Direito à cidade

Entidades apoiam utilização de caixas de som por artistas de rua

Proposta de mudança na legislação em vigor recebeu apoio de todos os participantes

quarta-feira, 1 Julho, 2015 - 00:00
Professor Wendel preside audiência que reuniu artistas e entidades ligadas à cultura (Foto: Eduardo Profeta)

Professor Wendel preside audiência que reuniu artistas e entidades ligadas à cultura (Foto: Eduardo Profeta)

Malabaristas na praça, dançarinos na rua ou músicos na estação de metrô são cenas bastante comuns para quem percorre as principais cidades da Europa ou dos Estados Unidos. Em Belo Horizonte, por um equívoco da legislação municipal, esses artistas obtiveram direito à livre manifestação de sua arte, desde que não utilizem nenhum tipo de equipamento de som. Para debater a revisão do dispositivo, proposta na Casa, a Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo reuniu artistas e representantes da prefeitura e Defensoria Pública, que declararam total apoio à medida.

Antes de dar início ao debate, o requerente da audiência, Professor Wendel (PSB), apresentou aos presentes um vídeo produzido pelo músico Rogério Soares, mais conhecido como Trinta, que mostra o artista tocando seu violão e cantando em praças da cidade acompanhado de uma pequena caixa amplificadora. Diante da cena, jovens, crianças e idosos parecem usufruir de um pequeno momento de relaxamento e prazer, em meio aos ruídos e ao estresse da metrópole. Segundo o músico, que tocou por mais de um ano e meio em praças como Savassi, do Papa e da Liberdade, somente quando foi abordado por fiscais da prefeitura ele tomou conhecimento da proibição do uso da caixa de som.

Segundo o Professor Wendel, que citou o PL 1587/15, de Gilson Reis (PCdoB), que altera a redação do artigo 1º da Lei Municipal 10.277/11 de forma a permitir a utilização do acessório por esses artistas, o requerimento da audiência pública resultou do acolhimento da demanda de Trinta, que relatou aos presentes a longa jornada percorrida na busca de licenciamento para exercer sua arte. Apesar de toda a burocracia com a qual se deparou, em seu périplo pelos órgãos pertinentes, o músico reuniu os documentos necessários e seguiu todas as orientações até ser informado de que poderia tocar na Praça da Liberdade, desde que mandasse cercar todos os jardins e canteiros!

Questionada por Wendel, a representante da Fundação Mineira de Cultura (FMC) e Secretaria Municipal de Governo, Liliane Ferreira Santos, declarou-se favorável ao projeto. Em relação à possibilidade de estipular limites de decibéis ao texto do PL, por meio de emenda, ela explicou que não será necessário, já que as restrições estão definidas em outras normas, como a Lei do Silêncio. Como representante da FMC e como cidadã, ela defendeu o fomento à cultura e à arte por meio da permissão e do estímulo para que os artistas amadores exerçam seu ofício, tornando a cidade mais humana e agradável para se viver e visitar.

Cidade humanizada

Representantes da classe artística e a presidente do sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de Minas Gerais (Sated-MG), Magdalena Rodrigues, criticaram o tratamento dado a esses artistas amadores, que mesmo se apresentando de forma espontânea e gratuita estão sujeitos às mesmas exigências e taxas que grandes eventos com palco, equipamentos profissionais de som e fins lucrativos. Madalena lembrou a época em que BH, conhecida como “cidade jardim”, contava com apresentações e concertos no parque municipal e nas praças, onde famílias e vizinhos se reuniam para fazer piqueniques e ouvir música.

A defensora pública de Direitos Humanos Cleide Nepomuceno, que acolheu a demanda do músico no órgão, reconheceu as boas intenções do vereador Arnaldo Godoy (PT) ao propor a Lei 10.277, que eliminou a necessidade de licenciamento prévio para a realização desse tipo de apresentação e desburocratizou o uso das praças públicas para manifestações artísticas espontâneas. Para ela, a norma colaborou para ampliar o acesso à cidade e a apropriação de seus espaços públicos pela população, em conformidade com a constituição federal, que também garante a livre expressão artística. No entanto, assim como os demais presentes, ela admite que a subjetividade e a indefinição do conceito de “som mecânico”, vedado pela norma, acabou por incluir no mesmo critério uma pequena caixinha amplificadora ligada a uma bateria de 12v a um equipamento de som profissional.

Segundo a defensora, a correção do equívoco na legislação, cuja interpretação esvaziou um direito constitucional na nossa cidade, evitará a necessidade de buscá-lo por via judicial, como aconteceu com Trinta. Assim como os demais, ela também reconheceu a necessidade do acessório para que os artistas possam ser escutados pelos transeuntes sem incomodar os vizinhos da área e lembrou que, mesmo praticada por amor, para muitos deles a arte pode representar uma fonte de sustento, já que é comum receberem doações espontâneas das pessoas que apreciam suas apresentações.

O conselheiro municipal de Cultura Marcos Ribeiro, que defende a permissão da utilização das praças para fins artísticos e de lazer, desde que sem abusos, mencionou estatísticas que indicam a redução da criminalidade nos meses de janeiro e fevereiro nas comunidades mais carentes, o que atribui ao maior envolvimento dos jovens com a cultura e a arte, na qualidade de espectador ou de artista, devido a eventos como ensaios de carnaval e outras atividades culturais ligadas ao período.

Fiscalização

Ribeiro abordou ainda a questão da fiscalização e dos critérios utilizados para as diferentes regionais da cidade. Segundo ele, parece que a legislação só vigora na Regional Centro-sul, sendo que em praças da Pampulha, Barreiro ou Venda Nova ocorrem regularmente eventos sem licenciamento prévio e com a utilização de som, como shows de rock, hip hop, ensaios de escolas de samba e bailes funk, sem serem incomodados pela prefeitura. Um dos músicos presentes relatou problemas em uma escola municipal em sua vizinhança, que promove eventos até altas horas com som mecânico.

O conselheiro e o vereador conclamaram a participação de todos nos debates sobre o Plano Municipal de Cultura, que ocorrerão em audiência pública na Câmara Municipal no dia 5 de agosto. Entre as medidas a serem propostas, ele citou a descentralização dos recursos para atender demandas mais específicas e adequadas de cada uma das regionais. Sobre as questões relacionadas à fiscalização, Wendel afirmou que irá encaminhar, por meio da comissão, pedido de esclarecimentos por escrito à Secretaria de Serviços Urbanos, que apesar de convidada não compareceu nem enviou representante à audiência.

Aprovação do PL

Antes de encerrar, o parlamentar explicou a tramitação e o processo legislativo a que está sujeito o projeto de lei, garantiu que manterá a todos informados de seu andamento e solicitou apoio para a sua aprovação.

Veja o vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional