanto à avaliação de risco, ela afirmou que o laudo não é coletivo e foi elaborado com critérios bem objetivos após visitas a todas as regionais.
Nova reunião com prefeito
Convidado para a audiência a pedido do Sindicato, o Ministério Público do Trabalho foi representado pelo procurador-chefe, Arlélio Lage, que após ouvir os participantes e ver as imagens sobre o ambiente e as condições de trabalho declarou que a situação é muito preocupante. O procurador concordou que o os laudos não podem ser elaborados “por atacado”, e sim setorialmente. De acordo com ele, a Prefeitura deve avaliar a situação dos diferentes ambientes e pessoas e também buscar formas de minimizar ou extinguir as exposições aos fatores de risco. Para isso, é necessário apurar dados sobre a contaminação de Agentes, e fornecer EPIs adequados.
O corte do adicional, segundo o procurador, não é aceitável, e pode gerar “uma enxurrada de ações” nas quais os juízes certamente darão ganho de causa para os trabalhadores. “Os ambientes são sim, insalubres, e existe risco de efeitos residuais. Essa não é apenas uma questão trabalhista, mas também social”, afirmou.
Fernanda Neves, por parte da Prefeitura, reafirmou que os laudos foram feitos de forma setorial, estando tudo documentado. Ainda segundo ela, a PBH pode apresentá-los detalhadamente ao MPT.
Arlélio declarou interesse em ver os documentos e convidou os gestores a irem até a Procuradoria conversar e tentar resolver a questão. Léo ressaltou que o posicionamento do MPT é o mesmo dos trabalhadores e anunciou que irá levar pessoalmente os apontamentos do Sindicato ao órgão. Além disso, ele convidou o procurador para a próxima reunião com o prefeito, que será mediada por ele, na qual devem ser apresentadas as respostas da Prefeitura.
Israel Arimar sugeriu a suspensão da greve enquanto as negociações não terminarem, pelo menos até a próxima reunião na Prefeitura. Afirmando que a decisão cabe à categoria, ele consultou os trabalhadores presentes, realizando uma votação: a maioria concordou com a suspensão provisória da paralisação até obtenção do posicionamento final da PBH.
Superintendência de Comunicação Institucional